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Investimento em capital privado supera Bolsa na última década
A indústria de private equity e venture capital viu o Ibovespa pelo retrovisor na última década. Segundo pesquisa da Associação Brasileira de Venture Capital e Private Equity (ABVCAP), a taxa interna média anualizada de retorno dos fundos do setor, em reais, foi mais que o dobro do principal índice da bolsa brasileira entre 2010 e 2020.
De acordo com o estudo, no agregado, os fundos de capital de risco, ou VC, e os de participação em empresas apresentaram retornos médios de 17,5% em reais e 11,2% em dólar em dez anos. Já o Ibovespa registrou um rendimento anual médio nominal de cerca de 7,4% no período.
De acordo com o levantamento, os 25% melhores fundos da base de 381 veículos analisados pela gestora Spectra junto com o Insper apresentam retorno acima de 60% em reais e de 52% em dólar nos últimos dez anos. Conforme o cientista de dados da Spectra Investments, Humberto Gallucci, “na década passada, o venture capital apresentou retorno melhor [ante o private equity], ajudado pelas boas marcações de mercado, com empresas marcadas a valores bem altos e com um cheiro de bom retorno”. Na visão de Gallucci, “investir em capital privado aparentemente pareceu melhor do que investir na bolsa na década que passou”.
Conforme o especialista, porém, a redução da liquidez em âmbito global, com um cenário macroeconômico complexo, tende a afetar negativamente a captação e o desempenho dos fundos de venture capital neste ano e no próximo. “Temos um processo global de ajuste”, reforça o presidente da ABVCAP, Piero Minardi.
O dirigente lembra ainda que o ambiente de transformação tecnológica ajudou na performance dos fundos de venture capital. “O VC nos últimos cinco anos no Brasil foi ajudado por uma explosão de digitalização e soluções que surgiram para resolver as dores das empresas”, diz Minardi, que também é gestor de fundos de private equity.
“Acho que teve um movimento natural de busca de [investimento em classes] alternativas porque o juro caiu. Muita gente começou a alocar. Agora vamos ver o que vai acontecer. Acho que muitos não vão voltar, que é o que eu temo com essa alta de juros.”
A professora do Insper Andrea Minardi ressalta, porém, que a rentabilidade em reais foi muito expressiva. “A média foi de 17% anualizados e tem muitos fundos que deram acima de 20%. Para o varejo é uma classe mais complicada e precisa de uma educação, mas é interessante abrir um pouco e dar uma alternativa para planos de aposentadorias. Faz muito sentido porque traz rentabilidade muito alta no longo prazo.”
Gallucci explica ainda que, nos últimos cinco anos, “quem sustentou o venture capital no Brasil foram as famílias [de alta renda] e investidores individuais, por meio dos family offices”. De acordo com o cientista de dados, “nesse período, os estrangeiros pararam de investir no Brasil”.
Para Andrea, do Insper, neste ano e no próximo haverá uma queda de avaliação do valor das empresas nos portfólios por conta da situação macroeconômica. No entanto, o momento pode ser oportuno para alocar recursos e aproveitar um futuro retorno no médio e longo prazos. “Algumas safras vão sofrer. Tem alguns fundos que vão ter de sair agora e vão pegar a queda de valoração. Mas no longo prazo toda essa transformação digital e de sustentabilidade mantêm o potencial de crescimento.”
Gallucci acredita que os fundos que captarem neste ano e fizerem investimentos nos próximos “vão aproveitar um ‘valuation’ muito baixo”. Conforme o cientista da Spectra, é uma oportunidade de “aproveitar essa baixa, porque esperamos que, em algum ponto no tempo, nos próximos cinco a seis anos, os valuations voltem a aumentar”.
Minardi, da ABVCAP, diz que, nos últimos anos, em um cenário de forte liquidez, viu muitas empresas fazendo duas ou três rodadas de captação no mesmo ano, querendo aproveitar todos os rounds que pudessem. “Agora temos visto um retorno à racionalidade, as boas empresas vão continuar sendo boas, as tendências tecnológicas continuam e tem todo um ciclo virtuoso que não acabou, ou seja, os bons ativos vão sobreviver”.
Ainda que as avaliações não voltem para os níveis dos anos de estímulos injetados pelos bancos centrais, “quem entrar agora pega um ciclo positivo de volta dos valuations”, afirma Minardi.
Gallucci vê possibilidade de os fundos retomarem as captações a partir de novembro, após as eleições. “A captação dos fundos brasileiros está quase parada, tem poucos fundos captando em meio a uma combinação de taxa de juros em elevação, eleições e outras incertezas. Com quem a gente tem conversado, a intenção é de voltar a campo a partir de novembro, quando esperamos que tenha terminado o ciclo de aperto monetário e após as eleições.”
O presidente da ABVCAP diz que, “até alguns anos atrás, quase 80% do que era captado vinha de estrangeiros, mas esses estrangeiros foram embora”. Minardi explica que a volatilidade cambial fez o investidor de fora “sofrer muito por conta do câmbio, que, obviamente, comeu o retorno”. Para o dirigente, “o estrangeiro não está olhando o Brasil como confiável e tem muitas restrições ao país nesse período de incertezas e eleições”.
Para o próximo ano, porém, há fatores positivos para o país retomar a atratividade. “O rearranjo das cadeias de valores globais pode dar ao Brasil uma possibilidade de investimento muito interessante no longo prazo. O problema é que nós temos, infelizmente, uma tradição de chutar pênalti por cima.”
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