Sem trégua na Bolsa, assessores de investimento mantêm um olho na Copa e outro nas cotações
Até poucos minutos antes da vitória do Brasil sobre a Sérvia por 2 a 0, ontem, a empolgação limitada nas ruas estranhava quem viveu o clima de outras copas. Muita gente sequer parou de trabalhar durante o primeiro jogo da seleção brasileira na Copa do Catar.
Foi o caso de muitos assessores de investimentos no país, já que a Bolsa de São Paulo, a B3, permaneceu aberta durante a partida, até as 18h. O jeito, em muitos escritórios e corretoras, foi manter um olho na TV e outro no home broker.
O especialista de renda variável da Acqua Vero Investimentos, Heitor De Nicola, de 28 anos — apaixonado por futebol e “palmeirense roxo”, como ele se intitula —, pela primeira vez não vai conseguir fazer dos jogos do Brasil um evento. Ele, que acompanha com entusiasmo os mundiais desde a infância, ainda não trabalhava no mercado financeiro na última Copa.
Agora, terá de assistir às partidas no escritório, em São Paulo.
“Eu trabalho com ações, então isso afeta diretamente meu dia a dia. O time (da gestora) inteiro estará presente, à disposição dos clientes. Temos uma TV, que normalmente fica ligada na Bloomberg (concentrada em notícias financeiras), que colocamos na Globo para ver o jogo.”
Não é a primeira vez que a B3 mantém as negociações normalmente durante a Copa. Só houve horários especiais em 2014, quando o Brasil sediou o Mundial. Historicamente, o volume de negociações costuma cair quando está em curso o maior evento global do futebol.
Na de 2018, por exemplo, o volume movimentado caía a menos de R$ 6,5 bilhões em dia de jogo do Brasil. Naquele ano, a média diária de negócios ficava em R$ 11,4 bilhões.
Ontem, na estreia do Brasil na Copa do Catar, o feriado de Ação de Graças nos Estados Unidos ajudou a dar mais chances aos operadores do mercado de acompanhar os lances da partida. As Bolsas americanas, que exercem forte influência sobre os demais índices acionários globais, não abriram.
No Brasil, também houve trégua do noticiário político, com mais um adiamento da apresentação da “PEC da Transição” no Senado.
O volume de operações na B3 ontem foi de R$ 17,8 bilhões, bem abaixo da média diária neste mês, de R$ 38,8 bilhões, e no ano, de R$ 30,1 bilhões, segundo boletim da B3. Ainda assim, foi preciso ficar a postos no escritório.
Primeira Copa na firma
Com a redução da concentração bancária, o crescimento do mercado de capitais e a multiplicação de fintechs e corretoras de investimentos nos últimos anos, muitos profissionais do mercado financeiro são jovens que verão a sua primeira Copa no trabalho. Não atuavam na área há quatro anos, quando foi realizada a Copa da Rússia.
Sócio da Valor Investimentos, Gabriel Meira, de 27 anos, planejou deixar os televisores do escritório ligados na transmissão do jogo da seleção ontem enquanto mantinham atenção ao mercado. Quando foi chegando a hora do jogo, ele acabou resolvendo liberar a maior parte da equipe para ver o jogo em casa, mas ele mesmo ficou no escritório à disposição dos clientes e de olho nos números.
“A Bolsa brasileira está seguindo o mesmo parâmetro das internacionais (durante a Copa). A negociação é menor, mas não para. Se o cliente quiser negociar, temos que estar aqui”, afirma Meira. “É igual semana de carnaval, quando voltamos na quarta-feira de cinzas, às 13 horas. Tem muito cliente que liga 13h10 para operar.”
Também em São Paulo, o economista Bruno Komura, da Ouro Preto Investimentos, também adotou uma espécie de plantão, mas de, digamos, um posto avançado. O plano é assistir às partidas do Brasil na Copa em um bar próximo ao escritório, no Itaim Bibi, e voltar ao trabalho antes do término do jogo, a tempo de agir se algo importante mexer com o mercado nesse meio tempo.
“Vou ficar acompanhando no celular o que está acontecendo no mercado. Se sair alguma política monetária no exterior, por exemplo, ou qualquer movimentação importante, retorno para fazer negociações no leilão de fechamento.”
Por Letycia Cardoso
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