Aposta no futebol feminino: quanto vale a Copa do Mundo em 2027 no Brasil?

Investimentos no setor praticamente quadruplicaram nos últimos dois anos, mas ainda há um longo caminho para tirar a diferença para o futebol masculino

Escolhido para sediar a Copa do Mundo Feminina de 2027, o Brasil pode pegar carona numa modalidade em ascensão acelerada e atrair investimentos. E com isso contribuir para a profissionalização do setor.

Na cola da popularização, o futebol feminino vem colhendo valores recordes de patrocínios, cotas de televisão e investimentos de federações.

Nas estimativas da Deloitte, os esportes femininos de elite, liderados pelo futebol, vão gerar mais de US$ 1 bilhão em receitas neste ano em todo mundo. Isso significa salto de quatro vezes sobre 2021.

E hospedar uma Copa do Mundo pode ter um papel fundamental nessa direção para um país como o Brasil.

Segundo a Associação de Futebol da Austrália (FFA, na sigla em inglês), a Copa em 2023 gerou impacto econômico de US$ 866 milhões para o país, co-anfitrião do evento, junto com a Nova Zelândia.

Para 2027, o coordenador de finanças da Fecap, Ahmed El Khatib, estima que o evento movimente cerca de R$ 1,5 bilhões na economia brasileira.

A copa no Brasil representa uma oportunidade única para impulsionar a profissionalização e o desenvolvimento do futebol feminino no país”, afirmou.

Futebol feminino: crescendo, mas ainda muito atrás

Mesmo assim, dizem especialistas, há um logo caminho morro acima para reduzir as enormes disparidades em relação aos homens quando o assunto é dinheiro no futebol feminino.

“É um valor substancialmente menor do que o de um copa masculina de futebol”, disse o economista Cesar Grafietti, estudioso do assunto e colunista da Inteligência Financeira.

Como comparação, citou, que o orçamento anual dos maiores clubes femininos de futebol no Brasil é da ordem de R$ 4 milhões por ano.

Isso equivale a cerca de 1% do destinado pelos clubes ao futebol dos homens.

Contudo, essa realidade não é uma exclusividade do Brasil.

Segundo estudo da Deloitte, a receita média gerada por 15 dos maiores clubes femininos no futebol europeu em 2022/23 foi de 4,3 milhões de euros.

A base de comparação não é exatamente a mesma, mas pode dar uma ideia.

Já a receita total gerada pelos 20 principais clubes da Europa no período foi de 10,5 bilhões de euros. Ou seja, montante 2,5 mil vezes maior.

Copa pode reduzir atraso do Brasil no futebol feminino

Segundo Grafietti, no caso brasileiro a hospedagem da Copa pode ajudar o futebol feminino no país a tirar o atraso em relação a mercados como Espanha e Inglaterra, que fizeram a final do último mundial, vencido pelas espanholas.

Lá e em geografias como Suécia, Estados Unidos e Japão, investimento no futebol de base está sendo desenvolvido há vários anos.

Consequentemente, todos esses países estão adiante do Brasil no ranking da FIFA de futebol feminino.

PaísRanking
Espanha1
Inglaterra2
França3
Estados Unidos4
Alemanha5
Suécia6
Japão7
Holanda8
Canadá9
Brasil10
Fonte: FIFA

No entanto, ponderou, o sucesso individual de atletas como Marta (eleita seis vezes pela FIFA como melhor do mundo), Cristiane e Formiga, e o consequente trabalho midiático, deram ao público a sensação de que a seleção brasileira poderia enfrentar outros países de igual para igual, o que nunca aconteceu.

Na Copa de 2023, por exemplo, o time do Brasil foi eliminado na primeira fase do torneio.

“Criou-se aqui uma percepção de competitividade totalmente irreal”, disse Grafietti.

Segundo ele, o Copa no Brasil em 2027 pode ajudar a atrair investimentos que fortaleçam o futebol feminino de base, com efeitos de médio prazo.

“Daqui a seis, oito anos, pode ficar algo mais significativo”, disse ele.

Apesar da expectativas mais animadoras, internamente há muita evolução para acontecer.

Na verdade, o investimento de federações no futebol feminino não vem subindo. Na verdade, até caiu, segundo dados da Confederação Brasileira de Futebol (CBF).

Isso, mesmo com o atual presidente da CBF, Ednaldo Rodrigues, enfatizando o apoio ao futebol feminino como característica da sua gestão.

“Está longe do protagonismo que o futebol feminino merece”, disse Francisco Clemente, sócio líder da área de esportes da KPMG.

Investimento privado em ascensão

Simultaneamente, porém, os investimentos privados no setor estão acelerando.

Assim como os contratos de patrocínio e, claro, os valores das transações envolvendo atletas.

O Palmeiras anunciou em fevereiro acordo de patrocínio para o time feminino com o site de apostas Esportes da Sorte, no valor de até R$ 25 milhões para 2024, um recorde no país.

Marta, jogadora de futebol femimino da seleção brasileira. Foto: Sam Robles/CBF
Marta, jogadora de futebol femimino da seleção brasileira. Foto: Sam Robles/CBF

Em abril, o Corinthians anunciou a venda da zagueira Tarciane para o Houston Dash, dos Estados Unidos, por R$ 2,6 milhões.

Foi a maior já feita por um clube brasileiro no futebol feminino.

Bets de olho no futebol feminino

Setor que se firmou como um dos principais investidores do futebol brasileiro nos últimos anos, a indústria de apostas esportivas também está de olho nessa tendência.

As chamadas bets patrocinam 19 dos 20 clubes da Série A do futebol masculino no Brasil, além das séries B e C.

No conjunto, elas devem movimentar cerca de R$ 1 bilhão em 2024, segundo estimativas da Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL), que representa o setor.

Porém, a fatia do futebol feminino neste bolo não chega a 1% do total.

Já nos Estados Unidos, onde o futebol feminino tem uma expressão relativa maior, a participação da modalidade representa metade do atual.

Para Leonardo Benitez, diretor da ANJL, até por questão de diversificação, a indústria das apostas esportivas no Brasil tende a crescer.

“Isso tende a se acentuar com a regulamentação do setor de apostas”, disse Benitez.