Qual é o impacto nas ações de Azul (AZUL4) e Gol (GOLL4), se o governo reduzir preço da passagem aérea?

Papéis estão baratos, mas setor é arriscado e pode sofrer com ingerência política

Uma das principais promessas mais ‘informais’ de Lula durante as eleições presidenciais de 2022 foi de que o “pobre voltaria a andar de avião”. A medida, contudo, pode tanto pressionar os preços das ações de Azul (AZUL4) e Gol (GOLL4), quanto beneficiar o setor aéreo e aumentar a margem operacional das empresas.

No dia 2, após tomar posse, a ministra do Turismo, Daniela Carneiro (União) afirmou que uma das prioridades da pasta seria “resolver com urgência o preço exorbitante das passagens aéreas. Para a ministra, o custo das viagens de avião “dificultam o turismo” no Brasil.

O que dizem os analistas?

Analistas dizem que reduzir o preço das passagens não é tão simples, a partir de uma canetada de Lula. O governo pode cortar impostos e as companhias aéreas podem, assim, repassar a isenção aos consumidores por meio das passagens.

Há uma divergência entre especialistas entrevistados pela Inteligência Financeira sobre as implicações do aumento da passagem aérea nas ações de Azul e Gol na bolsa de valores.

AZUL4 e GOLL4 tem desvalorização, mas bom início de 2023

Por um lado, as ações das aéreas vem de uma trajetória considerada negativa na bolsa. Em 6 meses, GOLL4 se desvalorizou em 28,29%. No mesmo período, AZUL4 teve queda de 18,42%. Desde o começo do ano, no entanto, os papéis registram alta acima do Ibovespa, de 10,76% e 10,87%, respectivamente.

As ações das aéreas na bolsa sofreram o primeiro impacto na pandemia. O isolamento estancou a circulação de aviões no país.

Mas, justamente quando a covid-19 deixou de circular tanto com o avanço da vacinação, as companhias aéreas tiveram mais um problema: o preço do petróleo, que configura como o maior custo operacional dessas empresas, disparou devido à guerra na Ucrânia.

Enrico Cozzolino, head de análises e sócio da Levante Investimentos, aponta que o gasto médio das companhias aéreas com o querosene de aviação (QAV), combustível das aeronaves, corrói 45% das despesas operacionais.

Reduzir preço da passagem prejudica ações das aéreas

Uma tentativa do governo federal de reduzir os preços das passagens, avalia Cozzolino, pode prejudicar as ações de Azul e Gol na bolsa.

Isso porque, diz o analista, essa “bondade do Executivo” pode ser classificada como uma ingerência política no setor. A intervenção levaria a mais incerteza quanto aos benefícios dos preços reduzidos no longo prazo e se é o suficiente para atrair mais passageiros.

A redução no valor da passagem não seria feita “de forma sustentável no longo prazo”, aponta Cozzolino, porque o governo Lula tem “falas desconexas entre factíveis”. Para ele, a volatilidade do fator político atrapalha as ações do setor.

“[Baixar o preço das passagens] soa mais como uma medida populista. Não necessariamente isso vai refletir no aumento do consumo. No final das contas, o mercado se autorregula”, defende o analista.

AZUL4 e GOLL4 podem se valorizar após corte

Por outro lado, para Charo Alves, especialista da Valor Investimentos, a redução do custo de passagens por meio de cortes feitos pelo governo federal pode reaquecer a atividade econômica no setor aéreo.

Nesse caso, AZUL4 e GOLL4 na bolsa de valores só têm a ganhar. O motivo seria o aumento de fluxo de caixa e de margem operacional das companhias aéreas. O aumento da demanda, seguido pelo aumento de viagens, pode aliviar as despesas operacionais.

Se o dólar se desvalorizar em relação ao real, em um movimento semelhante ao da semana passada, melhor ainda,. “Com o dólar caindo e o estímulo do setor com passagem mais baratas, empresas devem ter margem maior na compra de QAV”, diz Charo.

No entanto, o esse movimento seria “de curto prazo e mais especulativo”, diz o especialista. “A queda da Selic favoreceria mais AZUL4 e GOLL4 no longo prazo.”

Cozzolino cita que a mudança pode ser positiva, desde que o governo federal promova o corte por meio de um estudo sobre aumento do consumo junto às empresas. “Tem uma demanda reprimida porque a pandemia cortou viagens corporativas, ficou mais comum usar internet. O consumo corporativo pode voltar com o custo menor das viagens. Mas envolve bastante estudo”, afirma.

É recomendável investir em Azul e Gol agora?

Os especialistas concordam que as ações de Azul e Gol estão descontadas na bolsa em relação à máximas durante a pandemia.

Em maio de 2021, as ações preferenciais de Gol atingiram valor de R$ 29,59 por ação. Enquanto AZUL4 chegou a ser negociada por R$ 46,82 em junho do mesmo ano.

“Do ponto de vista do fundamento, usando o modelo de caixa descontado, vemos Azul e Gol descontadas e com potencial de valorização. Mas notícias de ingerência política, câmbio e o preço do petróleo oscilando para cima, o preço-alvo de AZUL4 e GOLL4 fica bastante prejudicado. O risco é bastante elevado. Numa composição de cesta [de investimentos], teríamos uma parcela muito pequena de exposição ao setor aéreo.”

Enrico Cozzolino, sócio e head de análise da Levante

A recomendação no investimento nos papéis de Gol e Azul segue a tese de que o país pode se recuperar economicamente, e essas empresas “performaram” durante a crise do coronavírus, diz Cozzolino.

O preço-alvo de GOLL4 para o Santander é de R$ 9,30, enquanto o preço-alvo do Bradesco para a ação é de R$ 11,00, com recomendação de compra neutra. De acordo com relatórios, o banco espanhol ressalta O preço atual da ação é de R$ 7,81.

“Eu iria mais pela linha de ficar de fora [do setor aéreo]. O movimento estrutural das companhias ainda é muito conturbado. A Inflação, os juros, o preço do petróleo com tendência mais elevada, e o mercado global em alerta de recessão jogam contra o investidor que está buscando mais investimento em commodities e outros setores mais seguros.”

Charo Alves, especialista da Valor Investimentos