Fundos de ações perdem para o Ibovespa; saiba o que fazer e o que evitar

Uma das explicações é a alta das commodities, que impulsionou a Bolsa
Pontos-chave:
  • Mediana de retorno foi avaliada em três intervalos diferentes
  • Evite investir em ações olhando para o curto prazo

Até março, os fundos de ações sofreram resgates relevantes. A captação líquida desses produtos (ou seja, quanto foi investido menos quanto foi resgatado) ficou negativa em R$ 31,8 bilhões, segundo dados da Anbima. Uma das razões vem do próprio desempenho que esses produtos estão oferecendo nos últimos meses, que ficou bem abaixo do Ibovespa.

Um levantamento da XP Investimentos feito com os fundos de ações negociados em suas plataformas mostrou que a mediana do retorno desses produtos perde para o Ibovespa em três intervalos diferentes: no ano até abril, em 12 meses até abril e em 24 meses até abril.

No estudo foram considerados os fundos de ações das categorias long only (em que o gestor só opera “comprado” em ações, sempre apostando na valorização delas), small e mid caps e long biased (em que os gestores têm mais flexibilidade para operar “comprados” e “vendidos”, apostando tanto na alta quanto na queda de ações).

Em comparação a outros indicadores, como o CDI e a inflação, os três tipos de fundos também ficam na pior no acumulado do ano e em doze meses até abril. Em 24 meses, no entanto, eles ganham dos dois.

Em intervalos maiores, a mediana dos retornos por estratégia muda um pouco. Tanto em 36 meses quanto em 60 meses, os fundos que investem em small e mid caps superaram, de longe o Ibovespa. Os demais superam levemente o principal índice da Bolsa.

O estudo também mapeou o desempenho desses produtos em anos fechados, desde 2017 até 2021. Em 2017, os small e mid caps superam o Ibovespa e os demais ficam próximos, com os long biased perdendo do índice e os long only superando. Já em 2018 e 2019, todos superaram o índice. Em 2020, ano que marcou o começo da pandemia, os long only ficaram praticamente empatados, os small e mid caps perderam e os Long Biased ganharam. Por fim, em 2021, os long only perderam do Ibovespa e os small e mid caps e long biased foram melhor (mas, assim como o índice, entregaram um desempenho negativo).

Por que os fundos estão perdendo do Ibovespa?

Alguns fatores específicos do cenário macroeconômico justificam o desempenho dos fundos de ações aquém do Ibovespa nos últimos tempos, segundo especialistas. Um deles é a alta recente de algumas commodities como o petróleo e o minério de ferro. A valorização desses produtos ajudou a puxar para cima ações de empresas como Petrobras e Vale que, juntas, representam 27,48% do índice.

Até 25 de abril deste ano, as ações das companhias acumulavam altas de aproximadamente 12%, no caso da Vale, e 37% no caso das ações preferenciais e ordinárias da Petrobras. Como a participação delas no Ibovespa é relevante, essas valorizações ajudam a puxar o índice para cima, o que não acontece com os fundos de ações, que nem sempre têm papéis ligados às commodities em suas cestas.

“Se olharmos os últimos 24 meses, o que realmente andou na Bolsa brasileira foram as empresas de commodities, que têm um preço forte no índice. Os bancos também foram relativamente bem. E esses são setores que, em geral, vemos pouca representatividade na carteira dos gestores e muita no Ibovespa. Especialmente commodities, porque há uma dificuldade por parte dos gestores em precificar essas empresas, já que há incertezas sobre preço delas, do dólar. Então, a representatividade delas nesses fundos é baixa. E como esse foi um setor que andou bem nos últimos 24 meses, no pós-pandemia, os gestores ficaram mais para trás do índice e isso causou esse descolamento que vemos aqui”, explica Luis Felippo, sócio e analista da casa de análise Nord Research.

Os gestores erraram?

Mas se as commodities foram as bolas da vez dos últimos meses, os gestores erraram ao não apostarem nelas para seus fundos? Segundo o analista, não. Ele explica que muitas vezes os profissionais preferem continuar em sua tese de investimentos, especialmente pensando no longo prazo, do que se arriscar a mudar e perder ainda mais em um período curto.

“Muitas vezes, o gestor que se propõe a um tipo de estratégia deve seguir nela. O problema de alguns gestores e até de pessoas físicas é querer trocar no meio do caminho e dar errado. Até porque, estamos falando de uma janela curta, de 24 meses. Falando de bolsa, esse é um período pequeno. Eu diria que eu tenho dúvidas se os gestores deveriam ter feito ajustes para aproveitar essa alta das commodities. O que prezo é que eles mantenham suas estratégias. Claro que há casos em que alguns foram para commodities e foram felizes, mas outros mudam no meio do caminho e não dá certo”, afirma.

Aliás, você sabe o que fazer quando a corretora comete um erro na sua carteira? André Demarco, CEO e diretor de autorregulação da BSM, é o responsável pela fiscalização e supervisão de mercados da Bolsa brasileira e te explica na entrevista abaixo:

Olhar para o longo prazo

Davi Fontenele, analista de fundos da XP Investimentos, concorda que a janela de até 24 meses é pequena para avaliar o desempenho de fundos de ações ou até mesmo de outros ativos de Bolsa. Ele explica que os investidores devem olhar um horizonte maior ao pensar em fazer esse tipo de aplicação, já que acontecimentos pontuais podem mexer muito com o mercado em períodos mais curtos, mas não necessariamente representam uma oportunidade perene por muito tempo.

“O investidor não deveria olhar para o curto prazo. Se olhar janelas móveis passadas, a geração de retorno excedente sobre o Ibovespa e até a consistência dos fundos em geral é boa. Mesmo no curto prazo, tem exemplos de fundos que foram bem. O conselho para o investidor é: não generalize e seja atento aos gestores que confiam na parte qualitativa e que provaram que entregam bons resultados em uma janela maior”, afirma.

O estudo da XP, inclusive, mapeou com base nos dados da consultoria Economatica, seis fundos com rendimentos que superaram o do Ibovespa em mais de 10% ao ano nos últimos cinco anos. No estudo, foram encontrados outros nove produtos cujos rendimentos superaram o índice entre 4,5% e 8,9% ao ano nos últimos 15 anos.

É melhor optar por um ETF?

Os fundos de ações, no entanto, geralmente têm taxas de administração (pagas pelos cotistas aos gestores pelo trabalho deles montarem aquela carteira) e taxas de performance (que funcionam como uma remuneração extra caso aquele gestor tenha superado suas metas). Em contrapartida, os fundos de índices, chamados de ETFs, são instrumentos mais baratos. Eles funcionam como um produto passivo, que apenas “replica” o índice da bolsa e, por isso, tem taxas mais baratas.

Ao observar que o Ibovespa teve um desempenho melhor que a mediana dos fundos de ações, os investidores podem acreditar que investir em um ETF possa ser uma saída mais eficiente, justamente pelo custo menor e pelo bom desempenho. Os analistas, no entanto, discordam. Fontele, da XP, reforça que o trabalho dos gestores é justamente mapear oportunidades de ganho acima do Ibovespa.

“A escolha entre um fundo passivo e um ativo é comum. A nossa conclusão é que se o fundo gera excesso de retorno sobre o índice ou o ETF, vale a pena pagar o que se paga”, diz.

Como achar os fundos com maior rentabilidade?

Encontrar esses bons fundos, no entanto, não é uma tarefa tão simples. Para Felippo, da Nord, o ideal é o investidor pessoa física procurar ajuda de um especialista alinhado aos seus objetivos. Simultaneamente, ele deve tentar olhar os dados daqueles fundos, entender quem é a equipe do gestor e o que eles entregaram nos últimos anos.

“É um trabalho de formiguinha, de olhar sempre, é importante não ter comichão de querer trocar sempre a carteira para não fazer movimentações indevidas. Indico que as pessoas procurem um especialista que confiem, que seja alinhado aos seus objetivos. E elas podem ir aprendendo, absorvendo, tem muito conteúdo disponível no mercado”, afirma.

Assim como Fontenele, ele reforça que no Brasil não é difícil encontrar bons gestores com histórico de superação do Ibovespa, diferente do que acontece nos Estados Unidos.

“No caso americano, o que temos até agora é que os gestores têm de bater os índices americanos de ações. Então, por enquanto, lá pode ser melhor comprar um ETF. Aqui no Brasil, a lógica é um pouco diferente. Se você seleciona bem os gestores, você tem performance bastante acima do Ibovespa”, afirma Felippo.

Ele conta, inclusive, que existem bons produtos voltados para o público de varejo. “Tem fundos bons com aportes mínimos de R$ 500, de R$ 1 mil. O mercado está evoluindo muito bem nesse sentido”, afirma.

No estudo da XP, na lista dos cinco fundos com melhor rentabilidade ao ano acima do Ibovespa nos últimos cinco anos, apenas o Organon FIC FIA tem aporte de R$ 10 mil. Todos os demais exigem uma entrada de R$ 1 mil.