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Samba no pé e cabeça no bolso: como as rainhas de bateria cuidam das finanças
Considerado um dos maiores espetáculos da Terra, o Carnaval representa muito da cultura brasileira. E por trás de toda esta festa tem, claro, bastante gente trabalhando para deixar a nossa folia cada vez mais bonita. Entre todos estes profissionais que merecem destaque, existe uma posição que é muito relevante dentro e fora das escolas de samba: as rainhas de bateria. Inclusive, você sabia que grande parte destas mulheres tem como principal e única profissão exatamente a dança, ou seja, o samba?
Dessa forma, elas precisam rebolar bastante (me perdoe o trocadilho da palavra) para conseguir manter as economias em dia.
Diante disso, então, vem o questionamento: como as rainhas de bateria cuidam das suas finanças? A gente conversou com algumas sambistas de escolas do Rio e de São Paulo que contaram sobre suas rotinas financeiras e se conseguem, ou não, realizar algum tipo de aplicação.
Então, já coloca um samba pra tocar e conheça um pouco das finanças das rainhas de bateria.
Incertezas da profissão artística
Foi aos 13 anos de idade que Bianca Monteiro, hoje com 34, chegou à quadra da Portela para ser passista. Mas o sonho dela era outro: se tornar rainha de bateria.
Passados 16 anos, em 2017, Bianca foi coroada e segue à frente da batucada desde então. E o amor pelo samba é tanto que a arte virou sua profissão, mesmo esta função sendo, de acordo com as palavras da musa, “uma tarefa não muito fácil”.
“É uma profissão de altos e baixos. Então, tem épocas que entra uma boa grana, como também tem momentos que recebo o suficiente para pagar minhas contas”, conta.
Desse modo, Bianca diz que usa de alguns artifícios para conseguir juntar dinheiro. “Depois do Carnaval, geralmente, a gente viaja pra fora do país para fazer algumas apresentações. E aí, eu acabo trazendo um pouco de dólar e guardo a moeda para quando precisar fazer câmbio, por exemplo, ou usar em outra viagem”, fala.
E além de sambista, a rainha de bateria também trabalha em eventos para conseguir complementar a renda.
“Quando eu faço algum trabalho grande, deixo esse dinheiro guardado no banco, investido na poupança. Mesmo com os altos e baixos da profissão, eu tento ter sempre um dinheiro guardado para fazer algo no futuro”, explica a sambista que afirma não ter nenhum tipo de ajuda para aplicar seu patrimônio.
Rainhas de bateria são ricas?
De acordo com a sambista, muitas pessoas acreditam que as rainhas de bateria são ricas. Mas não é bem assim.
“Infelizmente, as pessoas não veem o Carnaval como uma profissão. Então, elas não entendem que a gente precisa trabalhar para poder fazer esse dinheiro, assim como qualquer trabalhador faz. Além disso, as empresas também precisam olhar para gente não só durante o Carnaval, como também em outras épocas, para fazer campanhas publicitárias, por exemplo”, argumenta.
Rainha e empresária
Foi durante um ensaio da escola de samba Inocentes de Belford Roxo, na Baixa Fluminense, em 2008, que Sávia Davi, 35, conheceu uma diretora da Beija-flor que a levou para a quadra da tradicional escola.
“Quando cheguei na Beija-flor, conheci o Laíla, diretor de Carnaval (falecido em 2021), que imediatamente disse que eu iria desfilar pela escola”, lembra.
A partir daí, Sávia só cresceu dentro do samba até receber o convite para ser rainha de bateria da Unidos de Vila Maria, em São Paulo, no ano de 2018. Mas, diferente de Bianca, que tem o samba como a sua fonte de renda, Sávia faz da dança uma realização pessoal.
“Eu sou formada em educação física e direito e atualmente tenho sete lofts, sendo seis em Copacabana e um em São Paulo que alugo por temporada”, conta. E é com o dinheiro de sua empresa que Sávia cuida das despesas pessoais. “As contas da casa e de meus dois filhos ficam com meu marido, o que, eu sei, é bem diferente da realidade da maioria das mulheres por aí. Tenho essa consciência de privilégio”, afirma a rainha de bateria.
Entre a renda fixa e a variável
Inclusive, a rainha de bateria conta que possui uma carteira de investimentos diversificada. Parte da aplicação está em renda fixa, mais especificamente em CDB, e outra parte fica alocada em renda variável.
Neste segundo caso, Sávia tem a ajuda de uma assessoria financeira. “Eu vou lá de seis em seis meses para saber como estão meus rendimentos. Afinal de contas, são aplicações em tecnologia, CDB, criptomoedas etc”, afirma.
E mesmo sendo uma pessoa que se preocupa com as economias, esta educação financeira não existiu sempre. “Minha cabeça era muito arcaica. Eu juntava dinheiro em casa mesmo”, lembra.
Mas foi com a chegada de seu segundo filho, Lorenzo, 9, que este pensamento mudou.
“Eu comecei a perceber que a educação é muito cara. Além disso, gostaria que os dois (Sávia também é mãe da Laura, 10) fizessem a graduação deles fora do país. Então, fiquei pensando como que eu faria isto acontecer. Afinal de contas, de uma hora pra outra, eu não tenho condições. Portanto, vamos pensar a longo prazo. Eu estou plantando para colher quando eles estiverem lá nos seus 18 anos”, conclui.
Busca por maior reconhecimento às rainhas de bateria
Bastante conhecida da comunidade do samba, Quitéria Chagas, 41, sabe perfeitamente todo o processo da carreira de rainha de bateria. “Afinal de contas, são 26 anos de Carnaval”, conta a sambista que está à frente da Império Serrano.
E mesmo com tanto tempo na profissão, Quitéria afirma que é muito difícil ganhar dinheiro como rainha de bateria. “Nós somos para a escola de samba um produto em potencial. Somos as mulheres da mídia, porém, o mercado publicitário não nos enxerga”, lamenta.
A dançarina, que é casada e mora na Itália, diz que todos os gastos com o Carnaval saem do bolso de sua família. “O dinheiro vem do patrimônio do meu marido, que tem o salário dele. Mas eu, claro, como mulher empoderada e profissional, quero ser reconhecida e ganhar dinheiro pelo meu trabalho. É por isso que eu luto”, explica.
Para se ter uma ideia, a rainha de bateria faz uma conta por cima e diz que uma fantasia pode chegar a R$ 30 mil. Sem considerar, no caso dela, as passagens para o Brasil.
“O deslocamento da Itália até o Brasil fica em torno de R$ 8 mil. Neste caso, por exemplo, seria muito importante ter um contrato com uma companhia aérea para realizar este deslocamento. Mas eu nunca consegui”, afirma.
É possível investir?
Quitéria conta que, infelizmente, não. “Sabe quantos contratos eu consegui este ano? Nenhum! Inclusive, eu prefiro nem olhar a fatura do meu cartão de crédito neste momento”, desabafa a rainha de bateria.
Além disso, ela explica que é muito difícil que as escolas de samba contratem as rainhas de bateria como funcionárias. “O dinheiro que as agremiações recebem do governo, por exemplo, vai tudo para construir os carros alegóricos e outros itens que contribuem para o espetáculo acontecer”, esclarece.
E mesmo com quase 340 mil seguidores nas redes sociais, Quitéria conta que é muito difícil fechar algum tipo de publicidade. “O que as empresas querem é fazer permuta (tipo de contrato em que o contratado não recebe dinheiro, mas sim os produtos ou serviços da marca contratante), mas ninguém sobrevive só disso, não é mesmo?”, questiona.
Dessa forma, a rainha de bateria ainda tem esperanças de que, algum dia, elas sejam de fato reconhecidas financeiramente. Enquanto isto não acontece, é economizar para poder fazer o espetáculo acontecer.
“Eu me sacrifico por amor ao que eu faço e por amor ao meu país”, afirma.
Tudo na planilha
Grande apreciadora do samba, e claro, do Carnaval, Vanessa Alves, 40, começou a participar dos desfiles da Águia de Ouro em 2017. Ano, inclusive, que ela foi convidada a representar a agremiação no concurso Musa do Carnaval de São Paulo, no programa Caldeirão do Huck, da Rede Globo. “Venci o concurso e fui a última musa eleita no programa”, lembra.
A partir daí que começou o voo rumo ao cargo de rainha de bateria. Vanessa desfilou em vários setores. Desde destaque central de carro a musa de bateria. “Em outubro do ano passado, o presidente da Águia de Ouro me concedeu a honra de ser a rainha de bateria da nossa escola. Um grande sonho realizado, a felicidade transborda”, comemora.
Assim como Sávia, Vanessa também não trabalha com o Carnaval. Ela é nutricionista e coordena uma Unidade Básica de Saúde (UBS), em Indaiatuba, no interior de São Paulo, onde mora.
“Eu arco com todas as despesas de deslocamento entre uma cidade e outra. Então, tenho gasolina, pedágio, hospedagem todos os fins de semana e mais o figurino”, comenta.
E com todos estes gastos, ficaria fácil da rainha de bateria se perder, não é mesmo? “Eu tenho planilhas (de despesas) no meu computador em que controlo todas as entradas e retiradas”, conta.
Rainha de bateria de olho na aposentadoria
E com todo este cuidado com suas finanças, Vanessa consegue aplicar parte do seu dinheiro em uma carteira de investimentos bem diversificada. “Invisto em ações e fundos imobiliários. E a reserva de emergência em RDB (Recibo de Depósito Bancário) – produto muito parecido com o CDB – aplicação com rendimento de 100% do CDI e liquidez diária, o que me permite resgatar rapidamente”, afirma.
Toda essa diversificação de ativos financeiros tem um objetivo: “garantir uma aposentadoria tranquila e segura, além da tradicional que a maioria de nossa população já conhece, que é o INSS/Previdência privada”, diz a rainha de bateria.
Vanessa conta que tem a ajuda de seu amigo e assessor pessoal, Wesley, para aplicar o seu dinheiro nos investimentos certos para os seus objetivos. Ela também aprende bastante com ele sobre educação financeira, e como boa aluna que é, a rainha de bateria deixa um recado sobre finanças.
“Acredito que o imediatismo é o inimigo da vida financeira saudável, inimigo da liberdade financeira.”
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