Open Finance completa dois anos com desafio de consolidar a revolução dos dados

Em minha coluna de estreia na IF, trago uma reflexão sobre como as iniciativas digitais e, principalmente o Open Finance, protagonizam as agendas de inovação dos mercados financeiros

Ao contrário do que muitos pensam, a agenda de digitalização do mercado financeiro não é algo recente. Entre 1996 e 2001, para entender e explicar a bolha especulativa gerada à época pelas empresas ponto-com, criou-se o termo Startup.

A nomenclatura, que até então era usada como sinônimo de um grupo de pessoas trabalhando por uma ideia diferente e com potencial de fazer dinheiro, viraria, posteriormente, a definição que conhecemos hoje: empresas ”jovens”, operando em um modelo de negócios escalável dentro de um contexto regado a incertezas e soluções a serem desenvolvidas.

As startups são grandes catalizadoras de todas as transformações tecnológicas –incluindo o próprio Open Finance. Mas como?

Contexto: Brasil, brasileiro

O sistema bancário brasileiro sempre teve um histórico de investimento de tecnologia para mitigar os impactos da inflação. A presença de novas startups, com foco em soluções trazendo rapidez e eficiência, ajudaram na transformação de perfil e mentalidade dos clientes. Isso incentiva, então, um ambiente mais flexível para criação, emersão e adaptações de novos negócios.

Mensurando impactos, uma das figuras que mais recebe os efeitos dessas mudanças foi e segue sendo o sistema financeiro. Com o surgimento das fintechs (termo derivado de ‘financial technology’, usado para definir as startups focadas em produtos financeiros) e, consequentemente, a ampla oferta de opção, os usuários passaram a ser mais exigentes, extremamente imediatistas e donos do seu próprio consumo.

Os reflexos são comprovados pelas estatísticas brasileiras: hoje, o Brasil é o principal hub de fintechs da América Latina em termos de investimento e, segundo pesquisas, cerca de 65% da população afirma que já usou o serviço de uma fintech pelo menos uma vez.

A evolução das ofertas, o disparo da concorrência e o surgimento dos pagamentos instantâneos desenvolveram-se de maneira tão significativa que, hoje, vemos chegar ao contexto nacional modelos até então só vistos no exterior.

É o caso do tal do Open Finance, que foi apresentado em 24 de março de 2022. Ele nada mais é do que uma evolução do Open Banking, que a partir de 2020 trouxe diversas inovações (como o PIX) para a vida dos brasileiros. Com ele, é justo dizer que o mercado financeiro no Brasil não é mais o mesmo.

Papo de gringo, Open o quê?

Tudo começou lá na Europa. Em 2013, na União Europeia, a EBA (European Banking Authority) criou o e-APWG, futuro ‘’Open Banking’’ – um grupo de especialistas que tinha por objetivo avaliar inovações em pagamentos eletrônicos alternativos.

O Parlamento Europeu e o Conselho da União Europeia, acompanhando o desenvolvimento dos estudos, firmaram, em 2015, a necessidade de modernizar a regulação de meios de pagamento (PSD-2007) e adotaram, em 2016, a Segunda Diretiva de Meios de Pagamento (PSD2), que deu origem ao Open Banking.

Uma das principais inovações do PSD2 foi a abertura do mercado financeiro e de pagamentos para terceiros prestadores de serviços, que oferecem novos produtos e soluções financeiras com base no acesso dos dados bancários dos usuários mantidos junto a outras instituições.
Dessas iniciativas, emergiram, então, diversas oportunidades para o mercado de startups – e, consequentemente, o requerimento para mudanças e modernização tecnológica dos incumbentes – levando à total transformação digital do ecossistema.

Nasce então, na Inglaterra, o Open Banking. Trata-se de um sistema financeiro aberto, com compartilhamento padronizado dos dados, produtos, e serviços de maneira integrada. Também chamado de “sistema bancário aberto” ou “banco aberto”, o conceito tem três pilares: autonomia, mobilidade e personalização.

Open Banking azul, verde e amarelo que virou o Open Finance

Olhando para dentro de casa, é fato que as características do mercando financeiro brasileiro se assemelham às britânicas do ponto de vista de concentração bancária. Não à toa, a regulação do Brasil ao redor do tema teve como inspiração o caso bem sucedido da Inglaterra.

Depois de muito estudar o case internacional, em abril de 2019, o Banco Central do Brasil (o Bacen) divulgou as diretrizes que permitiriam a implementação do Open Banking. Torna-se de extrema importância os padrões tecnológicos e de qualidade das instituições, segurança da informação e proteção de dados – tripé que sustenta o ‘’mercado aberto’’ no cenário nacional.

O Open Finance funciona da seguinte forma: Em linha com a Lei de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), desde que o cliente autorize, as instituições financeiras são obrigadas a compartilhar dados, produtos e serviços com outras instituições, por meio de abertura e integração de plataformas e infraestruturas de tecnologia, de forma segura, ágil e conveniente. Com isso, o cliente final pode escolher um produto ou serviço de qualquer instituição, e não apenas da que ele concentra seus recursos.

No Brasil, o ‘’banco aberto’’ trilhou um planejamento gradual de implementação, dividido em quatro etapas graduais. Vale mencionar que a primeira fase ocorreu em 1º de fevereiro de 2021, quando foi estipulado o início do compartilhamento de dados de forma padronizada entre as instituições financeiras. Ou seja, o sistema acaba de completar 2 anos de implantação!

Apesar do ritmo mais conservador devido à definição de fases graduais, o serviço já atingiu a marca de, aproximadamente, 15 milhões de clientes únicos e 22 milhões de consentimentos ativos no sistema com mais de 800 instituições participantes – dentre bancos, cooperativas de crédito e fintechs. Segundo a Febraban, desde sua implementação em terras brasileiras, o Open Finance também contabilizou 10,8 bilhões de comunicações bem-sucedidas entre as instituições integrantes do sistema para a troca de informações. Essas informações, por sua vez, são usadas para oferecer ao consumidor melhores ofertas de produtos e serviços personalizados e com melhores custos. Ao todo, foram mapeados 45 produtos e serviços já oferecidos aos clientes. Dentre os produtos, estão agregadores financeiros para iniciação de pagamentos e soluções para ofertar melhores propostas de crédito.

Olhando para o futuro

Dentro desse contexto, fica claro que o Bacen está sendo bastante corajoso e inovador em relação à iniciativa. Para 2023, a expectativa é de que essas instituições passem a oferecer o compartilhamento de dados dentro de novos grupos, tais como investimento, seguro, previdência e câmbio. Além disso, é possível que o Open Finance também indique a implementação de funcionalidades direcionadas à Pessoa Jurídica, afinando cada vez mais o compartilhamento de dados e de iniciação de pagamento.

Só no primeiro ano, o nosso Open Finance atingiu objetivos que o país “inspiração”, Reino Unido, levou 5 anos para conseguir. Porém, mesmo com o sucesso nos números, ainda estamos longe do ideal. Apesar da aderência dos usuários para compartilharem seus dados, há uma certa falta de clareza sobre o tipo de vantagem que o correntista pode vir a ter. Espera-se que neste ano, os incentivos para o consumidor final fiquem mais claro. Os especialistas dizem que o ano de 2022 foi um ano de descoberta e que 2023 é o ano da consolidação. Veremos!

Por aqui, como uma pessoa apaixonada por tecnologia e entusiasta de mudanças que vem para melhorar nossas vidas e abrir novas fronteiras – estou animada com o que vem por aí.