SOJA3: CEO da Boa Safra vê oportunidade para aquisições e companhia forte após follow-on  

CEO da SOJA3 prevê anos de mais dificuldade para o agro e oportunidades para aquisições

A Boa Safra (SOJA3) se prepara para dobrar sua participação no mercado. Analistas apontam que a empresa tem hoje algo entre 7% e 8,5% do segmento de sementes no Brasil, podendo saltar para 15% nos próximos anos.

Em entrevista exclusiva à Inteligência Financeira, o CEO e cofundador da Boa Safra, Marino Colpo, afirmou que a recente oferta pública de ações (OPA), que rendeu mais de R$ 300 milhões à empresa, pode ajudar a concretizar esse crescimento de maneira tanto orgânica quanto via aquisições. “A gente fica muito mais forte para investir e está com uma capacidade consideravelmente maior”, avalia.

Então, nesse sentido, o executivo prevê anos de “mais dificuldade” para o agro com a queda no preço das commodities. Isso “abre algumas oportunidades” para aquisições, segundo o executivo, com a Boa Safra “capitalizada” e “com grande potencial” para ir ao mercado.

Assim, vale lembrar também que a empresa pode ser beneficiada pela queda no preço das commodities. Isso porque seu grande negócio é adquirir insumos, como a soja, para serem enriquecidos ou melhorados e, então, revendidos.

Boa Safra conta com novas culturas e áreas absorvidas da pecuária

Para tanto, o executivo conta com o avanço da tecnologia no desenvolvimento de sementes de soja, seu carro-chefe, mas também de outras culturas, como milho, e, agora, o trigo.

A ideia de Marino é que, em menos de 15 anos, o Brasil possa avançar de importador para autossuficiente em trigo ou até exportador, como aconteceu com o milho. “Quem sabe a gente não está à frente de um grande negócio?”, diz.

Ele compara a aposta no trigo com o sucesso do milho no país. Atualmente, o Brasil disputa com os Estados Unidos a posição de principal exportador do mundo, sendo que há duas décadas, o Brasil era importador da commodity.

Dessa maneira, para que esse avanço em diferentes culturas se concretize, a Boa Safra conta necessariamente com o aumento da área de plantio no país.

Segundo Marino Colpo, a conversão de áreas dedicadas atualmente à pecuária em áreas de plantio tornaria desnecessária a derrubada de vegetação para ampliação da capacidade de produção de alimentos do país.  

“Metade dessa área de pastagem, com o tempo, passaria para a agricultura”, avalia o CEO. “A ideia é sempre um manejo melhor do solo. Então, em tese, você consegue (com a conversão) produzir muito mais proteína e carboidrato por hectare”, avalia.

Então, veja a íntegra da entrevista clicando no player que está no começo da reportagem. A seguir, você pode ler os principais trechos da conversa com o executivo da empresa.

Inteligência Financeira: Os analistas preveem a Boa Safra (SOJA3) saltando de 7% para 15% do mercado. Como vocês pretendem chegar nesse nível de crescimento? Isso exige aumentar a área plantada? 

O Brasil pode dobrar a área plantada de 8% para 16% do território nacional em 20 anos, absorvendo metade da atual área de pastagem”, diz o CEO da Boa Safra, Marino Colpo

Marino Colpo – Se você pegar toda a área de agricultura no Brasil, falando todas as culturas (soja, milho, feijão, algodão, café, cacau etc.), dá em torno de 8% do território nacional. Quando você olha para a área de pastagem, é 16%. Então, a área de agricultura é metade da área de pastagem.

O que muitos especialistas acreditam é que parte dessa área de pastagem vai sair dessa área da agropecuária e virá para a agricultura. Então, acredita-se que nos próximos 15 a 20 anos, o Brasil dobre a área plantada de 8% para 16% e a área de pastagem vá devagarzinho reduzindo até chegar em 8%. Então, metade dessa área de pastagem, com o tempo, passaria para a agricultura.

Dessa maneira, é possível aumentar a área plantada, a área de cultivo do Brasil, sem a necessidade de derrubar nenhuma árvore, sem a necessidade de abrir nenhum tipo de área, apenas convertendo pastagens em área de produção. 

Inteligência Financeira: Essa projeção que vocês fazem de aumentar a área dedicada ao plantio tem a ver com pegar áreas que hoje são usadas pela pecuária, certo?

“Essa (redução da área de pastagem e aumento da área de plantio) é uma tendência que já ocorreu em outros países e que deve começar a ocorrer no Brasil também”, diz o CEO da Boa Safra (SOJA3)

Marino Colpo – A ideia é sempre um manejo melhor do solo. Então, em tese, você consegue, na agricultura, produzir muito mais proteína e carboidrato por hectare, neste caso, com o cultivo da soja e do milho. Então, se produz uma alta quantidade de proteína e de carboidrato.

No caso da soja, por exemplo, é feito o farelo e o óleo. O farelo é a ração animal e o óleo de soja tem vários usos, até como biodiesel. E no caso do milho, por exemplo, você pode fazer um etanol de milho e o que você sobra é o DDG (dried distillers grains ou grãos secos de destilaria), que também é alimento para os animais.

Então você tem uma tendência a gerar muita energia, muita proteína e muito carboidrato em termos de volume. E aí você consegue alimentar um rebanho muito maior com isso. Também consegue alimentar suínos, aves, peixes com toda essa ração gerada pela agricultura.

Mas o ganho energético ou aproveitamento energético por hectare é muito maior do que o boi no pasto, que é uma forma menos eficiente (de uso do território).

Você precisa de muita área de pastagem para manter um boi no pasto. Então, essa (redução da área de pastagem e aumento da área de plantio) é uma tendência que já ocorreu em outros países e que deve começar a ocorrer no Brasil também.

Inteligência Financeira: Esse crescimento está condicionado a esse aumento da área, ainda que seja ocupando parte do que hoje é dedicado à pecuária? 

Marino Colpo – Historicamente, é de onde tem vindo grande parte do crescimento (da agricultura), dessa área de pecuária convertida em área de plantio. E é o que muitos analistas acreditam. 

Inteligência Financeira: Você mencionou no ano passado que a capacidade de investimento da empresa estava em torno de R$ 600 milhões. E agora, com o follow on de R$ 300 milhões, a expectativa por aquisições aumenta?

Marino Colpo: “A gente acredita muito nessas possibilidades de investimento, com um pipeline orgânico e de aquisições

Marino Colpo – A gente fica muito mais forte para investir e está com uma capacidade consideravelmente maior. A gente acredita muito nessas possibilidades de investimento, com um pipeline orgânico e de aquisições para fazer.

A Boa Safra (SOJA3) é uma empresa que investiu muito forte de 2021 (ano do IPO) para cá. Muito (desse investimento) na cultura da semente de soja. Mas, agora, a gente tem investido um pouco mais em vender também outras sementes, com tratamentos e mais tecnologia.

E não só isso, a gente também tem ampliado o nosso portfólio de sementes. Então, em 2022 e 2023, fizemos grandes investimentos em sementes de milho. A gente continua expandindo essas culturas. A gente está entrando também na semente do sorgo, que foi anunciado no ano passado. E temos a semente de feijão e de forrageiras.

E a partir deste ano vamos entrar também na semente de trigo. Então, todas essas culturas agora fazem parte do portfólio da Boa Safra. A gente tem uma marca e um acesso muito grande a revendas, a produtores, e a gente quer ter uma amplitude maior de produtos e culturas para oferecer aos nossos clientes.

Inteligência Financeira: E esse avanço sobre a cultura do trigo será via aquisições? Como vocês planejam essa expansão? 

Marino Colpo – Então, a gente tem sempre um olho por aquisições, mas a princípio é orgânica. A cultura do trigo é algo bem interessante. O Brasil hoje é importador de trigo. Tradicionalmente, o trigo de qualidade só é produzido na região fria.

Antigamente não se produzia soja no cerrado brasileiro e os Estados Unidos eram o grande produtor global de soja. Nos últimos 50 anos, alguns materiais (para plantio da soja) foram trazidos para a Argentina, que tem um clima similar ao americano. E a soja começou a entrar na Argentina.

Depois, a Embrapa começou a pegar materiais de soja, subir para o sul do Brasil e aí foi subindo para o Cerrado. Então, a soja no Cerrado tem 50 anos. As cultivares vieram de um clima frio e foram adaptadas para um clima tropical.

Hoje, no Cerrado, se produz mais soja do que no Hemisfério Norte. Mais soja do que na Argentina. 

Milho é exemplo de ‘conversão’ de culturas fria para o clima tropical a toque de caixa

No ano passado, o Brasil foi o maior exportador de milho do mundo. Esse ano a gente caiu para a segunda posição, mas a gente já está brigando com os Estados Unidos passo a passo este ano. Talvez, no ano que vem, a gente volte à primeira posição novamente. E todo esse melhoramento genético que tirou o milho do clima frio e trouxe para o Cerrado foi em apenas 15 anos.

Hoje a gente está à frente de um projeto junto com a Biotrigo (empresa brasileira de melhoramento de trigo). Eles querem também trazer o trigo de um clima temperado para ser produzido no Cerrado. Então, a gente está começando com novos materiais, novas culturas e acredito que isso possa ser feito em muito menos do que 15 anos.

E quem sabe a gente não está à frente de um grande negócio e o Brasil possa parar de ser um importador de trigo e de repente virar autossuficiente? Ou, em alguns anos, possa exportar. E isso depende muito da tecnologia e da adequação desses materiais. A gente está vendo um grande potencial. 

Inteligência Financeira: Ano passado as empresas do agro estavam com múltiplos muito altos. Como você avalia a situação hoje, esses múltiplos já estão normalizados? É o momento de a SOJA3 ir ao mercado para fazer novas aquisições?

Marino Colpo – A gente teve múltiplos muito altos no passado e mesmo assim a gente conseguiu fazer duas aquisições, uma no ano de 2022 (Bestway Seeds) e uma no ano de 2023 (DaSoja). Então, mesmo com múltiplos altos, a gente acha que foi capaz de agregar valor aí para os nossos acionistas. Agora, a gente vê uma nova janela com muita oportunidade.

Então, a gente tem olhado muitas coisas, você tem um momento com um pouco mais de desafio para o agro, com uma queda no preço das commodities recentemente.

Você tem uma situação de juros ainda muito altos no Brasil. Então, isso abre algumas oportunidades. A gente vê como oportunidade para a Boa Safra, empresa que está capitalizada, que tem um grande potencial de investir. E a gente quer olhar, sim, para aquisições. Nós temos, sim, vontade de fazer mais M&As.

Eu acho que o Brasil tem oportunidade de ouro no agro. Quando eu olho os (próximos) dez anos, o Brasil vai ser o grande produtor de alimentos para o mundo. A demanda por proteína e por carboidrato vegetal é muito grande. Muita gente está melhorando o seu perfil de consumo, consumindo mais carne, mais proteína. Então, tem uma oportunidade imensa no Brasil. É lógico que sempre o mercado foi cíclico. Talvez a gente passe por um ou dois anos de maior dificuldade. Mas a gente acha que essa pode ser uma oportunidade para a Boa Safra se posicionar em bons negócios. 

Inteligência Financeira: Essas aquisições, a ideia é que sejam no setor de soja mesmo, ou em outras culturas também?

Marino Colpo – A gente está olhando o setor de sementes como um todo, tanto de soja quanto milho, trigo, feijão, forrageiras. A gente quer realmente se tornar uma empresa que venda sementes com tecnologia em diversas culturas.

Inteligência Financeira: O Brasil passa por questões delicadas relacionadas ao clima. Como o agro encara essa situação e como a Boa Safra (SOJA3) vê o impacto disso sobre as suas operações?

Marino Colpo – Eu vejo o agro muito preocupado com essa questão, ao contrário do que é pintado. A grande maioria dos produtores que eu converso é superpreocupada, eu vejo que o produtor é realmente um amigo do meio ambiente. A maioria esmagadora deles segue todo o modelo que você tem no Brasil de preservação de mata ciliar, de área verde.

Eu vejo que o produtor está muito mais preocupado, ele é muito mais amigo do meio ambiente. Talvez o produtor seja ruim a princípio em fazer uma propaganda disso, mas se você pega a legislação ambiental e o que é cumprido no Brasil, é muito superior a, por exemplo, Europa ou EUA. Nesses locais, você realmente não vê área verde, não vê preservação em torno dos rios. Não existe isso que ocorre no Brasil.

Follow-on da Boa Safra (SOJA3) na B3 em abril de 2024.
Follow-on da Boa Safra (SOJA3) na B3 em abril de 2024. Foto: divulgação

Então, eu acho que o Brasil está na dianteira, ele só não está mostrando. Apesar de que, obviamente, em algumas regiões, que é exceção no Brasil, existe um menor número de produtores com problemas.

Nessa questão de sustentabilidade destacamos nossa entrada no ramo de forrageiras. Existe, hoje, muita pesquisa sobre a utilização de forrageiras para uma terceira safra para que você fixe mais carbono no solo. Então, em tese, tem se estudado muito isso, de fazer um cultivo de soja, milho e forrageira.

A forrageira melhora o solo porque é utilizada como um fertilizante orgânico, que diminui a necessidade de compra de fertilizante. Além disso, talvez a mais eficiente das culturas em retenção de CO2.

Inteligência Financeira: O agro corresponde a aproximadamente um terço do PIB brasileiro, mas a participação na bolsa ainda é muito pequena. O que falta para o setor crescer de maneira relevante nesse ambiente?

Marino Colpo – Eu acredito que sim. A gente realmente precisa de uma bolsa com mais cara de Brasil. Hoje é muito tímida a presença do agronegócio na bolsa, tem uma grande oportunidade. O o que eu sentia era que havia poucos analistas do setor e algumas gestoras não tinham equipes dedicadas a isso. E isso está mudando muito.

Agora que fomos a mercado de novo (durante o follow-on), eu senti muito essa mudança. Muito mais cobertura para as empresas do agro, e uma grande maioria, quase todas as assets com as quais a gente conversou têm times dedicados. E eu acho que o agro tem tudo para vir para bolsa e ter grande crescimento no mercado de capitais.

A gente está passando por um momento um pouco mais difícil no mercado de capitais, não só no Brasil, mas lá fora também. Então, eu acho que, no momento certo, tem muita vontade dos investidores e também muita vontade das empresas. Então, eu acho que vai acabar chegando, eu sou um entusiasta disso.