Caso Americanas: bancos reservam quase R$ 9 bi por risco de calote da varejista

Lucros de Bradesco, Itaú e Santander foram afetados pelo episódio, considerado por eles uma 'fraude pontual'

Empresas citadas na reportagem:

O rombo de R$ 20 bilhões na contabilidade da Americanas fez os três principais bancos privados do país provisionarem R$ 8,7 bilhões nos balanços do quarto trimestre divulgados recentemente, afetando seus lucros. Bradesco, Itaú e Santander estão entre os maiores credores da varejista e as provisões são reservas que instituições financeiras são obrigadas a fazer para lidar com risco de calote.

O aumento no provisionamento já é esperado pelo mercado. Não existe regra específica sobre o tema, que deve ser definido pela instituição financeira. Os credores costumam levar em conta exposição e nível de risco de cada operação.

Mas os analistas esperavam que a reserva contra perdas fosse, em média, de 50%. Bradesco e Itaú Unibanco decidiram provisionar 100% de sua exposição à Americanas, enquanto o Santander, 30%.

O Bradesco, que divulgou seus números na noite de quinta, informou que provisionou 100% de sua exposição à Americanas, o equivalente a R$ 4,8 bilhões. O banco tem a maior exposição à varejista entre Itaú e Santander.

A instituição teve um lucro líquido de R$ 1,4 bilhão no quatro trimestre, queda anual de 54,7%, e seu pior resultado trimestral desde o terceiro trimestre de 2006, quanto teve lucro líquido de R$ 219 milhões, segundo levantamento do Trademap. As ações do Bradesco caíam mais de 6% nesta sexta, na B3.

Em conferência com jornalistas, o presidente do Bradesco, Octavio de Lazari Junior, não cita nominalmente a varejista, mas diz que o banco decidiu provisionar 100% de sua exposição e deixar o caso no passado.

Para Bradesco, foi ‘fraude isolada’

Na prática, a reserva contra um possível calote no patamar de 100% indica que o banco não tem expectativa de receber a dívida com a Americanas. E, ao tomar essa decisão, o banco evita novos impactos do caso nos balanços de 2023.

“Foi uma fraude isolada e surpreendeu não só o Bradesco, mas todo o mercado pelo tamanho da dívida (R$ 48 bilhões), pela tradição da empresa e de seus sócios. Mas temos que tratar como um caso pontual. Não há mudança nas operações de risco sacado e não fizemos alteração nas taxas de juros ou do spread. Mas os modelos de crédito foram ajustados e o caso foi um aprendizado”, disse Lazari a jornalistas.

Nas operações de risco sacado, a companhia tem uma dívida a pagar, por exemplo, com a compra de mercadorias. Faz um acordo com o banco para que ele libere o dinheiro para o fornecedor. Na sequência, a varejista quita a dívida com o banco, pagando juros pelo prazo do empréstimo.

É uma forma de o banco financiar a empresa, enquanto a varejista paga o fornecedor em dinheiro, possivelmente com um desconto. O problema, no caso da Americanas, é que a operação não foi registrada no balanço da forma correta.

Lazari observou que o desejo dos bancos é resolver a questão e dar condições às empresas que passam por esse problema a se manterem vivas. Ele disse que o risco não é só dos bancos, mas de fornecedores, funcionários, afetando todo o mercado. Ele disse que, por enquanto, não há sinalização de como o caso será resolvido.

Perguntado sobre possíveis impactos financeiros de outras empresas, como Oi e Marisa, o presidente do Bradesco disse que o banco tem provisões adequadas.

“Estamos bem preparados para qualquer problema que podemos enfrentar pela frente”, garantiu Lazari.

Itaú diz que não houve contágio

No caso do Itaú Unibanco, o provisionamento do banco também foi de 100% de sua exposição à varejista, de R$ 2,7 bilhões. Também sem citar o nome da Americanas, o presidente do Itaú, Milton Maluhy, classificou o episódio como um caso isolado sem contaminação da oferta de crédito ao setor varejista.

O Itaú teve um lucro de R$ 7,7 bilhões no quarto trimestre de 2022, com impacto negativo de R$ 719 milhões no resultado por conta das Americanas. O luro do Itaú foi uma alta de 7,1% em relação ao quarto trimestre de 2021 e o banco conseguiu compensar as perdas com margens mais altas, resultado de uma carteira de crédito mais rentável.

Santander reservou R$ 1,1 bilhão

No caso do Santander, o banco não deixou claro no balanço quanto provisionou. Mas analistas de mercado fizeram o cálculo: a provisão foi de R$ 1,1 bilhão, cerca de 30% da exposição do banco à Americanas.

“Estimamos que o banco provisionou 30% da Americanas, ou cerca de R$ 1,1 bilhão, com impacto negativo de R$ 600 milhões no lucro”, afirmou o analista Rafael Frade, do Citi, em relatório.

Segundo o Santander, o desempenho da receita e da margem financeira no Brasil foi ofuscado por maiores provisões ligadas, em parte, a “um único nome” na carteira corporativa e de banco de investimento, sem citar nominalmente a varejista.

Na apresentação de resultados, o presidente do Santander Brasil, Mario Leão, destacou que os resultados do banco “não são o que gostaríamos”.

“Tivemos um evento subsequente de uma grande empresa na parte de atacado, que impactou os resultados nesse trimestre. Embora os resultados atuais não estejam entre os resultados esperados para esse momento, estamos cientes e preparados para enfrentar os resultados por trás disso”, destacou o CEO do banco.

O Santander Brasil reportou lucro líquido gerencial de R$ 1,689 bilhão no quarto trimestre de 2022, o que representa queda de 45,9% na comparação com o terceiro trimestre e de 56,5% ante o mesmo período de 2021.

Por João Sorima Neto

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