Sem incerteza da eleição, estrangeiro vai voltar, diz Will Landers, do BTG
O Brasil se tornou hoje uma das poucas opções que fazem sentido para quem quer aumentar exposição a ações no curto prazo. E é por isso que, mesmo com um ambiente volátil no exterior e em um ano eleitoral, é possível esperar um fluxo positivo de investimento estrangeiro para a bolsa brasileira. Essa é a visão do chefe de renda variável do BTG Pactual Asset, Will Landers.
O executivo, que fica em Nova York, considera que a eleição não é uma fonte de grande incerteza. Mas ele identifica visões diferentes entre investidores. Uma reeleição do presidente Bolsonaro não seria tão bem-recebida pelo estrangeiro, dada a leitura – injusta, em sua opinião – de que o atual governo é pouco comprometido com os temas ESG. Já o investidor local, afirma, preferiria a continuidade da política econômica atual.
De todo modo, a expectativa geral é a de que não haverá uma ruptura em qualquer cenário. E é por isso que a surpresa positiva com o PIB, a queda da inflação e preços atrativos de papéis de diferentes setores devem abrir espaço para uma nova onda de alocação em ações nos próximos meses. Dinâmica que pode também beneficiar o câmbio. “Se a gente olhar puramente para as planilhas, acho que o dólar tende a voltar a R$ 5,00.”
Valor: As bolsas americanas voltaram a cair nos últimos dias, impactando também a bolsa brasileira. O ambiente voltou a ficar negativo para o mercado de ações?
Will Landers: A reação de mercado está em linha com o esperado depois do dado de inflação americana, que veio mais alto do que o esperado, que reforçou a expectativa de que o Fed vai ter que subir os juros mais do que estava precificado na curva. Os ativos americanos, os múltiplos do S&P, estão bem elevados quando comparados ao seu histórico. Dado o fato de que o Fed é visto como um pouco atrás da curva, ainda com muito trabalho a fazer para trazer o nível de inflação para níveis aceitáveis, parece que tem uma desconexão aí. Em um dia em que você tem sentimento de ‘risk off’ no mercado global, o Brasil acaba sofrendo. Mas o que tem de importante é que, enquanto o Fed vai ter que continuar nesse processo de normalização dos juros, o Brasil já fez o dever de casa. O Banco Central levou o juro para níveis mais altos do que qualquer país conseguiria aturar. E não só o Brasil está aturando essa taxa como está tendo um desempenho melhor do que o esperado. Há seis meses, muitos economistas previam um PIB negativo em 2022, e agora a gente está falando de um PIB acima de 2,5%, 3%. E tem também uma surpresa positiva em relação à inflação. Situação muito diferente da Europa, e também dos pares do Brasil. É verdade que temos uma eleição importante, superpolarizada. Mas o fato é que, para o mercado, para a economia, os riscos são bem menores do que eram no Chile, na Colômbia.
Valor: Quais são os riscos vindos da eleição presidencial considerados pelo mercado?
Landers: Acho interessante que a visão do investidor local é diferente da visão do estrangeiro. O Brasil continua com uma imagem bem ofuscada no exterior, e isso tem muito a ver com a comunicação do governo. Mas grande parte dessa imagem ruim é injusta. Essa ideia de que o Brasil é um país sem governança, sem preocupação ambiental e social, é muito exagerada, dado tudo o que a gente fez. Goste ou não do presidente Bolsonaro, ele foi eleito democraticamente. Ele faz declarações eloquentes e, claro, que não deixa o investidor feliz, mas acho que dizer que o Brasil não é um país ESG é um baita exagero. Essa é a cabeça do estrangeiro, que a eleição do presidente Lula seria um passo à frente na questão ESG. Vamos ver.
Valor: E qual a visão do investidor local?
Landers: O investidor local preferiria ter uma continuidade da política econômica do governo Bolsonaro. Com as privatizações, as concessões, as minirreformas, a gente finalmente está conseguindo ter, depois de seis anos de governo mais liberal, um impacto positivo. Temos hoje uma relação dívida/PIB parecida com o que tínhamos antes da pandemia, mesmo tendo gasto tudo o que se gastou em 2020. Por isso, para o mercado local, a reeleição representa uma certeza maior de continuidade das políticas que a gente conhece hoje. Mas olhando para um eventual governo Lula, o mercado acha também que será difícil ter grandes mudanças, porque está tudo funcionando. Acho que seria muito arriscado para um eventual novo governo mudar radicalmente.
Valor: O sr. espera fluxo positivo para a bolsa após a eleição?
Landers: Apesar deste mês a gente ter visto o investidor estrangeiro ter parado de trazer recursos, a gente vê um ano ainda superbom. E, sem a incerteza da eleição, o investidor vai voltar a olhar números e vai ver que a bolsa brasileira vai se tornar bastante interessante.
Valor: Como o câmbio vai ser impactado?
Landers: Acho que o investidor precisa ter alguma certeza para colocar os números certos na planilha. Então acho que as pessoas já têm mapeado o que esperar em uma eventual vitória de Lula ou de Bolsonaro. Tem o que se espera de um governo Lula parecido com o governo anterior dele, e tem o risco de cauda, que é pequeno, de alguma mudança drástica na economia. Se a gente olhar puramente para as planilhas, acho que o dólar tende a voltar a R$ 5,00. E um dólar a R$ 5,00 ainda é barato.
Valor: A instabilidade no exterior não traz um clima de aversão ao risco que afeta também a bolsa local?
Landers: De certa forma sim, mas acho que a competição está mais a nosso favor porque há menos ativos que são tão atrativos como os que o Brasil oferece. Acho que não vai ser o mesmo fluxo que vimos há 10, 11 anos, quando houve enxurrada de recursos para a bolsa brasileira, mas a gente acabou virando uma das poucas opções que fazem sentido para quem quer aumentar exposição a equities no curto prazo.
Valor: Onde tem mais oportunidade na bolsa brasileira?
Landers: Em 2020, 2021, com o juro baixo, muitos novos fundos foram abertos para o investidor que queria aproveitar aquela oportunidade em ações. Essas empresas domésticas, muitas de menor porte, eram muito pequenas para o estrangeiro, mas foram muito demandadas pelos locais. Depois, com a onda de saques desses fundos, essas ações apanharam, muitas até mais do que mereciam. Agora, o investidor estrangeiro veio para o Brasil para comprar as ‘large caps’ – Petrobras, Vale, bancos -, que fazem sentido para quem quer ter uma carteira global. Mas agora que chegamos no pico da inflação, deve começar um processo de realocação em renda variável. Acho que os papéis da economia doméstica tendem a se beneficiar. De outro lado, a parte de commodities ficou um pouco para trás com o problema de crescimento na China, risco de recessão nos EUA e Europa. Então acho que criou oportunidade. O setor doméstico está mais atrativo, mas tecnicamente falando o setor de commodities está bem leve, tem potencial nos próximos meses.
Por Lucinda Pinto
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