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Gestores recomendam ativos com isenção fiscal e diversificação internacional para proteger carteira
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Embora a ômicron adicione risco extra, o cenário agora é mais confortável do que no começo da pandemia porque o brasileiro voltou a ter a renda fixa como válvula de escape
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Na bolsa, ele sugere que o investidor tenha cuidado com a “ancoragem”, achando que um ativo ficou interessante só porque caiu 30% ou mais
A variante ômicron do coronavírus reativou o modo risco nos mercados financeiros. No último mês do ano, com o eventual reforço de caixa do 13 salário, o investidor se depara com mais essa incerteza, enquanto outras fontes de preocupação, como as pressões inflacionárias, não se dissiparam.
O nome do jogo é paciência, já que tanto as posições de renda fixa (prefixadas e atreladas à inflação) quanto as de bolsa estão no vermelho em 2021. Há quem veja possibilidades de ganhos, mas é preciso baixar a ansiedade para atravessar tempos difíceis. As principais recomendações são ativos de crédito com isenção fiscal e diversificação internacional.
Em novembro, o Ibovespa perdeu 1,53%, com queda acumulada de 14,37% no ano. Em 2021, todos os índices de bolsa estão negativos. O mês foi de recuperação para os indicadores de renda fixa, com alta de 1,79% no IRF-M, que representa uma cesta de títulos públicos prefixados, e de 3,47% no IMA-B, que reflete a média de papéis atrelados à inflação. No ano, eles ainda perdem, respectivamente, 3,81% e 1,49%. O rendimento bruto do CDB, conforme compilação do Valor Data, estava em 5,17%. Aquém, portanto, do IPCA em 12 meses, que já superava 10,6% em outubro.
No ano, nem a valorização do dólar, de 8,68%, compensa a inflação. Nesse quesito, só o bitcoin, com alta de 108,63%, rendia bons frutos.
Embora a ômicron adicione risco extra, o cenário agora é mais confortável do que no começo da pandemia porque o brasileiro voltou a ter a renda fixa como válvula de escape, diz Lucas Radd, chefe de portfólios e aconselhamento do Banco Inter.
Com a Selic em alta e o IPCA também, ele diz haver prêmios muito atrativos, em dívida soberana e crédito privado, com ganhos nominais na casa dos dois dígitos. Os ativos corrigidos pela inflação têm um adicional de 6%, 7% ao ano, dependendo do grau de risco. É alternativa que atrai tanto o perfil conservador – há aparentemente “gordura” nos preços pelos riscos fiscal e político -, quanto o mais arrojado, que costuma ir para papéis com maior potencial de retorno e risco.
Considere Renda Fixa com isenção de IR
Para Radd, vale selecionar papéis com isenção de imposto de renda, como certificados de recebíveis imobiliários e do agronegócio (CRI e CRA), debêntures de infraestrutura ou fundos com esses ativos. “Em momentos de IPCA elevado, é interessante contar com a isenção do IR porque o imposto come parte da correção.”
Com o risco fiscal alto e a eleição em 2022, o especialista diz que a diversificação com ativos externos segue na pauta, apesar da desvalorização cambial. Diante do acesso aberto ao público de varejo para compra de recibos de ações estrangeiras (BDR) e fundos de índice (ETF), é o tipo de alocação que pode ser feito diretamente na B3.
Traumatizado com a Bolsa? Tem remédio
Para ações brasileiras, a indicação é ter alocação apenas estrutural, na proporção indicada para cada perfil. Radd diz que, conforme a Selic foi cortada, até a mínima de 2%, o brasileiro fez um “movimento equivocado” de ir para a bolsa só porque a renda fixa não assegurava retorno. “O perfil do investidor não muda conforme a taxa fique alta ou baixa, ele não deixa de ser conservador ou agressivo.”
Para ele, o resultado é que o biênio 2020/2021 deixará mais uma “leva de traumatizados” na bolsa. “Quem teve paciência e esperou até recuperou, está ao menos no zero a zero. Quem não teve essa resistência teve perdas de 30%, 40%.”
A bolsa no Brasil está fora das indicações táticas do UBS Consenso, que tem dado preferência à renda variável no exterior. Com a Selic já em 7,75% ao ano e previsões de novas altas, temperadas pela instabilidade política, a sugestão é ter um mix com todos os papéis de renda fixa: pós-fixados, indexados ao IPCA e prefixados na média indicada para cada perfil, diz o estrategista de investimentos, Ronaldo Patah.
Foco no longo prazo
“Tem que aproveitar, inclusive quem tem o perfil mais arrojado, para comprar os títulos mais longos porque as taxas não vão permanecer nesses níveis por muito tempo”, diz. “Quem assumir a Economia [em 2023] não deve fazer uma mudança radical na política econômica. Com o Banco Central independente, alguma responsabilidade fiscal vai prevalecer.” Se houver esse desfecho, as taxas projetadas tendem a cair (e os preços, se valorizar), e o investidor poderia capturar o ganho de capital.
Há cerca de dois meses, a alocação “acima da média” em bolsa e fundos imobiliários pelo UBS foi ajustada para a parcela apenas estrutural nas carteiras.
Patah diz ver um ambiente negativo para as empresas. O aumento dos juros eleva o custo de capital e elimina parte do valor potencial das companhias listadas em bolsa ao mesmo tempo em que tira tração do PIB – o UBS projeta crescimento de só 0,5% em 2022.
Ativos gringos
A única classe na qual o UBS Consenso mantém indicação para um posicionamento extra é a de ativos internacionais. Desde abril, a alocação inclui bolsas americanas, europeias, além da japonesa. Ainda é considerada baixa a probabilidade de a ômicron se tornar uma variante grave a ponto de paralisar a atividade global, como se viu em 2020, segundo Patah.
Para o câmbio, apesar de os modelos apontarem um valor justo para o dólar na casa dos R$ 5, o especialista diz não ver muito espaço para o real se valorizar. Há uma barreira nos R$ 5,50 por causa da temperatura política e fiscal. Ou seja, diversificação internacional segue na ordem do dia. Mesmo com os ativos brasileiros depreciados, gestores de de recursos têm dado preferência para as classes de fora. Há quem até veja preços atrativos entre as alternativas locais, mas com o ambiente político e fiscal nebuloso, o mercado externo parece ser um lugar mais amigável.
“A gente move o portfólio para onde tem mais claridade. Não tem obrigação de estar em Brasil, não se compromete com pré-alocação de risco, pode estar em bolsa e em juros no Brasil, na Inglaterra ou nos EUA. A alocação é uma folha em branco e no momento o Brasil é muito difícil”, diz Marcelo Ferman, CEO e gestor da Parcitas Investimentos. “A bolsa, por algumas métricas, pode parecer barata, mas, para outros cenários, não.”
A combinação de cenário inflacionário, com alta de juros e eleição justifica a cautela, segundo o gestor Thomaz Callado. Com posições prefixadas na casa dos 12% e as Notas do Tesouro Nacional série B (NTN-B), em vários vencimentos, pagando inflação mais 5,5% ao ano, “o preço é bom, mas a gente não tem coragem de alocar em Brasil, falta evento, algum choque de credibilidade até as eleições”.
Desde o ano passado, a gestão tem dado preferência a ações de companhias americanas, que estão “indo muito bem e não necessariamente vão passar mal” quando o Federal Reserve (Fed, banco central americano) reduzir os estímulos monetários, diz Ferman.
Callado acrescenta que esse evento deve pesar mais no mercado de juros do que na bolsa. “As companhias americanas que a gente acompanha têm apresentado resultados excelentes, mesmo as grandes têm aumento de 30% na margem, isso não muda com os juros subindo.”
Para a variante ômicron da covid-19, embora existam cenários catastróficos, a expectativa dos gestores da Parcitas é que não se repita o caos do início da pandemia. O mais provável, diz Ferman, é que a cepa seja similar à delta, com muitos casos, mas sem elevar demais a letalidade. De qualquer forma, respinga na atividade e pode provocar problemas localizados de oferta, mas “não como 2020, naquele grau de incerteza”.
A alta de juros nos EUA, que tem sido antecipada pelos mercados diante da persistência inflacionária, ocorre num momento em que preços das ações estão esticados e pode ser um vento contra para a bolsa, diz Marcos Mollica, sócio-gestor do Opportunity Total. A nova variante também tem de ser monitorada. Se as vacinas existentes são incapazes de combatê-la, o mundo volta para o modo covid, com consequências para o crescimento global, e o Fed poderia atrasar a redução de estímulos.
Não é hora de inventar moda
Para o Brasil, o gestor mantém viés pessimista. Com o quadro eleitoral indefinido e o teto de gastos públicos violado, a falta de um norte fiscal pode trazer impactos mais duradouros para a inflação. Mollica diz estar praticamente zerado em bolsa local, com posições muito táticas em juros e câmbio.
Ele avalia que, no começo de 2022, o Banco Central já deve admitir que a meta de inflação não será cumprida, e que a política monetária vai mirar 2023. “A renda fixa vai ser concorrência grande para a bolsa e o cenário para as empresas mais desafiador”, diz. A incerteza eleitoral e a alta de juros vão minar o crescimento no ano que vem e a asset já trabalha com queda de 0,5% no PIB. Ao mesmo tempo, o cenário externo “deixou de ser um céu de brigadeiro”.
Mollica brinca que o momento é mais fácil para decisões do investidor pessoa física que do gestor profissional. “Não é hora de inventar moda e vale colocar parte substancial em papéis incentivados, como LCI, LCA (letras de crédito imobiliário e do agronegócio), CRI, LIG, CRA, vai aproveitar taxa alta, de 12%, livre de imposto.”
Na bolsa, ele sugere que o investidor tenha cuidado com a “ancoragem”, achando que um ativo ficou interessante só porque caiu 30% ou mais. O cenário mudou muito. “É difícil dizer se já foi tudo incorporado.”
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