Ritmo de cortes da Selic será avaliado no começo de 2024, indicam economistas

Para especialistas, ata do Copom garantiu pelo menos mais duas reduções na taxa básica de juros

A ata da última reunião do Copom (Comitê de Política Monetária), que baixou a taxa Selic de 12,75% para 12,25%, teve como destaque a mensagem de cautela nos próximos passos da política monetária. Isso, conforme o documento divulgado nesta terça-feira (7) pelo Banco Central, diante do aumento da incerteza global e com um alerta sobre a questão fiscal no Brasil.

Ainda assim, o comitê reiterou que os juros básicos da economia devem seguir caindo em um ritmo de 0,50 ponto percentual, mas que a extensão do ciclo de afrouxamento vai depender de como a dinâmica inflacionária vai evoluir daqui para frente. Na avaliação de economistas, o Copom sinalizou que deve avaliar a magnitude dos cortes na segunda reunião de 2024, prevista para 19 e 20 de março.

Menor espaço para baixar os juros?

Para Mario Mesquita, economista-chefe do Itaú Unibanco, a ata da reunião do Copom indica, assim como o comunicado, disposição em manter o atual ritmo de flexibilização de 0,50 pontou percentual nas próximas reuniões. “Ou seja, pelo menos, dezembro e janeiro”, anota.

Mas o texto, segundo Mesquita, inclui vários acenos na direção de um menor espaço para cortes de juros, incluindo a preocupação com expectativas de inflação desancoradas, perspectiva de uma desinflação mais lenta no futuro, uma possível fraqueza do real devido ao ambiente externo e até uma deterioração fiscal

“Em suma, o texto confirma que nas próximas reuniões haverá cortes de 0,50 ponto e, após isso, o comitê poderá reavaliar a sua postura. Dito isto, o Copom fez suas projeções com taxa de câmbio (dólar) que se situava em R$ 5,00, e agora está ao redor de R$ 4,90”, comenta o economista-chefe do Itaú.

“Apenas esta mudança pode muito bem levar a uma projeção de inflação mais baixa na próxima reunião, o que tornará um pouco mais difícil para o comitê manter seu viés atual, relativamente duro. Esperamos que o comitê reduza a taxa Selic para 11,75% na reunião de dezembro, e para 9,50% em 2024”, afirma.

Fiscal x cenário internacional

Rafaela Vitória, economista-chefe do Inter, destaca que a ata do Copom reconheceu a dinâmica mais benigna da inflação. O que, para ela, reforça a expectativa dos próximos cortes de 0,50 ponto na taxa Selic. “Que ainda está em patamar bastante restritivo”, diz.

Por outro lado, Rafaela considera que a desancoragem das expectativas, em parte associada às incertezas sobre o ajuste fiscal, ainda preocupa e pode afetar cortes mais à frente, o que explica a cautela da autoridade monetária.

“Apesar do risco fiscal ter sido excluído do balanço de riscos, o Copom segue ressaltando a importância da credibilidade das regras fiscais para dar melhor visibilidade sobre a trajetória de dívida. A incerteza que ainda estamos observando, vinda do próprio governo quando discute uma revisão da meta, por exemplo, impacta o prêmio de risco e pode elevar o juro neutro da economia, tirando potencia da política monetária”, avalia.

“O cenário externo também foi destacado, mas o recente movimento de alívio nas taxas de juros lá fora e o câmbio no atual patamar de R$ 4,90 não indicam uma deterioração maior. Mantemos nossa expectativa de cortes de 0,50 ponto nas próximas reuniões até o 1º trimestre de 2024 e a taxa Selic no fim do próximo ano em 9%, compatível com a queda da inflação esperada”, aponta a economista-chefe do Inter.

Tom mais duro

João Savignon, head de pesquisa macroeconômica da Kínitro Capital, observa que o tom da ata do Copom foi mais “hawkish” (mais duro) que o do comunicado pós-reunião. “Foram destacados os diversos riscos do cenário prospectivo, seja do global mais incerto, seja do longo caminho para a ancoragem das expectativas e retorno da inflação ao centro da meta”, explica.

De acordo com o especialista, houve atualização da conjuntura global, trazendo o debate dos canais de transmissão para a economia brasileira e a avaliação da postura de maior cautela diante dos riscos envolvidos.

“Aqui um ponto chamou nossa atenção, de que um membro avaliou que o cenário externo introduzia viés altista para o balanço de riscos. Mais um sinal hawkish”, observa.

No cenário doméstico, prossegue Savignon, o Copom avaliou que houve progresso desinflacionário relevante, mas que há um longo caminho para a ancoragem das expectativas e retorno da inflação ao centro da meta.

“Destaque para o trecho em que o Copom fala do esgotamento de algumas fontes de desinflação, notadamente dos bens industriais e de alimentação”, comenta.

Já nos riscos fiscais, ele destacou o debate do comitê sobre o aumento dos prêmios de risco derivados da incerteza em torno da meta estabelecida e o alerta dos integrantes do colegiado sobre a importância da execução das metas sobre as expectativas inflacionárias.

“O ponto mais importante na nossa leitura foi o trecho no qual o comitê atestou que debateu a estratégia e a extensão do ciclo de cortes de juros em cada um dos cenários avaliados, dizendo que optou por manter a comunicação recente porque ela já embute a condicionalidade do ambiente incerto”, diz João Savignon.

“Na nossa opinião, isso quer dizer que a ata vai na direção do precificado no mercado atualmente, confirmando o plano de voo nas próximas duas reuniões, com cortes de 0,50 ponto, mas que se o cenário não evoluir conforme o esperado, o seu guidance poderá ser reavaliado e, consequentemente, o nível terminal de juros”, completa o especialista da Kínitro Capital.