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Gestoras se multiplicam mesmo com alta da Selic
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Iniciativas envolvem de asset dedicada a crédito estruturado e disputas judiciais a casas de research
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Entre as novidades também estão nomes ligados a assessorias de investimentos bilionárias
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Há ainda gestoras que se apresentam como alternativa de internacionalização para o brasileiro
Empresas citadas na reportagem:
A despeito do ciclo de alta de juros e da redução do ritmo de captação nos fundos de maior risco, novas gestoras de recursos ainda se multiplicam no mercado brasileiro. Os números da Anbima dão uma ideia dessa movimentação. Só neste ano, até outubro, 128 assets se credenciaram junto à autorregulação. Na mão oposta, 35 encerraram suas operações. No ano passado inteiro, a entidade registrou 104 novas casas, e 44 saíram das estatísticas.
Pelos dados mais recentes, são 803 assets no total, em comparação com 531 no fim de 2016, quando começou o processo de redução da Selic – que levou a taxa de 14,25% para os 2% ao ano até o início de 2021. Agora o juro básico já está em 7,75%, e com previsões de que retomará os dois dígitos.
A temporada traz uma diversidade de iniciativas: de asset dedicada a crédito estruturado e disputas judiciais, passando por nomes ligados a assessorias de investimentos bilionárias, a casas de research e gestoras que se apresentam como alternativa de internacionalização para o brasileiro.
Nesse campo, duas novatas chamam a atenção porque têm como sócios profissionais que fizeram carreira no Morgan Stanley. Na Alphatree está Rodrigo Jolig enquanto a Upon Global Capital é liderada por Thiago Melzer. Eles atuavam nas mesas de moedas de mercados emergentes em Londres e Nova York, respectivamente, e estiveram entre os profissionais afastados pelo banco americano no fim de 2019 ao investigar falhas na marcação a mercado com derivativos cambiais, conforme reportou a “Bloomberg” na ocasião.
Sobre o processo administrativo aberto pelo Morgan Stanley para apurar perdas com a lira turca, Jolig não faz nenhum comentário. O executivo atuou no banco entre 2011 e só se desligou em novembro de 2021. Melzer, que deixou o banco em julho, afirma que a apuração não encontrou nada que o desabonasse nem resultou em penalidades ou perda de licença para atuar no mercado financeiro. Já é página virada.
A Alphatree Capital nasce apadrinhada pela família do empresário Elie Horn, fundador e ex-presidente da construtora Cyrela. Com um patrimônio de R$ 320 milhões, a maior parte é desse capital semente, mas também há dinheiro dos sócios-fundadores.
Jolig, que antes passou pelo HSBC Securities e ABN Amro Real, assume como executivo-chefe de investimentos e como co-CEO. Ao lado dele, está Jonas Doi, que deixou a Verde Asset em agosto e que no curriculum traz atuações nos bancos Credit Suisse e J.P. Morgan. O comitê de investimentos ainda tem José Romeu Robazzi, um dos criadores da estratégia sistemática do fundo Zarathusta, da Zeitgeist (atual Giant Steps), e que também foi da Kapitalo. Raone Botteon, doutor em economia pela FGV e que esteve na equipe da antiga Hedging-Griffo, lidera o time de pesquisa.
Com essa base, a Alphatree espera conquistar o seu espaço no concorrido mercado de fundos de investimentos, que reúne R$ 6,79 trilhões, segundo os dados de outubro da Anbima. Só em multimercados, havia um patrimônio de R$ 1,55 trilhão, valor que encolheu 7,5% em relação a dezembro de 2020.
O mote do multimercado da Alphatree é combinar a gestão discricionária tradicional com ferramentas quantitativas. Todo o orçamento de risco está num “book” único, o que significa que as decisões são colegiadas. Cerca de 40% da exposição está no mercado internacional. “Minha expertise agrega muito para o brasileiro que cada vez mais busca o investimento no exterior, vê a necessidade de diversificar o risco”, diz Jolig.
Ele afirma que, enquanto faz operações com moedas globais, via contratos de derivativos e opções, Doi traz a experiência de “buy side”, gerindo carteiras com horizonte de médio e longo prazo, e Robazzi vem com a cultura de investimentos sistemáticos, tão comum nos hedge funds globais. “O investidor quer fontes originais de retorno e muitas vezes quando a casa é ‘multidesk’, o risco não é alocado de forma ótima, os gestores assumem os mesmos riscos”, afirma Robazzi.
Doi acrescenta que a análise parte do plano macroeconômico, o comitê de investimento aponta as estratégias para o comitê quantitativo, que, por sua vez, apresenta um modelo de alocação. Cabe à gestão discricionária decidir as posições que vão de fato compor a carteira. Jolig diz que essa é uma forma de tirar a emoção, disciplinar o processo de investimento, com o robô funcionando como um mediador.
Apesar do suporte de Elie Horn, a Alphatree não deve evoluir para a classe fundos imobiliários. A casa também não vai atuar como gestora de patrimônio para a família, explica Jolig. O projeto é dedicado à gestão de recursos de terceiros. Em dois ou três anos, ele calcula haver capacidade para captar até R$ 3 bilhões. O primeiro investidor institucional já foi fechado com o Safra, que também vai distribuir o fundo na sua plataforma.
O multimercado da Upon Capital começou a rodar há duas semanas, sendo distribuído na XP e no BTG. Melzer atua como executivo-chefe de investimentos, a partir de Nova York, onde lidera um time de traders. No Brasil, a asset conta com Pedro Silveira, ex-sócio da XP que montou a operação internacional da plataforma, e Fábio Isaack, que era o responsável pela mesa institucional da instituição. No total, o time tem 15 pessoas.
Diante da alta de juros no Brasil, Melzer diz que talvez não fosse o melhor momento para se montar uma asset, mas ele vê demanda por carteiras que privilegiem alternativas no exterior. A seu ver, essa é uma forma de se diferenciar dos multimercados macro locais, que buscam capturar resultados de fontes parecidas em juros, moedas e bolsa. “Só o fato de não ter foco em Brasil já permite ter um veículo descorrelacionado”, diz. A gestão vai atuar em mercados desenvolvidos e emergentes líquidos.
O movimento de agentes autônomos criando corretoras com distribuidores como XP e BTG também tem contribuído para engrossar a lista de gestoras de recursos. A Monte Bravo, ligada à XP, por exemplo, criou a Kilima, primeiro para oferta de fundos imobiliários, e que agora evolui para as carteiras líquidas.
Para colocar esse plano de pé, o grupo recém-contratou o economista Alexandre Mathias, que estava à frente do fundo de pensão da Petros. Ele trouxe uma equipe de três pessoas. A Kilima caminha para fechar 2021 com R$ 2 bilhões sob gestão, nas estratégias de fundos imobiliários capitaneadas pelo ex-Rio Bravo Eduardo Levy.
A intenção, diz o sócio fundador da Monte Bravo, Pier Mattei, é ter em gestão ativa, multimercado macro, fundos de crédito privado, de ações e “long biased”, que calibram a exposição em bolsa conforme o cenário. Mais à frente, o plano é entrar também no universo dos ilíquidos com carteiras de venture capital e de private equity. A EQI, ligada ao BTG, já tomou o caminho da gestão de recursos e recém listou na B3 seu primeiro fundo de ações para investir em empresas de tecnologia que compõem o índice Nasdaq.
Entre as casas de análise, Suno e Nord também abraçaram neste ano a gestão de recursos de terceiros. Seguem os passos da Empiricus, que nasceu como empresa de pesquisa independente, e foi uma das idealizadoras da gestora Vitreo, para replicar as suas carteiras. O negócio evoluiu para plataforma de investimentos e o pacote todo foi comprado pelo BTG Pactual em junho.
O fato é que progressivamente, os grandes bancos de varejo têm cedido espaço para instituições menores ou independentes na gestão de recursos. Dados da Morningstar mostram que a fatia dos cinco maiores – Banco do Brasil, Itaú Unibanco, Bradesco, Caixa e Santander -, caiu de 64,4% para 63,2% de outubro de 2020 para cá, para um patrimônio total de R$ 5,3 trilhões. Os números excluem fundos espelho ou fundos de fundos e consideram o universo regido pela instrução 555 da CVM, de portfólios líquidos.
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