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Risco fiscal piora e juros disparam
Com somente dois pregões na conta, o ano de 2022 já começa com uma forte pressão no mercado de juros. A piora na percepção de risco fiscal voltou a dar as caras e adicionou cautela aos negócios, o que fez as taxas futuras dispararem ontem na B3. Os vencimentos de curto prazo voltaram a superar a barreira dos 12%, enquanto os de prazo mais longo se firmaram acima de 11%, na esteira da forte alta anotada pelos rendimentos dos Treasuries no mercado global.
“É claro que estamos falando de um movimento global, que envolve os Estados Unidos e os emergentes, de aumento de juros, mas o Brasil foi além. Há questões fiscais de volta ao foco e isso incomoda o investidor”, afirma Júlio Fernandes, sócio e gestor macro da XP Asset Management. Para realçar o desempenho pior do Brasil, ele nota que os juros de dois anos no Chile e no México avançaram 0,3 e 0,2 ponto percentual, respectivamente, nos dois primeiros pregões do ano, enquanto a taxa do DI para janeiro de 2024 subiu 0,5 ponto.
“Na virada do ano, teve a sanção da desoneração da folha de pagamento sem a compensação, ferindo a Lei de Responsabilidade Fiscal. Há uma percepção de que o governo está arrumando um espaço a mais no teto de gastos.” Na visão do gestor, um pedaço do movimento de alta dos juros futuros “é receio fiscal, um temor ainda reforçado pela incerteza sobre o reajuste do funcionalismo”.
Na B3, a taxa do DI para janeiro de 2024 disparou de 11,19% para 11,49% no fechamento de ontem; e a do DI para janeiro de 2025 saltou de 10,89% para 11,155%.
“O início de ano, com o recesso no Legislativo e no Judiciário, costuma ser um período mais calmo e com menos oscilações bruscas na curva, mas estamos tendo uma amplificação grande de movimentos ruins nesses dois últimos pregões”, diz Patricia Pereira, estrategista-chefe da MAG Investimentos.
“O líder do governo falar negativamente sobre o teto de gastos mostra que ele claramente não entendeu o significado do teto e a importância da disciplina com as despesas”, nota a estrategista, ao fazer referência à entrevista do deputado Ricardo Barros (PP-PR), líder do governo na Câmara, ao Valor. Além disso, ela nota que o pleito de servidores públicos por aumentos salariais, da mesma forma como foi dado para policiais, pesa no sentimento dos participantes do mercado. “Esses fatores ajudaram a curva a abrir, embora a magnitude pareça exagerada”, afirma Pereira.
Em carta publicada ontem, a Legacy Capital, que projeta contração de 1% no PIB e inflação de 6,3% em 2022, acima do teto da meta, avalia que esse cenário “aumenta a probabilidade de novos questionamentos ao teto de gastos”.
“Como havíamos alertado em cartas anteriores, a flexibilização do teto operacionalizada pela PEC 23 para acomodar o Auxílio Brasil, e a perda relativa de renda dos funcionários públicos federais, ante a elevada inflação dos últimos anos, tenderiam a induzir movimentos da categoria por recomposição salarial, que se materializaram, embora devam permanecer adormecidos em janeiro, um mês de férias e em que ações de pressão e greve têm tipicamente baixa eficácia. Ao longo do ano, no entanto, é provável que estes movimentos se intensifiquem”, aponta a Legacy.
A disparada dos juros se deu, ainda, em um contexto de forte abertura da curva de juros americana e de alta relevante da inflação implícita extraída das NTN-Bs.
“O barril do petróleo está subindo de novo intensamente e, após o alívio que estávamos vendo, os grãos também se recuperaram bastante, dado o problema do La Niña na América do Sul. É um ponto importante, que puxou as implícitas [para cima] e devolveu pressão de alta aos juros, diz Cássio Andrade Xavier, gestor de renda fixa da Sicredi Asset. Em 30 de dezembro, a inflação extraída da NTN-B com vencimento em agosto estava em 5,43% e, ontem, estava em 5,73%.
A mudança na dinâmica da curva de juros americana também teve impacto relevante. Além de precificar uma antecipação no ciclo de aperto monetário nos EUA, com apostas majoritárias em uma alta de juros já em março, também as taxas longas se ajustam em alta. Ontem, o rendimento da T-note de dez anos chegou a 1,688% na máxima. “Era esperado que os juros americanos avançassem. Os dados de emprego foram bons, os de inflação são bem altos… É natural que o mercado espere três altas de juros nos EUA em 2022”, afirma Xavier.
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