IPO da Eletron Energia e o mercado de tokenização: Brasil é exemplo a ser seguido

Oferta pública das ações da Eletron Energia, em janeiro de 2024, terá ações tokenizadas

A blockchain se tornou uma tecnologia popular através de sua utilização no mercado de criptomoedas, como uma forma segura, transparente e barata de registrar dados. Aos poucos, porém, sua utilidade como forma de democratizar investimentos e desburocratizar procedimentos dentro do mercado tradicional começou a ser percebida.

E isso é possível através da tokenização, o processo de transformar um ativo real em um ativo digital, chamado de token. Nesse mercado, o Brasil se mostra muito avançado em relação ao que é oferecido no restante do mundo.

Tokenização ontem e hoje

O primeiro caso de uso famoso utilizando blockchain na tokenização foram as stablecoins, que são tokens lastreados por depósitos fiduciários reais. Em 2014, foi emitida a primeira stablecoin: Tether USD, ou USDT, que é uma moeda digital lastreada por dólares estadunidenses. Através dela, investidores de criptomoedas encontraram uma maneira fácil e barata de movimentar valores a qualquer momento, para qualquer lugar do mundo.

Após muitos anos de uso dedicado somente às stablecoins, a tokenização começou a mirar outros ativos reais a partir de 2020. Após um avanço nas ferramentas ligadas às finanças descentralizadas, surgiram os primeiros indícios do setor conhecido como RWA, sigla em inglês para o termo “ativos do mundo real”.

Como o nome sugere, o setor de RWA se dedica a criar representações dos mais diversos ativos reais dentro da economia digital na forma de tokens. Além disso, utilizando recursos do segmento de finanças descentralizadas, uma estrutura é criada em torno desses novos ativos digitais criados.

RWA fora do Brasil

O mercado do RWA se adequa às diferentes regiões onde é implementado, com base nas capacidades regulatórias e técnicas do território.

O site rwa.xyz, que rastreia as diferentes iniciativas envolvendo tokenização de ativos reais, aponta uma grande utilização em diferentes países do mundo do modelo de crédito descentralizado. Esse mercado já é estimado em mais de US$ 4,4 bilhões, de acordo com a plataforma.

Um exemplo de crédito descentralizado que utiliza o modelo de RWA é aplicado pela Centrifuge. De um lado, instituições buscando crédito confirmam a existência de um ativo do mundo real, que é usado como colateral para adquirir um empréstimo. Esse ativo é transportado para o mundo digital na forma de um token não-fungível (NFT).

Na outra ponta, investidores fornecem liquidez e recebem rendimentos com base nos juros do empréstimo prestado. O capital é depositado no que é chamado de ‘pool de liquidez’. Essa estrutura, vinda das finanças descentralizadas, automatiza negociações através de contratos inteligentes. Basta à instituição usar seu NFT como colateral no pool para se tornar elegível ao empréstimo.

Outra aplicação fértil fora do Brasil envolvendo RWA é a tokenização de títulos públicos, que já soma US$ 622,5 milhões em ativos tokenizados e cresceu 446% em 2023. Um exemplo é o fundo mútuo gerido pela Franklin Templeton, gestora com US$ 1,53 trilhão sob sua gestão.

O fundo Franklin OnChain U.S. Government Money Fund teve suas cotas tokenizadas através da blockchain Stellar, com cada token custando US$ 1. A composição do fundo, de acordo com sua lâmina, é 99,5% baseada em títulos do tesouro dos Estados Unidos, dinheiro ou acordos colateralizados garantidos pelo governo.

O cenário brasileiro de RWA

No Brasil, as empresas da área de tokenização e que atuam com RWA se mostram mais arrojadas na hora de escolher os ativos a serem tokenizados. Muito dessa liberdade vem da postura dos reguladores, especialmente a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que mantêm uma postura aberta em relação à inovação no país.

Em agosto, por exemplo, o Mercado Bitcoin tokenizou R$ 15,1 milhões em fluxos de pagamento de diferentes empresas, e R$ 7,1 milhões em precatórios. Em 2023, já tokenizamos R$ 128 milhões.

A Liqi, outra empresa focada em tokenização, tokenizou mais de R$ 4,4 milhões no mesmo mês, através de 96 diferentes ofertas, que incluem cédulas de crédito bancário tokenizadas.

Outro caso envolvendo o fértil cenário de tokenização de RWA no Brasil é a oferta pública das ações da Eletron Energia, que terá ações tokenizadas à venda na BEE4. A BEE4 é uma tokenizadora participante do sandbox regulatório da CVM, um ambiente controlado criado com o intuito de avaliar as implicações da tokenização na prática.

Para o IPO da Eletron Energia, o investimento mínimo é de R$ 2.013, o que equivale a 61 ações, a R$ 33 cada. A captação mínima prevista é de R$ 3,33 milhões e a máxima é de R$ 5 milhões. As 151.516 ações colocadas no mercado equivalem a 11,8% do total. A previsão de encerramento da oferta é 12 de janeiro de 2024.

A Agrotoken, por sua vez, tokeniza commodities agrícolas. Os tokens gerados podem ser utilizados pelos agricultores para adquirir insumos em preparação para o próximo plantio.

Esses são exemplos que mostram como o mercado brasileiro de tokenização está avançado em relação ao que é praticado no restante do mundo. Além do amplo leque de ativos tokenizados, o setor de RWA mostra impacto real na democratização de investimentos e na liberação de novos processos voltados ao varejo.