O que falta ao Ministério da Fazenda para animar os investidores?

Por enquanto, o mercado financeiro não reagiu bem aos nomes indicados para o futuro Ministério da Fazenda

O mercado acordou animado na terça-feira (20) e o Ibovespa, como das cinzas, registrou alta e recuperou o saldo positivo para 2022.

A tramitação da PEC de Transição desidratada para deixar os gastos com o Bolsa Família de R$ 600 em 2023 de fora do teto acalmou os ânimos.

Mas, por outro lado, desde que foi nomeado por Lula (PT) para o Ministério da Fazenda, Fernando Haddad ainda não conseguiu animar investidores com sua equipe.

O número 2 de Haddad no Ministério da Fazenda será, na verdade, um nome conhecido na Faria Lima. O economista e ex-diretor do Banco Fator Gabriel Galípolo aceitou o convite à Secretaria-Executiva da pasta.

Outro nome que agrada economistas e investidores é o de Bernard Appy, que será secretário especial da Reforma Tributária, definida como prioritária por Haddad e Lula.

Mesmo com nomes técnicos anunciados — nem Appy ou Galípolo são filiados ao PT — o que falta para Fernando Haddad encantar a Faria Lima? Quem pode ser nomeado para sanar as preocupações do mercado?

Mais do que um nome técnico, Haddad é negociador

O mercado inicialmente esperava nomes mais liberais e com um grau de parentesco por ser ‘de casa’. Henrique Meirelles, ex-presidente do BC, era um deles.

Mas uma vez abandonada essa expectativa, a realidade pairou sobre a B3; Haddad foi precificado como favorito para assumir a pasta.

“Obviamente o mercado não é a favor do governo petista, por isso segue com o pé atrás [sobre Haddad na Fazenda]”, diz Piter Carvalho, economista-chefe da Valor Investimentos. Ele ressalta que a principal preocupação do mercado hoje é sobre a questão fiscal.

O ex-prefeito possui um currículo menos técnico do que seu antecessor, Paulo Guedes, mas não vazio de experiência na área.

Além de ter mestrado em economia pela FEA-USP (Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo), Haddad foi assessor especial do Ministério do Planejamento e subsecretário de Finanças da Prefeitura de São Paulo em 2003.

As falas de Haddad para aparar as arestas das alfinetadas de Lula ao “glorioso mercado”, como o eleito se refere à Faria Lima, tem sido positivas, nesse sentido.

O futuro ministro está envolvido nas negociações da PEC de Transição, ocupando parte de sua agenda com encontros com parlamentares. Justamente por isso, Haddad informou que teria que adiar as nomeações para o Ministério da Fazenda.

“Mais do que um nome técnico, é como negociar dentro da política. Tínhamos o Paulo Guedes, que era mais técnico, mas não sabia negociar, o que levou muita coisa a não andar”, afirma Carvalho.

O Haddad deve fazer esse meio de campo. Ele tem anos de experiência na política. Deu certo, por exemplo, com o Fernando Henrique na década de 90, quando ele era ministro da Fazenda. Ele fazia o jogo político e tinha uma equipe mais técnica. A perspectiva é de que isso dê certo pelos próximos quatro anos.

Piter Carvalho, economista-chefe da Valor Investimentos

Guilherme Mello no Ministério da Fazenda de Haddad?

Ao lado de Haddad, afirma João Abdouni, analista sênior da casa de análises Inv, dois nomes devem se destacar.

O primeiro já dentro da equipe é o de Galípolo, mas Abdouni acredita que o economista Guilherme Mello deve integrar a Fazenda para 2023. “São duas figuras com um perfil mais desenvolvimentista e que dizem que o Estado deveria gastar mais. Esse tipo de política não agrada muito o mercado”, diz o especialista.

A taxa de juros futuros elevada e as sucessivas quedas na bolsa de valores em dezembro refletem o desgosto do mercado financeiro a um perfil mais desenvolvimentista. Na semana em que anunciou Aloizio Mercadante para a presidência do BNDES em 2023, o Ibovespa reagiu negativamente, com queda acumulada de 4,3%. Lula disse que queria um nome para “pensar em desenvolvimento”.

“O mercado está esperando para ver o que vai acontecer com a reforma tributária, como vamos manter a inflação estável em pelo menos 6%”, destaca Abdouni, completando que não houve descontrole fiscal nos dois mandatos de Lula.

O ideal para o mercado financeiro confiar no novo governo seria a entrega de um superávit primário próximo de 0, ou um déficit primário menor. Para isso, não importa o quão técnico seja o titular da Fazenda, esclarece Abdouni.

O que falta ao Ministério da Fazenda?

Em critérios técnicos, Bruno Komura, analista da Ouro Preto Investimentos, opina que faltam mais nomes liberais na Fazenda de Fernando Haddad.

“O Galípolo talvez não agrade tanto o mercado porque ele segue uma linha de aumento de despesas para continuar crescendo”, argumenta o analista.

O nome de Bernard Appy agrada o mercado pela extensa experiência no âmbito da reforma tributária. Mas ainda falta alguém com o perfil fiscal na veia para repensar as despesas do governo.

É um buraco de poderia ser preenchido pelos economistas tucanos, como Pedro Malan, ex-ministro da Fazenda, Arminio Fraga, ex-presidente do BC, ou Persio Arida, que presidiu o BNDES e o BC.

Na opinião de Denis Medina, professor da Faculdade de Comércio de São Paulo (FAC-SP), o nome de Felipe Salto, ex-secretário da Fazenda de São Paulo, para a Secretaria do Tesouro seria bem-recebido pelo mercado.

“É um economista renomado, pode ser um bom nome”, diz Medina. “Mas o problema não é a equipe interna, é tudo o que está acontecendo em volta. Por mais que haja direcionamento de dentro do Ministério da Fazenda, é possível que surjam problemas para administrar a quantidade de despesas no governo.”

O que Haddad pode fazer para animar o mercado?

Conforme Medina, basta Haddad esclarecer como pretende criar uma política de austeridade fiscal. “O que pode jogar ânimo no mercado é o governo dizer com todas as letras ‘teremos austeridade’. Esse governo que está entrando está muito mais com cara de governo Dilma do que parecido com o Lula 1”, diz o professor da FAC.

Os investidores e empresários querem uma mensagem mais clara do novo governo para que ele faça mais com menos. “Por enquanto só falaram de expandir [os gastos]. Esse é o grande receio. De expandir ministérios, fazer as empresas gastarem, usar o BNDES para distribuir financiamentos”, pontua Medina, criticando a política de campeãs nacionais adotada pelo banco de desenvolvimento nos governos petistas.

“Acho que mais do que um nome para a Fazenda, o mercado espera a resposta para a pergunta: ‘este país vai parar em pé depois do governo [Lula], ou vamos pagar a conta nos próximos anos?'”, conclui Medina. Ou seja, é mais abrangente do papel incumbido a Haddad ou sua equipe.