Custo tributário do trabalho cresce com pouca progressividade, mostra estudo

Indicador teve aumento com reforma da Previdência e está acima do nível praticado pela OCDE

O custo tributário do trabalho (tax wedge, ou cunha tributária, no economês) no Brasil varia entre 32,5% e 38,7% do salário médio, conforme a composição das famílias.

O indicador mais recente é de 2021 e teve um aumento com a reforma da Previdência aprovada em 2019. O nível brasileiro está acima do praticado na OCDE, além de ter pouca progressividade, sobrecarregando as famílias maiores.

Na cunha tributária, estão imposto de renda, recolhimento ao INSS, FGTS, entre outros encargos.

As conclusões estão em estudo elaborado pelos economistas Manoel Pires, Matheus Stivali e Júlia Reis, antecipado ao JOTA e que será publicado nessa quinta-feira (16) pelo Observatório Fiscal do FGV Ibre, coordenado por Pires, que já foi secretário de política econômica do Ministério da Fazenda.

O material faz uma série de cálculos considerando desde famílias unipessoais até casais em que ambos são remunerados e têm dois filhos e trabalha como referência a renda média nacional.

“A menor cunha tributária refere-se à família unipessoal (um adulto, sem filhos) com 67% da renda média que saiu, com a reforma da previdência, de 31,8% para 32,5%, uma variação de 0,7 p.p”, apontam os autores.

“A maior cunha tributária se refere ao adulto com renda de 167% do salário médio sem filhos que saiu de 34,7%, cresce na margem ao longo dos anos, mas salta para 38,7% em 2020 com a reforma da previdência, uma variação de 4 p.p.”, completam.

A análise mostra também que no Brasil há uma diferença relativamente pequena entre o menor e o maior custo tributário do trabalho (chamada de “amplitude” da cunha tributária) na comparação internacional. “O Brasil está entre os países com menor amplitude da carga tributária. Isso reflete o fato de que a maior parte da tributação ocorre por meio de contribuições sociais e não pelo imposto de renda, o que torna o sistema muito pouco progressivo”, dizem os autores.

Alíquotas do INSS e do IRPF

De acordo com os economistas, as principais fontes de variação da cunha tributária para essa composição familiar estão vinculadas à progressividade das alíquotas do INSS e do IRPF. “Na medida em que o salário aumenta, a cunha tributária também aumenta”, destacam.

Eles também salientam que as compensações da cunha tributária em decorrência de benefícios fiscais ou de transferências de renda não se mostram importantes no caso do Brasil, diferentemente do que ocorre em vários países, inclusive desenvolvidos.

Ao JOTA, Manoel Pires destacou que o estudo ganha importância à medida que duas discussões ganham relevo no Brasil: a correção da faixa de isenção da tabela do Imposto de Renda (que deve ter uma elevação em breve para R$ 2.640) e a própria reforma da tributação da renda no país, essa prevista para ocorrer mais à frente, após a reforma da taxação do consumo.

Pires lembra que a faixa de isenção no caso brasileiro, atualmente em R$ 1.903, já é relativamente alta, embora não tenha correção desde 2015. Ele considera justo algum ajuste, como o que se caminha para ser dado para colocar em dois salários mínimos, mas aponta que, dada a situação fiscal e a estrutura de renda do país, a promessa de se elevar para R$ 5.000 não deveria se materializar.

Possível solução para tributação

Segundo o economista, seria mais eficiente do ponto de vista distributivo que o alívio na tributação da renda mais baixa se dê por mecanismos como maior dedução por dependente, entre outras, beneficiando as famílias maiores.

“Como nosso sistema de IR é relativamente pequeno, aumentar as deduções pode ter um impacto relevante, do ponto de vista do sistema como um todo. Então, talvez faça mais sentido essa discussão em um contexto de reforma no qual se aumentaria a participação do IR, reduziria a participação do INSS, o que daria um potencial de arrecadação no IR que permitiria trabalhar melhor as deduções, de maneira equilibrada, dentro do imposto. Mas acho que isso ajuda muito no diagnóstico da questão da faixa de isenção, para a gente pensar a questão de maneira mais integrada, e a partir de valores razoáveis, sem tanto impacto fiscal”, argumentou.

O Brasil tem um grande desafio na tributação da renda, que o presidente Lula inclusive tem enfatizado bastante. Os dados do estudo são bastante úteis para melhorar a qualidade desse debate cada vez mais urgente.

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