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Teto de juros faria milhões perderem cartão, diz Vélez, do Nubank (NUBR33)
A possibilidade de as autoridades aprovarem um teto de juros para o rotativo do cartão de crédito seria extremamente prejudicial para o sistema financeiro. A avaliação é de David Vélez, fundador e CEO do Nubank, que acaba de bater a marca de 80 milhões de clientes. “Se isso acontecesse de forma arbitrária, no dia seguinte dezenas de milhões de pessoas perderiam seus cartões, porque a operação não seria mais rentável. Seria um choque para o sistema”, diz, em entrevista ao Valor.
Na semana passada o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, teve reunião com a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e CEOs de instituições financeiras privadas, incluindo Cristina Junqueira, do Nubank. Antes do encontro, o ministro dizia que seriam discutidas alternativas para os juros no cartão. Saiu da reunião mais comedido, afirmando que um grupo de trabalho será criado. “Parece que a Fazenda entendeu a racionalidade econômica e a complexidade da indústria de cartões”, comentou uma fonte com conhecimento das discussões.
Para Vélez, um teto de juros no rotativo é o tipo de política que parece ter boas intenções, mas que na realidade gera um efeito bem negativo para a indústria. “Entendo a preocupação do governo com juros altos. Estamos ativamente, junto com outros bancos, tentando sugerir algumas outras opções. Mas, na minha avaliação, a solução é ter mais concorrência – algo que o Banco Central vem fazendo – e, por outro lado, é a questão macro. O juro alto vem diretamente do nível de inflação muito alto, que agora está sendo controlado, mas que é algo que está fora do controle das instituições financeiras.”
Vélez argumenta que, diferentemente do que aconteceu quando se impôs o teto do cheque especial, que afetou uma parcela relativamente pequena da população, o impacto de uma medida desse tipo no cartão de crédito seria muito maior, já que o produto representa 40% do consumo das famílias. “Seria um efeito muito relevante para o sistema financeiro.”
Analistas apontam que, dada sua ampla base de clientes com cartão, o Nubank seria um dos bancos mais afetados por um eventual teto de juros no rotativo. Além disso, a fintech também tem receitas menos diversificadas que as de um grande banco.
Na semana passada, em relatório, o Santander calculou que um teto de 8% ao mês reduziria a receita total do Nubank em 17%. Os analistas também fizeram as contas de qual seria a rentabilidade do banco com uma série de ajustes, incluindo o teto das tarifas de intercâmbio no cartão pré-pago, que entrou em vigor neste mês; a deterioração na qualidade dos ativos; e a baixa alocação de capital que a fintech destina para a operação brasileira, deixando muitos recursos paras outros países. A conclusão foi a de que, levando em consideração esses fatores, o retorno sobre o patrimônio (ROE) do Nubank no Brasil no quarto trimestre não teria sido de 40%, como reportado, e sim de 11%.
Vélez rebate esses argumentos e diz que a análise do Santander só faz o ajuste para o lado negativo. “Se eles acham que deveríamos transferir US$ 2 bilhões em capital para a operação brasileira, deveriam calcular também a receita que esse capital geraria. Com um juro de 14%, só de receita adicional seriam R$ 2 bilhões, sem falar os impactos em ‘cross-sell’, receita por cliente, melhora do custo operacional”, diz.
O CEO afirma que o quarto trimestre teve itens extraordinários e que o ROE pode cair um pouco nos próximos períodos, mas pondera que o nível de 40% é, sim, sustentável e uma prova do tipo de resultado que um modelo 100% digital pode entregar. Segundo ele, os custos de aquisição de clientes, operação, funding e risco são muito menores que os de uma instituição tradicional. “Opero com um custo 80%, 85% menor que um banco tradicional. Essas vantagens competitivas em termos de custo levam a um ROE muito maior que a média do mercado.”
O modelo digital, se tem custos menores, também pode trazer desafios. Neste mês, o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) questionou o Nubank sobre os crescentes relatos de clientes sobre fraudes. Segundo Vélez, o banco tem investido muito no combate a esse tipo de problema e mais de 1 milhão de clientes já utilizam o “Modo Rua”, que reduz automaticamente os limites para transferências no Pix quando a pessoa sai de casa. Ele também diz que a fintech usa inteligência artificial e machine learning para alertar os usuários de indícios de que a conta de destino é de um “laranja”.
“Esse é um desafio grande para todas as instituições financeiras no Brasil e temos investido muito na nossa plataforma antifraude. O problema é que muita vezes são golpes de engenharia social, onde o criminoso induz a pessoa a fazer voluntariamente essas transferências. Se o próprio cliente aumentou seus limites de Pix, verificou a conta de destino, realizou a verificação biométrica… há um limite até onde a gente consegue proteger ele dele mesmo.”
O executivo ressalta que o Nubank faz campanhas e utiliza ferramentas como blog, e-mail, notificação por push, etc, para informar os clientes e evitar que caiam nesse tipo de golpe.
O Nubank só deve divulgar seus resultados do primeiro trimestre no dia 15 de maio. Por isso, Vélez não abre dados sobre os indicadores operacionais e financeiros. Ainda assim, afirma que a inadimplência pode subir um pouco neste início de ano, após ter caído no quarto trimestre beneficiada por fatores sazonais. “Tem um pouco de reversão desse efeito sazonal, mas está bem sob controle. Não posso entrar em detalhes, mas a inadimplência está consistente com o que estamos planejando.”
A operação brasileira encerrou março com crescimento anual de 31,5%, chegando a mais de 75,2 milhões de clientes. Desse total, são 2,7 milhões de pessoas jurídicas, com expansão de 66%. México e Colômbia somam juntos 3,8 milhões de clientes, alta de também 66%. No geral, já são mais de 9,2 milhões de usuários ativos em investimentos. O aumento em ativos sob custódia foi de cerca de 36%, chegando a mais de R$ 47,6 bilhões.
O Nubank lançou no mês passado o crédito consignado para servidores federais, e Vélez diz que deve expandir a oferta a beneficiários do INSS e lançar uma linha de antecipação do FGTS neste ano. Entre outras novidades, o banco está com um piloto de seguro automotivo em Curitiba, mas ainda sem data para lançamento. O programa Nucoin, token que que recompensa o engajamento dos usuários por meio de programa de fidelidade, deve receber novas funcionalidades.
Com mais de 1 milhão de clientes com criptoativos, o banco chegou a anunciar no ano passado que alocaria até 1% do seu caixa em bitcoins, mas o CEO disse que esse percentual nunca foi atingido, nem de longe, e que hoje o Nubank já não tem mais nenhuma exposição a moedas digitais.
Por Álvaro Campos
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