Lula: “Nunca fomos irresponsáveis com finanças do país. Não haverá gastança”

O novo presidente foi enfático ao colocar a redução da desigualdade como prioridade de seu governo, sem comprometer as contas do país

Em seu discurso no parlatório do Palácio do Planalto na tarde deste domingo (1o.), logo após tomar posse como presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) abordou a maior preocupação do mercado financeiro em relação ao seu governo: as finanças públicas.

Lula lembrou as realizações dos seus dois primeiros mandatos, de 2003 a 2010, ressaltando que nunca foi irresponsável com as contas do país.

“Geramos mais de 20 milhões de empregos com carteira assinada e todos os direitos assegurados. Reajustamos o salário mínimo sempre acima de inflação. Batemos recorde de investimentos em educação […]. Mais que dobramos o número de estudantes no ensino superior, e abrimos as portas das universidades para a juventude pobre deste país. […] Fizermos o Farmácia Popular, que forneceu medicamentos a quem mais precisava, e o Mais Médicos, que levou atendimento a cerca de 60 milhões de brasileiros e brasileiras, nas periferias das grandes cidades. […] Investimos na agricultura familiar e nos pequenos e médios agricultores, responsáveis por 70% dos alimentos que chegam à nossa mesa, sem descuidar do agronegócio, que obteve investimentos e safras recordes, ano após ano”, afirmou. “Fomos capazes de realizar tudo isso cuidando com total responsabilidade das finanças do país. […] Fizemos superávit fiscal todos os anos, eliminamos a dívida externa, acumulamos reservas de cerca de 370 bilhões de dólares e reduzimos a dívida interna a quase metade do que era anteriormente.”

O novo presidente frisou: “Nos nossos governos, nunca houve nem haverá gastança alguma”.

Durante a campanha presidencial, Lula disse que o equilíbrio do orçamento não vem antes do investimento na população.

Quando o governo gasta mais do que arrecada, precisa se financiar no mercado financeiro, emprestando dinheiro dos investidores ao lhes vender títulos do Tesouro Nacional (aqueles que se compra pelo Tesouro Direto ). Quanto maior a dúvida em relação à capacidade de o governo honrar seus compromissos, mais os juros precisam subir para convencer os investidores a comprar. A taxa Selic , que é a referência da economia brasileira, está atualmente em 13,75% ao ano. O crescimento das despesas também explica o aumento dos juros de outra maneira: com mais dinheiro na economia, a inflação sobe, e a principal ferramenta com que o Banco Central conta para segurar o aumento de preços é a taxa de juros.

O aumento dos juros favorece as aplicações em renda fixa, tidas como mais seguras. No entanto, a Bolsa de Valores perde atratividade porque pode não render tanto quanto a renda fixa a ponto de compensar os maiores riscos que o investidor corre ao comprar ações de companhias abertas. Além disso, os juros pesam muito para as empresas que estão endividadas, prejudicando seus resultados, e ainda desencorajam o aumento do investimento nos negócios.

Daí os investidores e economistas darem tanta atenção à questão do orçamento.

Reindustrialização e fertilizantes

Se o compromisso de responsabilidade com as contas pode agradar o mercado, outras afirmações de Lula quanto à ecomomia podem cair mal.

Na primeira etapa da cerimônia de posse, no Congresso Nacional, o presidente afirmou: “O Brasil é grande demais para renunciar a seu potencial produtivo. Não faz sentido importar combustíveis, fertilizantes, plataformas de petróleo, microprocessadores, aeronaves e satélites. Temos capacidade técnica, capitais e mercado em grau suficiente para retomar a industrialização e a oferta de serviços em nível competitivo”.

O Brasil vem diminuindo a produção interna de fertilizantes com a saída da Petrobras desse negócio. Nos últimos anos, a petroleira estatal colocou à venda as suas fábricas de insumos agrícolas como parte de uma nova estratégia para se concentrar em sua principal atividade – a exploração de petróleo – e maximizar seus ganhos. O comentário de Lula neste domingo (1º) indica que, como aventado no mundo político e empresarial, a Petrobras pode dar uma guinada.

A intenção de maior participação estatal na economia ficou clara nesta passagem: “Os bancos públicos, especialmente o BNDES, e as empresas indutoras do crescimento e inovação, como a Petrobras, terão papel fundamental neste novo ciclo”.

Redução da desigualdade

Os comentários de Lula sobre questões específicas da economia foram colocados ao longo de discursos que enfatizaram a missão do novo governo: reduzir a desiguldade no Brasil. “Nenhuma nação se ergueu nem poderá se erguer sobre a miséria de seu povo”, disse.

“Eu e meu vice Geraldo Alckmin assumimos hoje, diante de vocês e de todo o povo brasileiro, o compromisso de combater dia e noite todas as formas de desigualdade. Desigualdade de renda, de gênero e de raça. Desigualdade no mercado de trabalho, na representação política, nas carreiras do Estado. Desigualdade no acesso a saúde, educação e demais serviços públicos. Desigualdade entre a criança que frequenta a melhor escola particular, e a criança que engraxa sapato na rodoviária, sem escola e sem futuro. Entre a criança feliz com o brinquedo que acabou de ganhar de presente, e a criança que chora de fome na noite de Natal. Desigualdade entre quem joga comida fora, e quem só se alimenta das sobras. É inadmissível que os 5% mais ricos deste país detenham a mesma fatia de renda que os demais 95%. Que seis bilionários brasileiros tenham uma riqueza equivalente ao patrimônio dos 100 milhões mais pobres do país”, afirmou.