Disciplina fiscal define se Bolsa do Brasil aproveitará onda favorável a emergentes em 2023

Especialistas sugerem analisar ações brasileiras com a lupa para encontrar as melhores oportunidades

Neste momento, são duas as principais visões sobre as perspectivas para a Bolsa de Valores brasileira, a B3, em 2023. Uma mais pessimista e outra, mais otimista. Ambas começam com a análise do cenário internacional.

Em 2022, para tentar domar a maior inflação em 40 anos, os bancos centrais da Europa e dos Estados Unidos aumentaram suas respectivas taxas de juros aceleradamente.

Nos EUA, a taxa passou do intervalo de 0-0,25% ao ano em março para 4,25%-4,5% ao ano em dezembro. Neste mês, após quatro altas consecutivas de 0,75 ponto percentual, a autoridade monetária americana reduziu um pouco o ritmo de elevação para 0,5 p.p. Logo depois, o BCE (Banco Central Europeu) seguiu o Fed, aumentando os juros também em 0,5 p.p., para 2% ao ano.

Apesar de tirarem um pouco o pé do acelerador, os dois BCs deixaram bem claro que seguirão firmes no combate à inflação. Se o tamanho das elevações diminuiu, é possível que haja uma quantidade maior de aumentos distribuídos ao longo dos próximos meses – dependendo do comportamento da inflação. Segundo o Departamento do Trabalho dos EUA, os preços subiram 0,1% em novembro em relação ao mês anterior e 7,1% no acumulado de 12 meses, quando as estimativas eram de altas de 0,3% e 7,3%, respectivamente. Em relação ao pico de 9,1% em 12 meses, atingido em junho, significa uma desaceleração relevante.

O próprio Fed prevê que o ponto máximo a que os juros chegarão no próximo ano é de 5,1%. Pode acontecer já em fevereiro, na primeira reunião da autoridade monetária de 2023.

Este é o ponto em que as opiniões sobre a B3 divergem.

Uma parte dos especialistas julga que é muito difícil para os ativos de renda variável brasileira competir com tal nível de juros americanos, de cerca de 5% ao ano. Podendo ganhar esse rendimento com os títulos do Tesouro dos EUA, considerado o país mais seguro do mundo para as finanças, não haveria muito incentivo para os grandes investidores internacionais correr mais risco investindo em uma nação emergente. Especialmente quando o volume de dinheiro disponível encolheu devido ao fim das políticas de estímulo econômico nos EUA e na Europa, que desde o início da pandemia inundou os mercados.

“Começamos 2023 um tanto mais cautelosos, com pé no chão, esperando um ano quase tão duro quanto 2022, a depender do cenário global”, afirma Douglas Souza, sócio e diretor financeiro do Grupo Anga.

A visão mais otimista é de que, se realizada, com o arrefecimento da inflação, a expectativa de fim do aumento de juros pelo Fed é uma ótima noticia para os mercados emergentes, principalmente os que se adiantaram e começaram antes dos países mais desenvolvidos a aumentar os juros, já colhendo os frutos do controle da inflação. Nesse grupo estão o Brasil, o México e o Chile.

“O Brasil é um dos que que chama mais atenção por estar muito barato, com empresas de saúde financeira muito boa”, diz Roberto Chagas, diretor de renda variável da gestora de investimentos EQI Asset. “Entretanto, o risco de o Brasil perder essa janela de oportunidade é o de um possível descontrole fiscal por parte do governo eleito, impossibilitando que o BC brasileiro volte a reduzir os juros.”

Ações na lupa

A visão sobre o mercado de ações em 2023 pode até ser um pouco mais otimista, mas o cenário não está fácil. Então, o investidor vai precisar analisar com lupa cada empresa e papel para encontrar o que realmente vale a aposta.

Os setores mais interessantes nesta realidade, segundo os especialistas, são:

1. Geração, distribuição e transmissão de energia elétrica

As companhias de energia têm resultados mais estáveis porque trabalham com contratos de longo prazo com os governos, geralmente com cláusulas de reajuste pela inflação. Costumam ser afetadas por períodos de desaceleração econômica, porém esse não é um grande risco para o ano que vem. Com os benefícios sociais em nível elevado e a perspectiva de estímulos por parte da nova administração de Lula, a atividade tende a se manter aquecida. Segundo a mais recente edição da pesquisa de expectativas Focus, realizada semanalmente pelo BC, os analistas do mercado financeiro esperam que o PIB (Produto Interno Bruto)

2. Varejo que não depende de crédito

Mesmo que recuem um pouco, os juros em dois dígitos no Brasil desencorajam muito o consumidor a tomar crédito para comprar um bem como um carro, por exemplo. No entanto, lojas que vendem produtos mais baratos e são competitivas em termos de presença geográfica e na internet podem seguir apresentando lucros respeitáveis.

3. Bens de consumo de luxo

Nunca há crise para quem mira nos consumidores de maior poder aquisitivo, que não dependem de financiamento para comprar. Nessa categoria há desde os shopping centers de luxo quanto as joalherias e as marcas de roupa que são objeto de desejo.