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Alternativa aos juros altos: o que os críticos de Campos Neto defendem no combate à inflação?
Cerca de 80% dos brasileiros apoiam o presidente Lula na sua postura de pressionar o Banco Central e seu presidente, Roberto Campos Neto, pela queda da taxa de juros, a Selic. É o que mostra uma pesquisa do Datafolha divulgada no começo de abril.
No entanto, entre os especialistas do mercado financeiro, boa parte tem apoiado a decisão de Campos. Ou seja, manter a taxa básica de juros, a Selic, alta como única solução para controlar a inflação.
Por outro lado, há também profissionais destacados da área que criticam a postura do Banco Central. E dizem que há, sim, como controlar a inflação sem que o Brasil figure no topo da lista das maiores taxas de juros do mundo.
“Inflação não é causada por demanda”
Inclusive, economistas críticos a Campos Neto apontam que os patamares atuais da Selic são pouco eficientes na alegada missão de controlar a inflação. Isso porque ela não é causada por um superaquecimento do mercado, que justificaria o aumento dos juros.
“Eu acho um erro manter os juros no patamar atual, porque a inflação que a gente vê hoje não é causada por demanda. Em geral, a gente usa juros para frear a demanda quando ela é excessiva. Mas não é o caso”, diz Bruno De Conti, doutor em Economia pela Unicamp e que foi economista do BNDES entre 2010 e 2012.
Para Conti, um dos problemas da política monetária atual é não contemplar a complexidade de fatores que pressionam a inflação. Por exemplo, desvalorização do real em relação ao dólar, indexadores mal utilizados, regimes de meta de inflação incompatíveis e oferta insuficiente de produtos e serviço.
Como combater a inflação sem subir juros?
O aumento dos preços, segundo Conti, pode ser por falta de oferta de determinado produto no mercado e não por excesso de demanda. Isso, portanto, requer medidas diferentes.
“É preciso estimular a produção”, diz. Para isso, é preciso ampliar o investimento público, o que “pode ser anti-inflacionário, ao contrário do que se imagina”. Afinal, equilibraria oferta e demanda na outra ponta dessa relação.
Outra possibilidade apontada pelo economista e ex-BNDES para que o Brasil controle a inflação é a intervenção no câmbio.
“A volatilidade cambial provoca inflação. Quando o câmbio sobe, isso faz com que os preços subam também. Porém, isso não é corrigido para baixo quando o câmbio cai”, destaca.
Com isso, a inflação absorvida pela economia brasileira em ciclos de altas do dólar não é devolvida depois, quando a moeda americana perde valor em relação ao real.
“Mesmo se o câmbio oscile entre R$ 4,90 e R$ 5,10, como agora, isso gera assimetria, que é a transferência da variação do câmbio para os preços”, explica.
“Uma das coisas centrais para controlar a inflação no caso brasileiro seria ter uma taxa de câmbio mais estável”, propõe Conti.
Indexação de preços é problemática
Além disso, ele diz que o Brasil tem heranças do tempo da hiperinflação, dos anos 1980, que ajudam a arremessar os preços para cima.
Uma delas é a indexação de preços, como no caso do aluguel, que é corrigido pelo IGP-M (Índice Geral de Preços do Mercado). O indexador contém, na sua composição, 60% do preço do atacado e 10% de custos da construção civil, o que faz com que esteja sujeito a variações no câmbio.
“Quando sobe o dólar, o aluguel sobe. Não deveria ser assim porque, hoje, não tem nada a ver aluguel com câmbio. Temos essas heranças de indexação que ajudam a explicar o comportamento dos preços no Brasil”, critica.
“Porém, mesmo essas heranças, por si só, não explicam o patamar atual de juros”, acrescenta Conti.
Metas de inflação
Uma luta eficiente contra o aumento dos preços deve contemplar também uma mudança no regime de metas de inflação, diz Pedro Paulo Zaluth, professor do Instituto de Economia da Unicamp.
Para ele, o cálculo utilizado para perseguir uma meta de preços gerais deveria contemplar apenas o núcleo da inflação.
O professor afirma que o caminho é reformar o regime de meta de inflação, que hoje anual. Para Zaluth, é preciso que o alcance da meta esteja além do ano-calendário, como é hoje.
Além disso, ele diz que é preciso levar em conta que há aumentos sazonais de preços que não dependem necessariamente de ações proativas para que voltem a seus patamares.
“A pressão sobre o preço das commodities, por exemplo, tem um efeito temporário e não persistente sobre o nível geral de preços, sobretudo quando a demanda está muito desaquecida, como ocorre no Brasil. Então, basicamente, cabe esperar os preços reduzirem, e isso acontece sem a necessidade de aumentar a taxa de juros”, avalia.
Controle de preços de itens básicos
Ainda assim, Zaluth crê que existe maneiras de frear a subida de preços de itens básicos, como alimentos, que explodiram no último ano e achataram o poder de compra e aumentaram a insegurança alimentar das famílias.
Isso pode ser feito com a taxação de exportações durante o pico de preços no mercado internacional, “de maneira que esses itens básicos sejam oferecidos aqui, no mercado interno”.
Ele menciona a proposta do governo Lula de taxação da exportação do preço do petróleo como uma das ações que o novo governo tem apresentado para contornar a subida de preços à margem do aumento dos juros.
A médio e longo prazo, as medidas que podem ser tomadas envolvem regulação dos mecanismos de distribuição de produtos agrícolas, oferta de crédito em infraestrutura para expansão da produção agrícola para o mercado interno e estoques reguladores dos preços para garantir um controle dos preços dos grãos.
Por que a inflação está acima da meta, mesmo com juros altos?
Além disso, ele destaca que a inflação pode ser explicada “em boa parte pela política de preços da Petrobras e pela elevação do preço das commodities, inclusive do petróleo. Mas não apenas: também de outras commodities, minerais e alimentícias, por exemplo”.
Zaluth também coloca na conta a guerra entre Rússia e Ucrânia como fator que pressiona os preços no Brasil.
Todos esses eventos, mencionados pelo professor, estão fora do que pode ser classificado como demanda agregada. Por conta disso, ele entende que os juros altos são insuficientes para controlar os preços, porque não atacam o problema central.
Para Guilherme Mello, secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, há fatores, principalmente do lado da oferta, que explicam os índices de inflação no Brasil e no mundo nos últimos anos. Por exemplo, “a ruptura das cadeias produtivas”, causada pela pandemia e pela guerra na Ucrânia.
Mello também destaca “a elevação do preço do petróleo”, que tem arrefecido nos últimos meses e reduzido a pressão inflacionária no Brasil e em vários outros mercados.
Por que os juros seguem altos?
Um dos maiores críticos da política monetária do Banco Central sob a batuta de Campos Neto, o ex-banqueiro Eduardo Moreira, que foi sócio no BTG Pactual, diz que a taxa de juro real no Brasil, que tem oscilado entre 7 e 8%, “não tem igual no mundo”.
Ainda, contesta os argumentos que indicam que esse patamar é necessário para estabilização dos preços.
Ele diz que a economia não está aquecida e que o Brasil também não é um dos países mais endividados do mundo, porque tem uma relação dívida/pib muito parecida com as outras economias de mesmo tamanho.
Além disso, não há temor com relação a uma corrida dos investidores porque é um dos países que mais tem reservas internacionais em relação ao tamanho da sua economia.
Na visão de Moreira, os juros altos têm a ver com a alta remuneração que eles são capazes de oferecer para quem vive de renda, que encontra um cenário confortável com a Selic no atual patamar. “Você praticamente dobra o seu dinheiro a cada cinco anos, sem fazer nada”, avalia.
“A taxa de juros, na verdade, garante aos credores um juro real elevado, mas não para controlar a inflação. É mais uma sinalização para os credores do que para o controle da inflação”, complementa Zaluth, da Unicamp.
Conti também destaca interesses de determinados setores da economia em manter a taxa de juros elevada, porque aumentam a rentabilidade de produtos financeiros.
“Existe uma pressão do mercado financeiro por taxas altas, como a gente tem visto, isso também está por trás desse patamar de juros”, avalia.
Câmbio também interfere
Além disso, o câmbio pode ajudar a explicar o porquê de os juros brasileiros estarem sempre na lista dos maiores do mundo, diz o ex-BNDES.
“Pelo grau de abertura e de volatilidade do fluxo de capital no país, nós vivemos sempre com meda da fuga de capital e desvalorização cambial. Isso mostra que existe um atrelamento muito grande entre juros e câmbio, e o juros são usados para manter o câmbio controlado”, afirma.
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