Disputa e regulamentação: o que esperar da inteligência artificial em 2024?

Depois de anos de promessa, expectativa é que a IA chegue na nossa mesa de trabalho no próximo ano

A inteligência artificial termina 2023 na pauta do dia. Até os últimos dias do ano, as big techs seguiam com anúncios de novos sistemas e produtos para a disputa. Para 2024, a expectativa é que a concorrência se acirre e que o tema saia das salas de desenvolvimento das empresas e chegue ao dia a dia de milhões de pessoas pelo mundo. Tudo isso enquanto muitos ainda se perguntam como funciona a inteligência artficial.

Em entrevista à Inteligência Financeira, Antonio Gesteira, diretor que lidera a área de tecnologia da FTI Consulting, listou três tendências para a inteligência artificial em 2024:

  • Discussões mais intensas para a regulamentação do uso das ferramentas. Portanto, alta expectativa de que o Brasil avance em uma lei que diga o que pode e o que não pode fazer com IA.
  • Avanços em setores que estão adiantados nas implementações, como o mercado financeiro e os escritórios de advocacia.
  • Maior presença de ferramentas de IA no dia a dia das pessoas, através de ferramentas de trabalho, aplicativos móveis e chatbots.

Como funciona a inteligência artificial?

Antes de seguirmos, um conceito inicial para quem busca saber como funciona a inteligência artificial.

Segundo o dicionário britânico Cambridge, inteligência artificial é “o uso ou o estudo de máquinas e sistemas de computador para terem algumas das qualidade que o cérebro humano possui”.

E prossegue: “como a habilidade de interpretar e produzir linguagem de uma maneira que pareça humana, reconhecer ou criar imagens, resolver problemas e aprender a partir de dados fornecidos a eles”.

O que pode ou não na inteligência artificial?

Antonio Gesteira afirma que o Brasil deve se deparar em 2024 com o dilema de criar regras para o uso da inteligência artificial no país. Um projeto de lei, o PL 2338/2023, foi apresentado pelo próprio presidente do Congresso Nacional, o senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e seguirá tramitando no próximo ano.

De acordo com o texto apresentado por Pacheco, o objetivo é “proteger os direitos fundamentais e garantir a implementação de sistemas seguros e confiáveis, em benefício da pessoa humana, do regime democrático e do desenvolvimento científico e tecnológico.

O texto conceitua como funciona a inteligência artificial e, assim como aconteceu com a legislação de proteção de dados, a LGPD, a inspiração vem da União Europeia.

Em junho deste ano, o Parlamento Europeu aprovou o AI Act, uma diretriz para os países que fazem parte do bloco. Dessa maneira, o diretor da FTI Consulting explica que a regra trabalha com diferentes níveis de risco, como baixo, médio, alto risco e risco inaceitável.

O projeto que o Congresso vai discutir em 2024 tem uma perspectiva parecida. Exige que todos os novos sistemas de IA sejam classificados de acordo com nível de risco antes de serem colocados em prática. Como “risco excessivo”, o projeto estabelece que estão todas as ferramentas que podem levar seres humanos a se comportarem de forma prejudicial à própria segurança, especialmente idosos e pessoas com deficiência.

O exemplo europeu: isso é muito Black Mirror!

Antonio Gesteira explica que os europeus estão considerando “para baixo risco, por exemplo, um chatbot, uma ferramenta que automatiza o atendimento, que é algo já está consolidado e a gente conseguer entender como funciona”, explica.

O PL brasileiro ainda deixa em aberto muitos temas e níveis para uma regulação posterior. O projeto garante ainda a possibilidade de exigir intervenção humana e proíbe vieses discriminatórios, como por idade, gênero ou orientação sexual.

Por outro lado, a Europa considerou como risco alto sistemas de identificação biométrica e ferramentas de RH, por exemplo.

A União Europeia também se debruçou sobre o que desde já o bloco considera inaceitável. Aqui, estamos falando de reconhecimentos faciais sem autorização e ferramentas que manipulem o comportamento humano ou façam “score social”.

Sim, estamos falando de algo muito parecido com o que você talvez tenha visto em “Black Mirror”. Em “Nosedive”, primeiro episódio da terceira temporada da série distópica, em que acompanhamos a degradação da protagonista que se torna uma pária conforme a sua “nota social” despenca. Para a UE, algo do tipo estará proibido.

Empresas que estão indo rápido devem acelerar ainda mais

Antonio Gesteira explica que há uma demanda em vários setores para começar a adotar as ferramentas de IA generativa. No entanto, enquanto esse início tende a ser mais lento, setores que já estão adiantados devem disparar no próximo ano.

Um exemplo é o da área jurídica. O especialista afirma que está se popularizando rápido o uso de IA para a leitura de grandes volumes de documentos, facilitando o trabalho dos advogados.

“Os escritórios de advocacia tem liderado essas iniciativas com o uso de IA. Gestão eletrônica de documentos, gestão de contratos e automatização de contratos usando algum componente são realidades’, diz.

O grande gargalo aqui é a negociação atual com fabricantes para desenvolver sistemas que as informações imputadas fiquem restritas ao ambiente da empresa. Ninguém quer dar uma informação de um processo para uma IA que ela possa absorver e contar para outra pessoa lá na frente.

Outro setor que está bem avançado e deve se destacar em 2024 é o mercado financeiro. Desde os chatbots até as ferramentas que fazem análises sofisticadas para identificar transações suspeitas, muito já virou realidade nesse segmento.

“A ferramenta analisa o e-commerce ou uso do cartão de crédito, a geolocalização, o perfil. Imagine a quantidade de transações que uma adquirente tem que coletar e processar em tempo real e ainda assim conseguir identificar uma fraude. Vejo muita acontecendo nesse segmento, incluindo reconhecimento facial e identificação biométrica”, analisa.

Fusões e aquisições podem se intensificar

Um debate que deve entrar no radar das empresas no próximo ano, avalia Antonio Gesteira, é o quanto vai compensar começar “do zero”. O especialista prevê que exista um maior esforço das companhias de analisar potenciais parceiros, que tenham ferramentas avançadas e que possam até ser anexadas.

“Empresas que já nasceram nativas em IA vão ter uma demanda para se plugar ou para ajudar as grandes empresas que ainda não conseguem. No setor financeiro está tendo muitas demandas por APIs, por me conectar a empresas que possuem a solução”, explica o diretor da FTI Consulting.

“As empresas vão ter de decidir iniciativas serão internas ou se será preciso buscar parceiros. A pergunta que será feita é quanto tempo vou levar para desenvolver e quanto tempo vou precisar para buscar fora”, completa.

IA mais presente na vida real, especialmente nos escritórios

A última das tendências para 2024 é que ferramentas de inteligência artificial devem se fazer mais presentes na rotina do dia a dia, especialmente nos escritórios.

Empresas como a Microsoft e o Google fizeram investimentos parrudos na área e um dos principais usos esperados é a integração com as ferramentas de escritório. Sim, estamos falando do bom e velho Pacote Office, por exemplo, que deve ganhar novas funcionalidades

“Nós vamos poder cada vez mais utilizar nativamente as ferramentas de IA nas práticas de escritório. Muito provavelmente a oferta virá nas ferramentas de produtividade e mensagem, assim poderemos ver massificar esse uso”, diz Antonio Gesteira.

O especialista reforça a dica que há habilidades a serem desenvolvidas para o trabalho com inteligência artificial, em especial a da comunicação. “A IA depende do ser humano, se você não souber pedir, ela vai te dar uma resposta que não vai servir”, afirma. Reportagem da Inteligência Financeira traçou um panorama das habilidades a serem desenvolvidas e como se preparar para surfar a onda da inteligência artificial.