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Análise: Até quando a ação do Copom será independente do Fed?
Pela primeira vez desde que os bancos centrais começaram a combater o maior surto inflacionário em 40 anos, o aperto monetário no Brasil foi menor do que nos Estados Unidos. Até quando nossa política monetária poderá ser independente da implementada pelo Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA)?
Ontem, o Fed subiu os juros em 0,75 ponto percentual, para a faixa entre 1,5% e 1,75% ao ano. Aqui no Brasil, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central subiu em 0,5 ponto, de 12,75% ao ano para 13,25% ao ano.
A situação pode ser descrita de duas formas. Uma delas, mais tranquilizadora, é que a diferença entre o juro brasileiro e americano é de 11,5 pontos percentuais, o que funciona como uma espécie de vacina que nos protege de eventuais solavancos no processo de alta de juros pelo Fed.
A descrição menos favorável é que a diferença entre juros ficou menor — era de 11,75 pontos até terça-feira — e tende a se reduzir ainda mais nos próximos meses, na medida em que o descompasso entre os ritmos de alta tende a persistir.
Pela indicação de ontem, o Fed considera entre as hipóteses de uma nova alta de 0,75 ponto na próxima reunião, ou então adotar um ritmo mais ameno, de 0,5 ponto. Já no Brasil a indicação do Copom é mais uma alta de 0,5 ponto, ou menor do que isso, de 0,25 ponto percentual.
Nas primeiras horas depois da decisão do Fed, os mercados tiveram um certo alívio, com alta das Bolsas e valorização do real ante o dólar. Mas não foi porque vão acontecer coisas boas na política monetária americana, mas sim porque o pior cenário — que estava sendo precificado pelo mercado — pareceu um pouco menos provável.
Voltando à grande pergunta: o Brasil continuará com certa imunidade ao Fed?
Ou, em algum momento vamos sentir um tranco, e o Copom terá que reagir com mais juros? No passado altas de juros nos Estados Unidos provocaram aversão a risco e fugas de capital de países emergentes.
Há duas visões muito populares no mercado sobre isso. Uma delas diz que, dessa vez, a economia brasileira está mais protegida. O canal de transmissão de um choque de juros nos Estados Unidos é a taxa de câmbio, e as altas cotações das commodities nos garantem certa proteção, já que representam um fluxo importante de divisas para o país.
Outro grupo de analistas acha que é só uma questão de tempo para os juros mais altos nos Estados Unidos pegarem o Brasil. Por enquanto, apesar do aperto mais acelerado, o juro americano segue relativamente baixo, menor que a taxa neutra, embora os juros longos tenham subindo mais nos Estados Unidos.
Quando os fed funds atingirem um patamar mais alto, os efeitos sob o Brasil seriam mais evidentes. Há o risco de serem potencializados com o aperto quantitativo, ou seja, a reversão da expansão monetária que levou o balanço do Fed a US$ 9 trilhões.
A mediana das projeções dos membros do Fed, os chamados “dot plots”, indicavam uma taxa de juros de 3,4% no fim deste ano e de 3,8% ao término de 2023. Essa, porém, é uma fotografia do momento e leva em consideração, por exemplo, que a taxa neutra de juros seja de 2,5% ao ano em termos nominais.
Um argumento que tem aparecido entre os economistas do setor privado é que, com juros na casa de 4% ao ano, os Estados Unidos passam a ser mais atrativo, considerando o seu menor nível de risco.
Um bom pedaço dos juros no Brasil seria apenas um prêmio de risco para cobrir todos os perigos de nossa economia, que incluem o enfraquecimento da âncora fiscal (algo citado pelo BC no seu comunicado de ontem), incertezas sobre a campanha eleitoral e até se há algum risco para a democracia no Brasil, no caso de o presidente Bolsonaro se negar a aceitar uma possível derrota nas urnas.
Tudo isso cria uma incerteza para o segundo semestre deste ano. A primeira linha de defesa contra choques externos seria a venda de dólares pelo Banco Central, algo que o presidente da instituição, Roberto Campos Neto, já se disse disposto a fazer, caso o aperto monetário do Fed provoque turbulências aqui.
O passo seguinte seria subir ainda mais os juros dentro do Brasil, se a percepção dos mercados for de que o diferencial de juros interno e externo é insuficiente para recompensar o risco de manter dólares investidos dentro do país. Mas, num cenário extremo, mesmo a alta da Selic teria limites, num quadro de fragilidade fiscal.
Por Alex Ribeiro, Valor Econômico, de São Paulo.
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