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Índices europeus serão negociados na B3
A partir desta segunda-feira, a bolsa brasileira passará a listar contratos futuros referenciados no índice pan-europeu STOXX 50 e no alemão DAX. O primeiro acompanha o desempenho de 50 empresas de grande porte (as chamadas blue-chips) de oito países da União Europeia. O segundo mede os ganhos ou perdas das 40 principais companhias alemãs. Inicialmente, o alvo desse produto deve ser o investidor institucional, mas à medida que o volume de negociações engrossar, a expectativa é que se expanda também para o investidor pessoa física.
A chegada dos dois índices europeus à B3 ocorre num momento de valorização das bolsas europeias. Há pouco mais de um mês, DAX e STOXX 50 atingiram seus níveis históricos mais altos de fechamento. Os recordes foram registrados em meio a uma forte entrada de investidores iniciantes.
“Já havia sinais de crescimento do mercado financeiro antes da pandemia, mas os números subiam devagar. Com a crise da covid-19, isso acelerou”, explica Michael Grote, professor de finanças e corporações na School of Finance & Investment de Frankfurt. Ele diz que esse movimento ocorre devido à poupança forçada feita no período de restrições de de mobilidade, em que as pessoas não podiam ir a restaurantes, não podiam sair fazer compras, não podiam viajar. “Só que deixar o dinheiro guardado sem nenhum rendimento também não era um caminho, até porque tem crescido o número de bancos [principalmente na Alemanha] que aumentam a cobrança de dinheiro guardado.”
A taxa de depósito na zona do euro é negativa desde 2014. No caso da Alemanha, na maioria dos bancos a taxação incidia sobre contas com volume depositado entre € 100 mil e € 500 mil. Desde dezembro de 2019, no entanto, a situação no país começou a mudar. Pequenos bancos começaram a reduzir o valor inicial de cobrança por depósito, alguns chegando cobrar a taxa a partir do primeiro euro depositado.
Christian Kahler, chefe de investimentos estratégicos do DZ Bank, ressalta que outros fatores na pandemia ajudaram a impulsionar o mercado financeiro: como forma de contornar a crise da covid-19, os governos deram suporte às economias por meio de grandes programas, e os bancos centrais acalmaram os mercados financeiros com taxas de juros baixas e com compras de títulos. “Isso levou os mercados de ações a crescer acentuadamente”, diz.
Kahler afirma também que as empresas alemãs e europeias são fortemente voltadas para a exportação, e depois de alguns trimestres de gargalos e dificuldades em 2020, essas companhias já se beneficiam da retomada econômica global, pressionando para cima o preço das ações.
Olhando para balanços trimestrais, as maiores companhias dessas regiões têm mostrado bons resultados. Segundo dados compilados pela EY, mesmo com problemas de fornecimento, as principais corporações alemãs foram capazes de renovar recordes de vendas e lucros no período entre julho e setembro deste ano.
Os números apontam que as vendas totais das 40 empresas que compõem o DAX aumentaram 9% no período, em comparação com o terceiro trimestre de 2020, e subiram 4%, na relação com os mesmos três meses de 2019. Se observado os lucros operacionais, o número fica ainda mais atraente para o investidor. Enquanto o lucro antes juros e impostos (Ebit) das das empresas do DAX no terceiro trimestre de 2020 ficou em € 14,2 bilhões, no mesmo período deste ano o montante chegou a € 35,7 bilhões, um crescimento de 152%.
Diante desse cenário de dinheiro acumulado, dificuldade para obter rendimentos, incentivos de governos e bancos centrais, e companhias em forte recuperação, o resultado da equação foi simples: mais pessoas buscaram o mercado financeiro para alocar suas reservas.
De acordo com o Deutsches Aktieinstitut (Instituto Acionário Alemão), no primeiro ano da pandemia, 2,7 milhões de alemães passaram a investir, seja em ações, fundos e ETFs (fundos de índices) ou em ambos. A descoberta da Deutsche Börse, a bolsa alemã, ocorreu principalmente pelos jovens, ainda segundo a instituição. Com a chegada de 600 mil investidores com menos de 30 anos no ano passado, houve um aumento de quase 70% no público desta faixa etária.
O mesmo movimento é percebido na Euronext Paris, a bolsa francesa. De acordo com a Autorité des Marchés Financiers (Autoridade de Mercados Financeiros ou AMF), de 2019 até setembro deste ano foram contabilizados 965 mil novos pequenos investidores, sendo a maioria deles jovens. Para se ter uma ideia do rejuvenescimento do perfil dos aplicadores na bolsa, a média de idade deles era de 58 anos em 2018, enquanto em 2020 caiu para 46 anos.
Ao Valor, a AMF afirmou que “espera que esse fenômeno continue no longo prazo”. Na sua avaliação, é importante “que esses investidores novatos gradualmente construam uma cultura de mercado de ações e tenham uma visão de longo prazo”.
No Brasil não é diferente. Segundo dados da B3, o total de investidores pessoa física (o pequeno investidor) chegou a 3,8 milhões no primeiro semestre deste ano, um aumento de 43% na comparação com o mesmo período de 2020.
Com mais participantes no mercado, houve também maior pressão por diversificação nos investimentos, crescendo o interesse do brasileiro por ativos de companhias estrangeiras. Desde outubro do ano passado, os contratos de BDRs (Brazilian Depositary Receipts, na sigla em inglês) deixaram de ser exclusivos dos investidores qualificados, cuja carteira de investimento ultrapassa a soma de R$ 1 milhão. Com isso, a busca por ações de companhias de fora do país cresceu. Em janeiro deste ano, 2.248 investidores classificados como pessoa física detinham esse tipo de ativo, enquanto em novembro esse número saltou para 275,6 mil.
Por meio desses BDRs, o investidor já conseguia na B3 ter acesso a recibos que reproduzem ativos de empresas da zona do euro. Mas não havia contrato referenciado nos índices europeus.
Diante disso, ter acesso ao mercado brasileiro é “um importante passo para a Qontigo”, disse a provedora dos índices. Segundo a companhia, que pertence ao Deutsche Börse Group, o Brasil marcará a estreia desses índices na América do Sul. “Futuros do STOXX e do DAX oferecem aos investidores brasileiros a oportunidade de formar uma avaliação sobre o desenvolvimento da Europa e da Alemanha”, afirmou a provedora.
Para Cláudio Jacob, diretor internacional e de desenvolvimento de mercado da B3, a chegada desses contratos vai “democratizar o acesso às bolsas europeias”. “Porque caso contrário, o investidor, interessado em diversificar seus investimentos e ter contratos que espelham esses índices europeus, teria que abrir uma conta lá fora, que não é algo tão simples.”
Ainda que inicialmente o tamanho dos contratos seja mais voltado ao investidor institucional, a B3 espera que ao longo do tempo isso se estenda para outros perfis de investidor. “À medida que o volume de negociações evolui e formamos liquidez, fica mais fácil para criarmos ramificações”, afirma Jacob.
O índice alemão DAX, que há poucos meses se expandiu de 30 para 40 empresas, hoje chega próximo aos 15.450 pontos. Já o STOXX 50, que reúne empresas da Alemanha, França, Itália, Espanha, Holanda, Bélgica, Irlanda e Finlândia, hoje opera próximo dos 4.150 pontos. A previsão é que os indicadores sigam batendo recordes. Segundo projeção do DZ Bank, no fim do ano que vem o índice alemão deve alcançar 18 mil pontos, enquanto o indicador pan-europeu atingirá os 4.800 pontos.
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