Algoritmo indica desaceleração de sinais ‘hawkish’ em ata do Copom

O Itaú desenvolveu uma ferramenta sistemática para analisar a comunicação dos bancos centrais

A comunicação usada pelo Banco Central na ata da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do início deste mês adota uma linguagem mais branda que as anteriores e reforça a percepção de que o ciclo de aperto monetário chegou ao fim com a taxa Selic em 13,75%. O apontamento é feito pelos economistas do Itaú Unibanco e é fortalecido por um algoritmo criado pelo banco para analisar a comunicação dos bancos centrais.

Ao ser utilizada para interpretar as atas do Copom, a ferramenta mostra uma desaceleração dos sinais “hawkish” (inclinados ao aperto) emitidos pelo colegiado, o que é compatível com o encerramento do ciclo com a Selic nos níveis atuais.

O Itaú desenvolveu uma ferramenta sistemática para analisar a comunicação dos bancos centrais pelo processamento de linguagem natural (NLP, na sigla em inglês), um ramo da inteligência artificial que trabalha com a “machine learning” e a linguística. O banco, assim, aplicou a ferramenta nas atas das reuniões do Copom e construiu um indicador “hawk-dove” (ou seja, mais ou menos inclinado ao aperto monetário) ao calibrar sentenças de atas do Copom entre 2016 e 2022 e analisar os momentos em que a Selic passou por cortes, por altas e por manutenção.

A modelagem se dá por sentenças classificadas como “dovish” (direção de menos juros, com pontuação -1); neutras (pontuação zerada); e “hawkish” (direção de mais juros, com pontuação +1). De acordo com o Itaú, o índice “hawk-dove” chegou a se aproximar de +1 neste ano, mas recentemente o nível “hawkish” mostrou desaceleração e o indicador está em torno de +0,3 ponto.

“Existe um crescimento da ciência de machine learning e muito tem sido feito ao se usar técnicas de processamento de linguagem natural (ou NLP, na sigla em inglês), que podem ser empregadas para mitigar vieses. Usar esse tipo de técnica nos permite ter tempestividade e algo diferente da análise humana somente”, observa Axel Simonsen, superintendente de mesa quantitativa da tesouraria do Itaú BBA.

Para o “treinamento” do modelo, o Itaú utilizou 14 atas de reuniões do Copom entre 2016 e 2022 e considerou um total de 585 sentenças únicas. Além disso, os profissionais do banco selecionaram atas de momentos importantes do ciclo de política monetária, em decisões nas quais o colegiado optou pela manutenção da Selic, por iniciar um processo de redução de juros ou por começar a elevar a taxa.

“Na hora de treinar o modelo, o momento de extrair os vieses é muito importante e, em relação às atas das decisões, os ciclos são bem claros”, afirma Simonsen. O executivo, assim, aponta que usar a comunicação adotada pelo Copom em um pedaço sequencial de um ciclo de alta ou de queda dos juros no treinamento do modelo traria um viés, já que as palavras usadas se refeririam a um ciclo específico.

“A máquina está sendo treinada. Assim, nesse primeiro momento, um dos cuidados que nós tivemos foi o de pegar sentenças de ciclos diferentes. As 14 atas são de estágios diferentes de cada ciclo. Isso torna as coisas mais independentes na análise. Em um segundo momento, nós pegamos sentenças desses 14 documentos, embaralhamos e, com a ajuda da área macroeconômica, analisamos. Foi uma mistura de frases inseridas e elas poderiam vir de atas variadas”, explica Simonsen. “Na hora de classificar as frases, isso ajuda a tirar o viés, já que são ciclos diferentes.”

No momento, a ferramenta do Itaú ainda trabalha somente com as atas de cada decisão do Copom, mas, de acordo com a economista Júlia Passabom, a intenção do banco é a de expandir o uso, futuramente, para os comunicados das decisões e para a comunicação feita pelos diretores do BC no período entre reuniões do Copom.

“As atas detalham o processo de política monetária, mas são menos frequentes. É um dos pontos da comunicação, mas existem outros ao longo do caminho. Sabemos lidar melhor com dados de atividade econômica e de inflação. A ideia é expandir esse indicador também para os comunicados e para a parte dos discursos”, diz Passabom. Ela observa, ainda, que a ferramenta trabalha com documentos em inglês e que um dos pontos a ser trabalhado seria o de adaptar para o português.

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