O que você pode aprender com o erro do sobrinho de Armínio Fraga?
Arthur Fraga rasgou R$ 500 milhões porque não diversificou o portfólio
O fato de ter Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central, como tio e sócio ajudou Arthur Fraga Baer Bahia a ter uma grande confiança junto aos investidores durante bastante tempo. Mas isso derreteu em uma questão de dias.
Arthur foi responsável por quebrar o TT Global Equities graças a uma cartada que fez com que ele perdesse 95% do patrimônio que geria.
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Foram R$ 500 milhões perdidos em questão de minutos.
“Montei uma operação arriscada, com opções de venda, e comprava opções de compra de uma empresa que conheço profundamente”, disse o investidor em carta aos cotista do TT Global. “Com isso, fui obrigado a liquidar a posição em dois dias, o que gerou perdas irreparáveis”, completou.
O all in, ou seja, quando decidiu apostar tudo, Arthur Fraga foi na empresa americana de tecnologia Clarus (CLAR US), que opera na bolsa de Nova York.
Uma semana antes da bancarrota, “a operação estava caminhando bem”, disse o investidor, mas a necessidade de alavancar o fundo para sair da operação acabou por assustar o custodiante, que largou o TT Global sozinho.
Qual foi o erro do sobrinho de Armínio Fraga?
Os especialistas ouvidos pela Inteligência Financeira concordam que Arthur foi levado à bancarrota por um erro trivial: a falta de diversificação.
Soma-se a isso o fato de ele ter concentrado o capital em um investimento de alto risco, os derivativos.
Uma das lições que o caso do sobrinho do ex-presidente do Banco Central pode passar ao investidor é que, independentemente dos resultados já apresentados por diferentes classes de investimento, toda opção tem seu momento de brilhar, o que pode antecipar um grande tombo na próxima esquina.
Portanto, escolher olhando apenas o passado não é garantia de sucesso.
“Por melhores que sejam o gestor e a empresa, a estratégia dos envolvidos pode simplesmente dar errado. Quando queremos ganhar muito acima da média de mercado, temos que ter entendimento dos riscos que corremos”, diz Paula Bento, sócia da HCI Invest e Planejadora financeira pela Planejar.
Para Daniel Alberini, sócio da CTM Investimentos, “qualquer posição acima de 35% em qualquer ação não deveria nem ser cogitada”, avalia. “Concentrar muito é algo extremamente perigoso para o investidor porque, acima de tudo, você está sempre suscetível ao erro humano”, avalia.
Esses erros podem estar relacionados a análises imprecisas e falta de informação por parte do investidor, além de erros de gestão por parte da companhia.
“Empresas têm problemas todos os dias e, obviamente, tem problemas que não aparecem numa análise simplista durante um tempo”, detalha.
O que aumenta o risco de um investimento?
Os especialistas explicam que o fato de Arthur ter usado derivativos para alavancar a operação aumentou consideravelmente o risco do investimento.
“O investimento em derivativos, que foi a aposta do sobrinho do Armínio Fraga, é um dos mais arriscados que existem, é um caso extremo”, explica Luciana Ikedo, educadora financeira.
“Ele fez uma aposta arriscada que não deu certo. Tecnicamente, comprou uma call e vendeu uma put, e a ação despencou. Dessa forma, teve que acabar se desfazendo da posição, o que fez com que o preço da ação caísse ainda mais”, detalha a especialista.
Para que servem os derivativos
Os derivativos são instrumentos que podem ser utilizados como proteção de patrimônio, mas, no caso do Arhtur, essa opção foi utilizada como alavancagem, “ou seja, com valores acima do que ele tinha disponível, o que é permitido em diversos regulamentos de fundos”, explica Bento.
Como operar alavancado?
A especialista explica ainda que, para que o investidor opere alavancado é exigida uma margem de garantia do custodiante, a empresa que possibilita essa operação.
“É uma espécie de uso de crédito, mas sem ter que desembolsar o valor no ato. Ocorre que o custodiante avaliou que o Arthur estava tomando risco excessivo e concentrado. Com isso, exigiu uma liquidação da operação e o gestor precisou utilizar praticamente todo o patrimônio do fundo”, explica a sócia da HCI Invest.
“Ou seja, o dinheiro investido nele foi usado para pagar a operação”, completa.
Questões técnicas devem estar no regulamento dos fundos
Em uma situação como essa, depois da operação já ter sido montada, não há muito o que ser feito para evitar a tragédia se algo der muito errado.
“Porém, tanto o instrumento que ele usou de derivativo, quanto a chamada de margem do custodiante, que o obrigou encerrar a operação, são questões técnicas que devem estar escritas no regulamento dos fundos, documento de extrema importância para o investidor”, conta.
Basicamente, “o que o Arthur fez de errado foi tomar um risco muito alto sem ter a proteção adequada”, avalia Ricardo Moura Rocha, head de produtos da W1 Consultoria Financeira.
“Quando as coisas não caminharam conforme a expectativa, ele não tinha mais como reverter essa operação e recuperar o que tinha alavancado, porque tinha muito mais alavancado do que tinha de patrimônio. Ele investiu mais do que tinha, acreditando que as coisas dariam certo”, completa Rocha.
Os erros comuns entre os “mortais”
Erros fatais não se limitam a apostas arrojadas feitas por grandes players. Eles também podem atingir os investidores mais comedidos e de menor capital, até mesmo aqueles que apostam em opções supostamente mais seguras.
“Mesmo em renda fixa, existe risco”, diz Ikedo. “A mudança de cenário, da curva de juros e o risco de default podem comprometer os resultados”, avalia.
“O investidor deve ficar especialmente atento ao crédito privado que não tem a garantia do fundo garantidor e que correm o risco de crédito. É possível, nesses casos, perder todo o capital alocado”, completa a planejadora financeira.
Ainda que a renda fixa tenha seus perigos, eles são muito menos frequentes e menores que os existentes na renda variável. Se a regra da diversificação for ignorada em investimentos como ações e fundos de renda variável, o impacto pode ser irreversível, alerta Bento.
“Se você pegar todo o seu dinheiro e colocar em uma ação ou um fundo de renda variável, você terá 100% de chance de dar tudo certo ou errado.”
Ela ressalta que o investimento em fundos e ações precisa contemplar obrigatoriamente o longo prazo.
Portanto, pode haver perdas importantes se o investidor se apavorar diante das oscilações de mercado e resgatar o dinheiro durante intempéries momentâneas. “O investidor precisa dispor de tempo para deixar o investimento se desenvolver”, explica.
Distribuição recomendada
Para Alberini, da CTM, o ideal para o investidor apto a riscos é diversificar o portfólio com 60% do investimento em renda variável e o restante em renda fixa. A diversificação também deve compreender cada uma dessas modalidades.
Especificamente na renda variável, a aposta em ações deve contemplar uma distribuição com 10 e 20 empresas diferentes no portfólio.
Acima de 20 empresas, ele diz que o efeito da diversificação tende a ser inverso, com a perda de possibilidade de lucros maiores e consistentes.
“Se você faz um investimento relevante com 1% do portfólio e essa ação sobe 500%, ela tem uma contribuição marginal, mas se isso passar para 5 ou 6%, há uma transformação de patrimônio relevante e interessante. Esse é o grande segredo”, detalha.
Não pulverize demais seus investimentos
Quando a aposta é em diversificar colocando dinheiro em vários fundos, também deve ser imposto um limite para diversificação, com uma distribuição que não pulverize demais as apostas, mas que também não estejam concentradas em poucas opções.
Alberini alerta que fundos têm uma particularidade: podem esconder uma concentração de ativos sem que o investidor perceba.
“Muitos fundos acabam investindo em carteiras de forma parecida, principalmente fundos de ações”, diz o especialista.
“Se um investidor adere a três gestoras diferentes, mas elas possuem as mesmas empresas no portfólio, no final, você comprou três fundos, mas ficou exposto às mesmas ações várias vezes, ou seja, não aconteceu a diversificação”, detalha.
Ricardo Moura Rocha, da W1 Consultoria Financeira, diz que, qualquer investidor, seja um experiente e multimilionário como Arthur, ou um iniciante, precisa respeitar algumas verdades absolutas do mercado que prevê perdas e ganhos em todos os ativos, além da perda sempre à espreita na renda variável.
“Você tem que entender que, na renda variável, o seu dinheiro pode sumir a qualquer momento, sempre. Independentemente de ele ser bem ou mal gerido”, avalia.
Levado em conta esse aspecto, a renda variável é fundamental para gerar ganhos reais para o investidor.
“Ela é bastante interessante, mas tem que estar de acordo com o seu perfil e casar com planejamento para não ter surpresas. A reserva de emergência tem que estar bem estruturada e os investimentos focados nos objetivos de forma a evitar sustos como o do sócio da TT”, complementa.
E para quem não tem a oportunidade de, perdendo 95% do seu patrimônio, se manter milionário, os efeitos de uma não diversificação podem ser ainda mais deletérios.