Análise: Lula conquista apoio na primeira semana, mas discurso econômico causa ruídos

Presidente eleito se reuniu com os chefes de Câmara, Senado e STF em Brasília em busca de governabilidade, diz Fábio Zambeli, do JOTA

A última semana marcou oficialmente o início da transição de governo, com a presença do presidente eleito em Brasília. Lula voltou de seu período de folga com uma agenda intensa na capital federal. Foi recebido com tapete vermelho pelos presidentes da Câmara e do Senado e fez um gesto ao Judiciário, indo pessoalmente ao gabinete da presidência do Supremo Tribunal Federal para uma visita de cortesia da qual participaram todos os ministros que estavam na cidade.

Foi um roteiro que espelha a liturgia do cargo. Além de buscar apoio para a governabilidade, o petista quis demarcar uma mudança de conduta em relação ao antecessor, prometendo virar a página dos confrontos entre os poderes que foi um traço marcante da gestão de Jair Bolsonaro.

Depois de conquistar amplo apoio político, Lula cometeu um erro que teve alto custo econômico: em discurso feito para parlamentares e transmitido em rede nacional de TV, o presidente eleito exaltou os investimentos públicos, ironizou a pressão por responsabilidade fiscal e deu uma espécie de licença para gastar a congressistas e ao seu time.

A resposta foi ruim para o petista: o dólar subiu e a bolsa caiu com as incertezas sobre os rumos da política fiscal do novo governo. E dólar alto, o petista sabe bem, é sinal de mais dificuldade para controlar a inflação, o que seria negativo para o início do terceiro mandato.

Já Bolsonaro segue recluso, sem exposição pública, enquanto manifestações em seu apoio e contra o resultado da eleição são mantidas em diversas capitais, sobretudo no entorno de instalações militares.

Esses protestos foram inflamados pelas Forças Armadas. Na terça-feira (8/11), um relatório do Ministério da Defesa colocou dúvidas sobre o sistema eleitoral, embora não tenha identificado fraudes nas urnas.

Na sexta (11/11), uma nota conjunta do comando do Exército, Marinha e Aeronáutica, bastante incomum e com teor político, defendeu, de forma indireta, como legítimos os movimentos, desde que não interfiram no direito de ir e vir. E também questionou as tentativas do Judiciário de investigar o financiamento e punir os manifestantes.

É o chamado “terceiro turno” em curso, enquanto o novo governo já lida com os desafios políticos e econômicos do próximo ano.

Nos próximos dias, as atenções estarão voltadas para a viagem de Lula à Conferência do Clima, no Egito, e para o texto final da chamada PEC da Transição, que vai definir o tamanho da despesa social que terá que ficar fora da regra do teto de gastos para que o governo eleito cumpra as promessas da campanha.

(Por Fábio Zambeli, analista-chefe em São Paulo)