‘Não condeno nenhum produto financeiro. Cada um tem o seu papel’, diz Gustavo Cerbasi

Com mais de 3 milhões de livros vendidos, consultor recebe a Inteligência Financeira em sua casa para falar sobre... dinheiro
Imagem mostra o consultor financeiro Gustavo Cerbasi sentado no sofá de sua casa, em São Paulo
O consultor financeiro Gustavo Cerbasi em sua casa, em São Paulo (Foto: Bufalos)

Aos 49 anos e mais de 3 milhões de livros vendidos, o consultor financeiro Gustavo Cerbasi comemora neste mês um ano de uma mudança em sua vida. Em agosto de 2022, ele se tornou sócio da SuperRico com o objetivo de democratizar o planejamento financeiro. A plataforma, então, passou de 38 para 159 franquias e já conta com 30 mil pessoas cadastradas. 

“Tem sido um período de intensa transformação. Eu vinha de uma fase muito agitada na minha carreira, com cursos online, uma grande exposição, parceria com um grande banco, uma preocupação com engajamento, em atrair as pessoas para comprar um curso. E tudo isso tomava um tempo muito grande na atuação comercial, e não na educação em si”, conta o autor do best-seller “Casais Inteligentes Enriquecem Juntos”.

Como surgiu Gustavo Cerbasi

Desde 2005, quando surgiu em uma reportagem na qual afirmava ter conquistado a sua independência financeira e virou referência no tema, o consultor aprimorou o “método Cerbasi”, difundido nas redes sociais e em diversos livros. À sua metodologia, acrescentou nos últimos anos “elementos menos racionais e mais emocionais”. 

Ainda na conversa com a Inteligência Financeira, Cerbasi diz ser contra a demonização de produtos financeiros e pontua que há um lado positivo até mesmo em opções como a caderneta de poupança e os títulos de capitalização, sempre condenados pelos especialistas em finanças. 

“Se eu for levar em consideração todos os produtos de investimento que existem no mercado, não poderia condenar nenhum produto. Cada um tem o seu papel no mercado”, analisa o consultor financeiro. 

A seguir, confira em vídeo a íntegra do bate-papo com Gustavo Cerbasi e, na sequência, um resumo do que defende o influencer de finanças, que conta com 1,5 milhão de seguidores no Instagram. 

O que Cerbasi faz hoje 

De agosto de 2022 para cá, desde que eu comecei na SuperRico, tem sido um período de intensa transformação. Eu vinha de uma fase muito agitada na minha carreira, com cursos online, uma grande exposição nas redes sociais, parceria com um grande banco, uma preocupação muito grande com engajamento, com chamar o público para participar das redes, para comprar um curso, para conhecer um trabalho. Eu tinha 80% da minha agenda tomada por atuação comercial e de engajamento nas redes. Decidi deixar para trás esse mundo. A ideia era tirar um certo sabático, mas veio o convite para entrar como sócio na SuperRico.

Meu papel na SuperRico é sair totalmente da linha de frente. É transferir autoridade, transferir a minha metodologia, a minha forma de pensar e orientar para os planejadores, que são franqueados. Então, tenho um trabalho de educação continuada. A minha rotina é me dedicar à sintonia fina do trabalho dos planejadores, melhorando a atuação deles e verificando os pontos frágeis, e inserindo gradualmente a minha metodologia às antigas ferramentas da SuperRico.

O que é a metodologia Cerbasi 

A minha primeira grande exposição na mídia foi uma capa de revista em 2005. Ali foi quando o professor de educação financeira, com apenas dois livros no mercado, trazia para os leitores da revista uma tentativa racional de explicar o porquê da importância da inteligência financeira. Naquele momento, a abordagem era muito racional, na linha do quanto poupar por mês, durante quanto tempo, o quanto cortar do orçamento. Muita matemática e finanças envolvidas. Mas fui percebendo ao longo dos anos que não bastava a racionalidade, porque nós, seres humanos, nos guiamos por recompensas. Fui incorporando na minha metodologia ao longo do tempo os elementos menos racionais e mais emocionais de um bom planejamento.

O meu planejamento tem que driblar as armadilhas emocionais e as fragilidades que nós temos diante de um planejamento muito racional, que pode talvez nos ajudar por alguns meses. A gente percebe que as famílias vão ter que lidar com imprevistos, incertezas, dores que não faziam parte de seus planos. Valorizo muito mais a qualidade de vida presente, o equilíbrio. Proponho às famílias um estilo de vida que seja muito recompensador no curto prazo e que se sustente ao longo do tempo.

Dicas práticas de Gustavo Cerbasi

Normalmente, um plano racionalmente bem elaborado vai envolver alguns cuidados de redução dos gastos para tentar fazer um esforço de poupança e tentar garantir uma proteção no futuro, o que muita gente não tem hoje. Como as pessoas estão trabalhando, imagino que em algum momento vão parar de trabalhar e contar com essa proteção. Esse é o lado racional do planejamento. O que a gente propõe é trazer um pouco mais de emoção ao planejamento. Isso porque esse lado racional, na verdade, elimina as recompensas para o futuro, que talvez tenham alguma recompensa. Talvez porque o nosso lado mais instintivo não acredita que a gente vai viver até os 80, 100 anos. O lado racional, sim. Todos nós queremos viver muito mais.

Mas o lado animal do ser humano imagina que eu tenho que matar um leão por dia porque posso não estar vivo na semana que vem. Então, esse lado emocional do cérebro não entende muito bem que estou abrindo mão de conforto. Abrindo mão de recompensa para talvez ter algum tipo de benefício no futuro. O que é o modelo mais maduro de planejamento? É quando nós propomos um esforço para que a família tenha mais qualidade de vida no presente. Que a pessoa consiga ter mais qualidade de vida relacionada a cultura, lazer, cuidados pessoais, conhecimento não relacionado ao trabalho. E tudo isso é muito motivacional. É um ponto que ajuda a manter a disciplina. Mas não é suficiente.”

Elementos racionais

Por ter mais gastos com lazer, também tenho que convidar essa família a ser bastante racional na redução do custo de vida. Aí sim, é um elemento que exige mais esforço de cada um porque eu vou convidar aqueles que acreditam que podem pagar um carro num valor x a adotar um carro com valor 75% de x. Por quê? Porque além da motivação, eu tenho uma blindagem de curto prazo contra imprevistos. Se acontece algum tipo de situação que não estava nos planos, uma viagem a trabalho, um acidente, um convite para uma festa, a pessoa não vai desconstruir um plano de previdência para resolver esse imprevisto.

Ela pode cancelar a próxima viagem. Ela pode vender o ingresso que comprou para um show, pode postergar um encontro com amigos. Então, esse orçamento mais flexível, a palavra correta é orçamento mais resiliente, que acomoda pressões externas de maneira mais confortável, permite fazer com que você lide com os imprevistos, com o dinheiro do dia a dia, sem afetar os planos de médio e longo prazo. Então, aquela viagem mais importante, o intercâmbio do seu filho e a independência financeira continuam preservados. Isso traz uma qualidade muito interessante ao investimento.

Carteira de investimentos

Dessa forma, eu consigo recomendar ao meu cliente que tenha uma carteira de investimentos mais adequada para o longo prazo. Então, some à motivação também a tranquilidade e a paz que essa família começa a ter quando surgem os imprevistos. Porque ela vai avançar na zona do desconhecido mais vezes e, assim, consegue lidar com os imprevistos de maneira mais confortável. Com isso, o planejamento vai se sustentando ao longo do tempo.

A carteira de investimentos se comporta de maneira mais previsível, o que faz com que conceitos que assustam os investidores, como volatilidade e restrição de saque por falta de liquidez, sejam elementos mais presentes na carteira. O resultado geral é o planejamento com mais paz. É uma questão mais ligada ao equilíbrio. É bem diferente daquela visão antiga, em que a gente sacrificava um pouco mais o presente para tentar ter no futuro um benefício, uma recompensa que a gente estava tirando desse momento presente.

Livros e redes sociais 

Desde que eu escrevi meu primeiro livro, em 2002, vi que o número médio de obras lidas por brasileiros ao longo do ano foi crescendo. Principalmente até meados da década passada. Eu acho que a leitura atingiu um pico no Brasil e, a partir de então, começou uma influência maior das redes sociais. Em 2016, eu entrei com mais força nas redes sociais. Desde então, a minha rotina passou a ser predominantemente dedicada a gerar conteúdo que fizesse as pessoas a perceber o valor do bom aprendizado, que poderia estar num livro, num curso ou numa série produzida por um parceiro, por exemplo, por uma instituição de ensino.

O papel das redes sociais

As redes sociais ajudaram muito a disseminar o conhecimento que antes era limitado àqueles que eram dispostos ou tinham uma maior propensão à leitura. O público leitor é muito menor do que o público curioso, que é o público que hoje consome conteúdo nas redes sociais. Então diria que nas redes sociais nós ampliamos muito o raio de alcance. Isso fez com que, mesmo com a leitura diminuindo proporcionalmente em relação às demais fontes de informação, como elemento de conhecimento, a gente vê que a venda de livros, por exemplo, continua acontecendo muito bem. Eu não divulgo livros nas minhas redes sociais. Eu só os menciono de vez em quando, mas o número de livros que eu vendo por mês hoje é muito similar ao que eu vendia no auge, em 2012, 2013.

Estruturação do conhecimento

O brasileiro continua lendo. Acho que há uma diferença, porque quem buscava conhecimento alguns anos atrás buscava predominantemente nos livros, mas hoje se busca predominantemente nas redes sociais. E quando a pessoa quer estruturar melhor o conhecimento ou presentear esse conhecimento, os livros são o veículo utilizado. O meu livro mais vendido continua sendo ‘Casais Inteligentes Enriquecem Juntos’. A gente vê pelos números que, diferentemente dos outros livros, ele vende muito mais no formato físico do que no formato digital. Isso denota que ele é presenteado e não comprado para consumo próprio.

Os livros de Gustavo Cerbasi

Não diria que eu me arrependo de ter escrito em uma linha ou outra. Na verdade, cada livro que eu escrevi serviu de uma espécie de laboratório para aprofundar o tema no livro seguinte. O livro que deu mais trabalho pra escrever foi o primeiro, em que estruturei começo, meio e fim. Uma ideia ali, tentando resumir a minha ciência em poucas páginas. Desse primeiro livro nasceu ‘Casais Inteligentes Enriquecem Juntos’, explicando como aquele assunto tão racional poderia ser abordado em família.

O livro “Casais Inteligentes Enriquecem Juntos” é um grande sucesso, mas muita gente que disse que o capítulo sobre filhos era muito pequeno. Dali nasceu “Pais Inteligentes Enriquecem seus Filhos”. Então um livro foi puxando o outro e alguns ajustes foram feitos. Eu diria que o livro que mais mudou nas diversas revisões foi “Cartas a um Jovem Investidor”. O mundo mudou bastante. Esse livro precisou de mais ajustes do que os demais.

Demonização de produtos financeiros 

Se eu for levar em consideração todos os produtos de investimento que existem no mercado, eu não poderia condenar nenhum. Cada produto tem o seu papel. A gente vê que alguns especialistas e influenciadores condenam produtos que, na verdade, têm um papel muito importante para diferentes parcelas da população. Eu poderia condenar a poupança porque existem outros produtos muito mais eficientes. Mas ainda há uma parcela muito grande da população que tem um certo temor nos demais produtos. Simplesmente porque existem siglas, nomes, tributos que são complexos. Prefiro que a pessoa comece na poupança do que deixar o dinheiro parado na conta.

Cerbasi condena a prática do day trade

Eu condeno a prática do day trade. Porém, a especulação talvez seja o papel mais importante. Porque é o que dá liquidez. Então, existe um grande grupo de investidores que, por estar mais ligado ao mercado, vai tirar bons resultados de uma operação de day trade. A maioria dos investidores que está chegando ao mercado com pouco conhecimento deveria ter uma postura mais conservadora.

Títulos de capitalização

A capitalização sempre foi muito condenada. Se a gente entender, entretanto, que no Brasil há um número considerável de pessoas que joga em loterias, eu diria que convidar essa população a experimentar a capitalização no lugar da loteria já é um passo muito mais interessante do que simplesmente proibir. Com o tempo, a pessoa vai ter resultados pouco eficientes.

Investimento é para todo mundo?

Não tenho dúvidas de que investimento é para todo mundo. Até porque tem muita gente que investe e não sabe que investe. Aquele sacoleiro que viaja quilômetros para comprar num grande centro urbano roupas para vender na sua cidade está fazendo investimento. É um investimento que dá trabalho, que exige tempo, que exige esforço e que exige ter o capital disponível. O mercado financeiro nada mais é do que uma forma de padronizar diversos tipos de investimento para que mais pessoas alcancem, com menos dinheiro, oportunidades que, sem esse mercado financeiro, seriam acessíveis apenas a poucos investidores.

Democratização do conhecimento 

Tenho sido muito feliz na minha estratégia de democratizar o conhecimento. Meu primeiro livro nasceu da vontade de levar o conhecimento de um MBA para pessoas que não podiam pagar um MBA, mas podiam pagar por um livro. Com o tempo, essa capacidade de divulgar conhecimento se expandiu com as redes sociais.