Black Money e o comportamento financeiro da população negra: entenda o que está acontecendo

Uma característica comum das pessoas negras que investem é o perfil extremamente conservador

Você sabe o que é Black Money? E quais são os principais hábitos e comportamentos financeiros da população negra no Brasil? Como adiantei na coluna anterior – em que eu defendi a importância da representatividade para o crescimento da economia do país – nesta coluna, abordarei o Black Money. Além disso, também vou apresentar os resultados preliminares da pesquisa “Hábitos e Comportamento financeiro da população negra no Brasil”.

O que é Black Money?

O Black Money é um movimento que visa o empoderamento econômico-financeiro da população negra. O movimento liderado pelo ativista negro jamaicano Marcus Garvey surgiu nos Estados Unidos no início do século XX. O objetivo do movimento é ressignificar o termo Black Money, que até então era sinônimo de dinheiro obtido ilegalmente. Ressignificado, o Black Money incentiva o investimento da comunidade negra nela mesma.

Nos Estados Unidos, o movimento calculou o tempo que o dinheiro circula dentro de cada comunidade. Então, chegou-se aos seguintes dados: na comunidade asiática, o dinheiro permanece por 28 dias. Ou seja, o chinês recebe seu salário e come no restaurante de um chinês, compra na padaria de um chinês, coloca o dinheiro no banco de um chinês.

Já na comunidade judaica, o dinheiro permanece por 19 dias.

E, na latina, por 7 dias.

Por fim, na comunidade negra americana, o dinheiro fica por apenas 6 horas. Sim: 6 horas… No Brasil, ainda não há este estudo.

Além de incentivar o investimento da comunidade negra nela mesma, o Black Money é um movimento de representatividade (leia mais no artigo “A importância da representatividade na economia e no mercado financeiro”) que defende: “se não me representa, eu não consumo”.

Assim, isso também pressiona o mercado por mais representatividade, pois os negros correspondem por 51% dos empreendedores do Brasil e consomem anualmente 1,9 trilhões, sendo a maior fatia de consumo brasileira.

Com isto, o movimento Black Money faz com que a demanda pressione a oferta por produtos, serviços e profissionais mais representativos. Ele demonstra que racismo além de crime, é um problema social e econômico.

Similar ao Black Money, há outros movimentos como o Pink Money da Comunidade LGBTQIAPN+ e Economia Prateada, das pessoas 50+.

Comportamentos financeiros da população negra

Os resultados preliminares da pesquisa “Hábitos e comportamento financeiro da população negra no Brasil” buscam compreender como a população negra se relaciona com o dinheiro e com os investimentos e avaliar a necessidade e interesse por educação financeira.

O resultado deixa de vez no passado a ideia de que as pessoas negras são majoritariamente pobres e ratifica que hoje a maioria da população negra, 59,88%, pertence a Classe Média brasileira, a Classe C, com rendimentos mensais até R$ 7 mil. Ainda, 26,16% dos negros se enquadram nas classes A e B.

Maioria ainda não investe

Contudo, 52,61% deles não investem. Uma característica comum das pessoas negras que investem é o perfil extremamente conservador, sendo que 68,50% dos investidores declaram que utilizam a renda fixa, como a poupança ou o CDB.

Além disso, a maioria também investe com a finalidade de formar uma reserva de emergência ou para um projeto específico como a compra da casa própria, carro ou viagem.

Assim, apenas 24,83% realizam investimentos de longo prazo como previdência privada.

A educação financeira é uma problemática no Brasil e para a população negra é um fator crítico e fica nítido quando apenas 33,43% dos entrevistados afirmam que gastam menos do que recebem, revelando que não lidam bem com seu dinheiro.

As pessoas que dizem lidar bem com o dinheiro são apenas 29% e elas adquiriram sozinhas esta competência. Já a maioria absoluta revela que sente insegurança na hora de gerenciar sua vida financeira.

De olho no futuro

O futuro se constrói agora… Pensar na diversidade hoje é pensar em sustentabilidade.

Dentre as várias análises possíveis, os dados revelam um potencial enorme de crescimento e desenvolvimento do mercado financeiro e, consequentemente, da economia.

Entretanto, 62,21% das pessoas negras declaram que já foram discriminadas ou ignoradas por profissionais do mercado financeiro e 89,24% destacam a falta de representatividade racial no setor financeiro como o fator mais provável para que isto ocorra.

Menos crédito

O fato é que pessoas negras têm mais dificuldade de acesso ao crédito, seja por falta de garantias e histórico bancário, seja por vieses inconscientes dos profissionais do setor que julgam sua fisionomia e decidem que por ser negro não deve ter dinheiro.

Além disto, negros têm o crédito negado três vezes mais que os brancos, mesmo com os mesmos níveis de garantia, segundo dados da Intercept Brasil.

Acredito que todo economista é um agente da transformação social e eu acumulo esta tarefa por três vezes: sou economista, mulher e negra.

Contudo, nem é preciso ser economista ou especialista no mercado financeiro para entender o quanto a inclusão da população negra, portanto, o Black Money, agrega um potencial de crescimento nos investimentos, no mercado financeiro e na economia como um todo.

Ratifico que o racismo, além de crime, é um problema social e econômico que leva à perda de oportunidades.

Como afirma Larry Fink, CEO da BlackRock, a agenda social, além de justiça social, trata-se de capitalismo. A inclusão promove uma sociedade mais justa e inclusiva, e todo mundo ganha.

Até a próxima coluna!