Análise: Em meio à transição, militares endossam especulações sobre o ‘terceiro turno’

Ministério da Defesa anuncia envio de relatório sobre urnas ao TSE e estimula manifestações de bolsonaristas por intervenção militar, diz Fábio Zambeli, do JOTA

Em meio aos primeiros movimentos do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na transição de governo, o Ministério da Defesa forneceu aos manifestantes pró-Jair Bolsonaro que se mobilizam em todo o país em frente a instalações militares mais combustível para questionar o resultado da eleição.

Desde o final da semana passada, apoiadores do presidente divulgam com estardalhaço em grupos nas redes sociais que o aguardado relatório militar sobre a eleição viria à tona nesta semana, alimentando teorias conspiratórias sobre as urnas eletrônicas.

Em nota emitida pela pasta, o ministro Paulo Sérgio Nogueira confirma que enviará ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), na quarta-feira (9), o documento com as impressões de técnicos militares sobre o processo de votação e apuração.

Nogueira vinha mantendo uma relação cordial com o presidente da Corte, Alexandre de Moraes, tendo visitado inclusive as instalações da Justiça Eleitoral antes do primeiro turno para monitorar os locais onde são totalizados os votos.

O ministro da Defesa acompanhou a apuração no primeiro e no segundo turnos ao lado de Jair Bolsonaro, o que contribuiu para avalizar as especulações em torno do conteúdo do documento.

Redução de danos

Em medida preventiva, Moraes solicitou que a Defesa entregasse a íntegra do relatório ao TSE ainda no transcorrer do segundo turno, mas a pasta informou que só o faria após o término do processo eleitoral.

Mesmo que o material não traga novidades e nem coloque em dúvida objetivamente a lisura da eleição, o entendimento entre integrantes do tribunal é o de que a apresentação desse conteúdo neste momento facilita a circulação de notícias falsas acerca do pleito, que acabam sendo difundidas entre os manifestantes posicionados na frente de quartéis.

Moraes tem fechado o cerco contra os protestos antidemocráticos, que pedem intervenção militar. O TSE vem retirando do ar grupos em aplicativos de comunicação que traçavam estratégias de mobilização.

Em outra frente, o ministro acionou a Polícia Rodoviária exigindo a identificação de todos os veículos e caminhões que participaram tanto dos bloqueios nas rodovias como das manifestações em frente às instalações das Forças Armadas.

Greve fracassada

Nesta segunda-feira (7), uma greve geral convocada por bolsonaristas fracassou no país, até mesmo em redutos do presidente. Mas os acampamentos nas sedes dos comandos militares regionais ganharam corpo durante o final de semana e devem ser mantidas indeterminadamente.

Aliados de Bolsonaro vêm atuando diretamente para informar os manifestantes sobre os movimentos do presidente. O general Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional, é um dos mais frequentes interlocutores dos ativistas.

No final de semana, ele se incumbiu de gravar vídeos negando que o presidente eleito estivesse internado em São Paulo, com problemas de saúde, notícia sem qualquer fundamento que gerou comoção entre bolsonaristas.

Heleno também tem transmitido mensagens dúbias aos manifestantes, sugerindo que Bolsonaro ainda estaria estudando alternativas para reagir e até mesmo contestar o resultado das urnas.

(Por Fábio Zambeli, analista-chefe do JOTA em São Paulo)