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Selic terminal, risco fiscal e efeito Trump: os fatores que vão influenciar os rumos do Ibovespa em 2025
O descompasso entre o resultado entregue pelas empresas do Ibovespa e o preço mais descontado dos papéis deve persistir em 2025, diante de um ambiente local difícil, na avaliação de especialistas.
A razão é que a piora da percepção de risco fiscal nas últimas semanas, somada à contratação de ao menos duas altas de 1 ponto percentual da Selic pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central até março deste ano, devem afastar o fluxo de investidores para a renda variável no curto prazo.
Entre as projeções de 17 bancos e corretoras compiladas pelo Valor, a mais otimista prevê um preço-alvo de 153 mil pontos para o índice em dezembro deste ano, enquanto a mais pessimista aposta em um patamar de 129.900 pontos.
No fim de 2025, a média das projeções de 17 instituições financeiras estima que o índice chegue a 142.182 pontos, o que representaria uma valorização de 18,21% em relação ao fechamento do ano passado, de 120.283 pontos.
Já a mediana das estimativas está em 143.200 pontos. Ambas representam uma perspectiva de alta modesta para um investimento de risco como ações, considerando que a Selic, que baliza o CDI, deverá atingir 14,25% em março.
Previsão para o Ibovespa
É possível, porém, que as casas alterem suas projeções ao longo do ano, à medida em que forem realizadas revisões nos lucros das companhias, diante de uma Selic muito maior do que o esperado e de uma expectativa de crescimento menor da atividade econômica.
Responsável por uma das projeções que mais se aproximaram do cenário atual, a RB Investimentos manteve a estimativa de 135 mil pontos para este ano devido à preocupação com a política monetária, que deve pressionar os lucros das empresas e aumentar o tamanho das dívidas corporativas, afirma o estrategista da casa, Gustavo Cruz. O profissional pontua que companhias relacionadas ao varejo podem ser especialmente prejudicadas.
“O sentimento agora é que, se continuar nessa toada, as expectativas de inflação vão seguir desancorando e o câmbio em disparada, o que vai exigir juros mais altos. Como o investidor local tem tendência a investir em renda fixa, isso aumentaria ainda mais agora”, destaca Cruz.
O profissional da RB lembra que a percepção do fim de 2023, quando houve um rali no Ibovespa, era de que o governo não deixaria “a peteca cair” no quesito fiscal. “Tudo bem, não geraria o melhor dos resultados, se cumprisse o mínimo, mas nem isso vai acontecer”, afirma, em referência à desidratação do pacote fiscal promulgado no Congresso no final do ano.
“O mais interessante é que não foi um ano ruim para as empresas, que performaram bem e superaram as expectativas com bons resultados”, diz. “Mas a bolsa precifica o que vem à frente, e a preocupação é com o desarranjo das contas do Brasil. É quase como ver o BC forçar a classe política a fazer o ajuste fiscal, caso contrário, os juros podem chegar perto dos 20%”, acrescenta o estrategista da RB.
Outra casa que também está com uma visão mais conservadora para o Ibovespa é o JPMorgan. Em relatório, a equipe do banco estima que o índice alcance os 135 mil pontos no fim deste ano.
“A situação fiscal provavelmente continuará a afetar o sentimento e os preços. Mesmo que a gestão fiscal melhore, permanece o receio de que o governo possa ‘abrir os cofres’ antes das eleições de outubro de 2026”, afirmaram os especialistas do banco. “O prêmio de risco refletirá isso e poderá ser um impeditivo para que os preços das ações sejam reavaliados”, completaram.
Já a equipe do Santander preveem um preço-alvo para o Ibovespa maior, de 145 mil pontos. Segundo os especialistas da casa, a projeção leva em conta uma taxa de crescimento nos lucros das empresas de 10% em 2025.
Os analistas do Santander, porém, avaliam, em relatório, que há um risco de que o crescimento do lucro por ação das empresas seja menor devido ao aumento da Selic. Em uma tentativa de “estressar os cenários” considerando uma taxa de juros entre 14% e 16,5% neste ano, o que seria o pior cenário-base da casa, o impacto no lucro das companhias do Ibovespa ficaria entre – 0,2% e -1,1%, o que seria irrisório, na visão do banco.
Os setores da bolsa em 2025
Alguns setores específicos, no entanto, poderiam ser mais afetados — caso de educação, saúde, varejo e transporte — com um impacto no lucro em 2025 que poderia variar entre – 0,3% e – 33,7%. O setor de educação, por exemplo, seria o mais prejudicado, com um efeito negativo no lucro entre 21,3% (considerando uma Selic de 14%) e 33,7% (colocando como base uma taxa de 16,5%).
A preocupação de que os juros mais altos podem desacelerar a atividade econômica e provocar um impacto negativo nos lucros das empresas também é compartilhada pelo BTG Pactual. A equipe de pesquisa do banco projeta que os lucros consolidados de 2025, com exceção de Petrobras e Vale, serão 2,7% menores do que o previsto há seis meses, ou seja, antes da autoridade monetária adotar uma postura ultraconservadora.
A projeção anterior era que os lucros das empresas domésticas subiriam 1,2% e das exportadoras de commodities recuariam 5,3%. Agora, excluindo WEG e companhias de processadores de alimentos, a previsão de lucros das empresas domésticas caiu 0,8% para 2025.
Entre os setores que registraram maior diminuição nas projeções de ganhos desde junho deste ano estão energia (redução de R$ 6,5 bilhões ou 29%); mineração e materiais (R$ 2,8 bilhões ou 22%) e varejo (R$ 2,4 bilhões ou 16%). Por outro lado, a equipe de análise liderada por Caio Sequeira aponta que os principais motores de alta no período foram alimentos (aumento de R$ 3,7 bilhões ou 41%) e bens de capital (R$ 2,6 bilhões ou 25%).
Embora a alavancagem média das empresas na bolsa esteja relativamente baixa, com o múltiplo de dívida líquida sobre Ebitda em 1,8 vezes, 48% da dívida das empresas domésticas está vinculada à Selic, contra 18% das exportadoras de commodities, diz o BTG. Assim, as empresas mais pressionadas por uma Selic elevada seriam varejistas de alimentos, companhias de eletrônicos e eletrodomésticos, e locadoras de veículos, além de algumas empresas do setor imobiliário, principalmente construtoras de imóveis de alto padrão.
Depois de estimar um patamar próximo do fechamento do ano passado para o Ibovespa, o Inter espera um preço-alvo de 143.200 pontos para o índice em 2025. O especialista em renda variável do Inter, Matheus Amaral, explica que a “pedra fundamental” para a bolsa tem sido o resultado das empresas, que superou as últimas expectativas ao longo do ano passado.
Eventuais revisões, no entanto, não podem ser descartadas após o resultado do quarto trimestre de 2024 e do primeiro trimestre de 2025, segundo Amaral. Em um cenário marcado por pressões inflacionárias maiores, juros elevados e câmbio depreciado, as ações de setores mais resilientes — como seguradoras, concessionárias públicas e exportadoras — são os preferidos do Inter para este ano.
Companhias com grande capacidade de repassar preços em um ambiente mais inflacionário também são citadas com destaque pelos analistas do Santander. Nomes como RaiaDrogasil, Lojas Renner, Iguatemi, Multiplan, Cyrela e Ambev podem se beneficiar ao apresentar produtos diferenciados, competição limitada de mercado, marca e reputação fortes, além de uma demanda inelástica de mercado.
Efeito Trump e fluxo de estrangeiros
Além de eventuais revisões no lucro das companhias, a bolsa local terá o desafio adicional de voltar a atrair fluxos positivos e significativos de estrangeiros. Na visão do estrategista da RB, o início do ano será balizado pelas medidas que serão implementadas pelo presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump.
Caso ele cumpra as promessas de campanha de taxar as importações de diversos países, incluindo o Brasil, isso pode determinar o humor do mercado. Para Cruz, o protecionismo de Trump pode fazer com que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) pause os cortes de juros, o que pode ser mais um entrave para o fluxo de investimentos retornar a países emergentes, como o Brasil.
“A bolsa não tem força nem durante os momentos em que há ventos favoráveis do exterior. Se o cenário externo ficar de ‘mau humor’, haverá menos interesse ainda do estrangeiro. Parece que não vamos ter um 2025 bom”, avalia o estrategista da RB.
Para analistas do Itáu Unibanco, o Brasil saiu do radar do capital externo e pode demorar para voltar a ganhar relevância nos portfólios internacionais, caso não trate da questão fiscal com seriedade. Não à toa, a casa cortou recentemente a exposição em bolsa local nas suas carteiras recomendadas para o menor nível em oito anos.
“É a primeira vez desde 2018 que o estrangeiro não vai investir em Brasil. Eu não consigo ver um mês, e precisa ter visibilidade para investir, para os estrangeiros voltarem. O país precisa controlar a inflação e o juro cair”, afirmou Nicholas McCarthy, diretor de estratégia de investimentos do Itaú Unibanco, em encontro com jornalistas em dezembro do ano passado.
Com informações do Valor Econômico
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