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Shoppings esperam ‘virada’ até março
Os shoppings saem da crise lentamente e devem conseguir retornar ao patamar de vendas registrado antes da pandemia só no primeiro trimestre do ano que vem, segundo a entidade do setor. Essa retomada ocorre num cenário de desempenhos desiguais entre os empreendimentos – e concentrada especialmente nas áreas mais ricas -, mas é crucial para os planos a partir de 2022.
Os números até novembro mostram queda de cerca de 10% nas vendas em relação a 2019 e apontam para um recuo de 9% no ano todo, segundo a Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce). A entidade faz acompanhamento mensal com apoio da Cielo.
Pelo desempenho visto até metade do ano, alguns varejistas chegaram a levantar a possibilidade de desengavetar projetos de abertura de lojas de rua, em detrimento dos shoppings. Mas, a cada mês, empresários e gestores de fundos veem melhora gradual na venda por metro quadrado dos empreendimentos, o que ajuda a sustentar projeções mais animadoras, mesmo com o consumo desacelerando no país.
“Até março devemos ‘zerar’ a queda e ir para um índice positivo frente a 2019. Esse recuo já chegou a ser de 90% em 2020; com a reabertura do comércio foi para 40%, 30% neste ano; até chegar hoje a 10% frente a 2019. Ainda é negativo, mas todos os indicadores operacionais melhoraram, como inadimplência, taxa de ocupação e nível de desconto negociado com lojistas na crise”, diz Glauco Humai, presidente da Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce).
Segundo ele, quando se analisa o desempenho de semanas isoladas, houve períodos em novembro com alta de um dígito na venda sobre fevereiro de 2020, antes da crise sanitária. “Ao olharmos os dados gerais do varejo, parece difícil pensar em retomada mais consistente, só que já estávamos tendo uma recuperação mesmo com cinemas fechados e sem a volta de 100% dos eventos”, afirma Humai. Os cinemas adicionam 8% a 10% ao tráfego médio diário de clientes, incluindo fins de semana.
A Abrasce estima que o setor vai movimentar R$ 210 bilhões em vendas este ano, versus R$ 129 bilhões em 2020. No ano passado, com o fechamento dos shoppings por meses, o faturamento voltou ao patamar de 2013.
De acordo com Leandro Bousquet, sócio e responsável pela área de “real estate” da Vinci Partners, a melhora no desempenho do mês versus o mês anterior, apesar de gradativa, tem efeito no nível de confiança do lojista.
Nos ativos do fundo gerido pela Vinci na área (Vinci Shopping Centers FII) essa recuperação vem ocorrendo desde abril – em setembro sobre agosto houve estabilidade. “Setembro é sazonalmente pior mesmo. O fato é que, entre 2014 e 2016, o varejista não via uma luz no fim do túnel por um bom tempo. E uma sinalização de tendência como a que temos agora é crucial. O que acionaria o sinal amarelo seria começarmos a regredir sobre o mês anterior e não há isso hoje”, diz.
Os empreendimentos do fundo mostraram queda de 4,4% nas vendas por m2 em outubro sobre 2019 e avanço de 14,7% na comparação com 2020. “A praça de alimentação até muito pouco tempo não estava cheia e, mesmo assim, os números foram avançando. E o Auxílio Brasil está saindo e ajuda muito a venda no Nordeste”, acrescenta.
A Abrasce calcula cinco inaugurações em 2021, abaixo das 13 aberturas esperadas por conta de adiamentos. Sete dos oitos empreendimentos adiados ficaram para 2022 e um migrou para 2023.
Na avaliação de Luiz Alberto Marinho, sócio da consultoria GS&Malls, os desempenhos nos empreendimentos estão muito heterogêneos, com diferenças maiores do que se viu após a recessão de 2015, a depender do perfil de lojistas, do público consumidor e região geográfica.
“O Centro-Oeste e o Rio estão indo melhor que São Paulo por causa de uma economia mais aquecida e por terem um ‘home office’ menor também”, diz Marinho. Dados de julho a setembro da Aliansce Sonae, uma das maiores empresas de shoppings do país, mostram os empreendimentos de São Paulo com vendas 10% abaixo de 2019; no Rio, o recuo é de 6%.
Para ele, os shoppings e galerias populares estão sofrendo bem mais, “simplesmente porque os pobres estão ficando mais pobres com a alta da inflação e perda de renda”, afirma. “Com a pandemia, apareceram mais bolsões de riqueza e de pobreza pelo país, com os shoppings sendo favorecidos ou penalizados por isso, a depender da localização de cada um.”
O consultor cita também os dados de empreendimentos das empresas abertas. “Em geral, elas estão retomando bem, com lucro operacional subindo e inadimplência recuando, basta ver os balanços. Mas local a local, você vê o Shopping Vila Olímpia, da Multiplan, [em São Paulo], que depende da demanda dos escritórios, caindo 47% no terceiro trimestre sobre 2019, e o Village Mall [no Rio], para classe A, subindo 41%”.
Outro empreendimento, o Shopping Estação, em Curitiba, com público 70% formado pelas classes C e D, teve queda de 28% nas vendas no terceiro trimestre. No campo oposto, o Estação Cuiabá, no Centro-Oeste, com 70% de visitantes de classe A e B, cresceu 31%.
Na visão da JHSF, umas das maiores do setor no segmento premium, os mais ricos vêm comprando mais localmente. “A pandemia mostrou ao brasileiro que ele pode comprar aqui dentro o mesmo produto lá de fora. Tem ainda 30% a 40% de diferença no valor final, em parte, custos e impostos, mas o parcelamento reduz esse impacto”, diz o CEO da JHSF Malls, Robert Harley. As vendas dos lojistas da JHSF subiram 45% de julho a setembro frente a 2019.
Meses atrás, redes como Soma, dona de grifes como Farm e Reserva, e Raia Drogasil levantaram a hipótese de abrir mais lojas de rua por conta de desempenho ainda lento nos shoppings e dificuldades de renegociação de contratos. Mas os números foram melhorando e as lojas de rua, que por um período cresceram mais que os shoppings, perderam força.
Dados da Abrasce/Cielo mostram que, em outubro, os pontos em rua cresceram 7,7% sobre 2020, com expansão acumulada no ano de 11,2%. Os shoppings avançaram 21% em outubro, frente a uma alta acumulada de 24%.
Há uma redução paulatina nos descontos dados na locação pelos shoppings, mas as lojas continuam ressaltando a necessidade de adiar essa retirada. “De um ano para cá, eles querem reduzir em 70%, 80% a taxa de desconto que davam, só que a venda não subiu nessa mesma velocidade”, diz um lojista de moda infantil com sete franquias. No fundo imobiliário da XP, XP Malls FII, com 12 shoppings, essa taxa já foi de 13% em outubro (quando as vendas subiam 2%) de 2020 e está em quase 3% (vendas sobem 17%).
Ainda há lojistas, de diferentes portes, levantando a discussão da troca do IGP-M pelo IPCA como indicador de reajuste dos contratos de locação dos espaços. “Quinta-feira mesmo eu estava no telefone tratando disso com uma rede grande de vestuário. Quem pode mais, pede mais, e até consegue, porque me interessa manter a loja. É tudo relacionado com poder de barganha”, diz um operador com 20 shoppings e 30 anos no setor.
A Abrasce entende que a judicialização de contratos não avançou neste ano e diz que os lojistas estão retomando a confiança, o que ajuda nesse processo.
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