IPCA de agosto mostra que luta contra a inflação no Brasil deve ser demorada

Especialistas avaliam que redução de impostos foi responsável pela queda dos preços e alta da Selic ainda não teve o efeito desejado na economia

Nesta sexta-feira (9), o mercado conheceu dados de inflação no Brasil em agosto. O IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) recuou 0,36% no mês passado, em linha com o que o mercado esperava. Mesmo assim, agentes seguem preocupados com os preços e com o efeito que os dados têm na política monetária do Banco Central

A avaliação de especialistas é de que a alta da Selic para 13,75% ao ano ainda não teve efeito significativo nos preços e as quedas no IPCA de julho e agosto foram resultados da política fiscal do governo, e não da política monetária do BC. 

Por isso, os dados de hoje despertam um temor de juros mais altos por mais tempo ou até de novo aumento da Selic.

Nicolas Borsoi, economista-chefe de Nova Futura Investimentos, afirma que o indicador, somado a falas recentes de Roberto Campos Neto, presidente do BC, deixam “em aberto a chance do Copom elevar a Selic em mais 0,25 ponto percentual”, e que “essa abertura ruim do IPCA indica que o trabalho do BC ainda vai ser longo, sugerindo que a Selic não deve ser cortada tão cedo”.

A ponta curta da curva de juros futuros, mais sensível à política monetária, opera em alta nesta sexta-feira, mostrando que as apostas para uma alta de 0,25 p.p. da Selic foram elevadas. Perto das 11h, a taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2024 subia de 13,025% para 13,085%. O contrato de DI para janeiro de 2025 saía de 11,76% para 11,77%. 

“De fato temos uma queda da inflação na margem, queda esta motivada por fatores exógenos à dinâmica de preços em si – corte de impostos –, mas ainda temos uma projeção de alta de preços”, afirma André Perfeito, economista-chefe da Netcon. Perfeito projeta alta próxima a 6% do IPCA em 2022, mas pontua que são “6% sobre uma inflação já elevada”.

Em comentário enviado a clientes, Alexandre Póvoa, estrategista da Meta Asset Management, disse que “o que mais preocupa é a incrível inércia da inflação, apesar de toda a alta acumulada na taxa Selic, que jogou o juro real brasileiro prospectivo para acima de 8% ao ano”. 

IPCA ruim por dentro

Esse sentimento de preocupação vem, principalmente, porque o IPCA só vem recuando por causa dos combustíveis, que tiveram retração de 10,82% em agosto. Essa queda, porém, foi incentivada pelo corte de impostos, e não pela dinâmica de preços em si. O preço do petróleo lá fora continua alto, o que impacta os valores por aqui.

Outro fator que preocupa é o índice de difusão da inflação. Esse dado mede a quantidade de produtos e serviços que subiram no mês em relação ao total de itens pesquisados pelo IBGE. Em agosto, o índice voltou a crescer e revelou que 65% dos itens pesquisados tiveram alta nos preços.

“Núcleos variaram mais que o esperado e o índice de difusão segue forte. Isto preocupa e mostra que ainda temos uma inflação muito disseminada”, afirma Rafael Pacheco, economista da Guide Investimentos. 

As análises mostram que há muito mais a ser observado no IPCA do que apenas o indicador final. Especialistas avaliam que os dados de inflação vieram “ruins por dentro” e que a luta contra a alta dos preços deve ser longa e difícil.