Marco Legal da inteligência artificial: o que é e qual é a importância da regulação?

Em tramitação no Senado, projeto de lei se propõe a criar um ambiente mais seguro, ético e inovador para o desenvolvimento de tecnologias de IA no Brasil

De olho em como regulamentar as recentes inovações tecnológicas, o Congresso discute o projeto de lei que propõe a criação do Marco Legal da Inteligência Artificial (IA).

Assim, essa nova legislação, segundo especialistas ouvidos pela reportagem, se propõe a criar um ambiente mais seguro, ético e inovador para o desenvolvimento de tecnologias de IA no Brasil.

“É uma legislação fundamental para trazer maior segurança para a sociedade diante dos diversos riscos oriundos do desenvolvimento e da utilização das tecnologias que fazem uso da inteligência artificial. A regulação é muito importante, motivo pelo qual o Brasil não é o único nesse processo. Não regular não é uma opção, existe um consenso sobre sua necessidade, inclusive daqueles que desenvolvem essas tecnologias e sabem dos riscos envolvidos”, afirma Márcio Chaves, especialista em direito digital e propriedade intelectual.

Inteligência artificial: histórico de tramitação

Então, no mês passado, o senador Eduardo Gomes (PL-TO) apresentou o texto preliminar do Projeto de Lei 2338/2023.

Dessa forma, o PL foi originalmente proposto pelo presidente Rodrigo Pacheco (PSD-MG), a partir do trabalho de uma comissão de juristas e mescla, ainda, outros projetos sobre o tema que tramitam na casa.

Um deles é o PL 21/2020 do deputado Eduardo Bismarck (PDT-CE), que já foi aprovado na Câmara.

Assim, o texto define “sistema de inteligência artificial” como um “sistema baseado em máquina que, com graus diferentes de autonomia e para objetivos explícitos ou implícitos, infere, a partir de um conjunto de dados ou informações que recebe, como gerar resultados, em especial, previsão, recomendação ou decisão que possa influenciar o ambiente virtual ou real”.

Além de elencar tipos da tecnologia, como IA generativa.

Agora, o texto deve passar pela deliberação da comissão, com encaminhamento à Câmara em comum acordo.

Dessa maneira, a meta é que o texto final esteja pronto até a reunião da cúpula do G20, programada para 18 e 19 de novembro.

IA: proteção dos direitos em pauta

Então, para o advogado Samuel Anderson Nunes, mestre em direito econômico e desenvolvimento, a regulação deve proteger os direitos das pessoas e promover a inovação tecnológica, garantindo que os benefícios das tecnologias de IA sejam amplamente compartilhados.

“A regulação promove o uso ético e responsável dessa tecnologia, garantindo que o seu desenvolvimento e implementação respeitem os direitos humanos, a privacidade e a não discriminação”, afirma.

“Isso porque, através da regulação, é possível estabelecer princípios éticos que orientem a criação de sistemas de IA que sejam transparentes, explicáveis e responsáveis, aumentando a confiança dos usuários e das empresas nessas tecnologias”, complementa.

Além disso, a regulação fortalece a proteção de dados pessoais e a segurança cibernética, ao se alinhar com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).

Assim, isso se mostra fundamental em um contexto em que a quantidade de dados coletados e processados por sistemas de IA é crescente, de acordo com Nunes.

IA é uma tendência que começa agora - Foto: Unsplash
IA é uma tendência que começa agora – Foto: Unsplash

Impactos da regulamentação

Para além da influência do Marco Legal na tecnologia em si, a regulamentação também deverá impactar o ambiente de negócios. Assim, trazendo uma série de custos às empresas dada a necessidade de criação de uma governança de IA nas empresas.

“Na prática, isso se traduz em avaliações prévias dos potenciais riscos na criação e na utilização das IAs, seguindo normas corporativas a serem elaboradas para essa finalidade, como é o caso das Políticas de Uso de IA e das Avaliações de Impacto de IA, para se mitigar o risco do desenvolvimento e do uso desregrado e sem qualquer tipo de verificação de potenciais problemas deles decorrentes, que é o que mais vemos enquanto a regulação não existe”, afirma Márcio Chaves.

Dessa maneira, para o consultor de inovação e estratégia Caio Almendra, é difícil, no entanto, acreditar em um impacto robusto no desenvolvimento local de IA.

“Os maiores desenvolvedores de ciência de dados totalmente nacional são centros de pesquisas públicos, que continuarão existindo caso o Marco Legal seja aprovado”, diz.

Além disso, ele acredita que a inovação trazida pela IA deverá tornar pequeno qualquer custo real decorrente de medidas regulatórias dado o ganho de produtividade que a tecnologia trará.

“O impacto da IA no mercado de trabalho é insolúvel por medidas regulatórias. Não será possível conter com proibições, taxas e tarifas, os ganhos de produtividade que as empresas querem aplicar. O próprio estado brasileiro está repleto de secretarias de transformação digital, em todos os âmbitos. União, estados, municípios e estatais também buscam ampliar a própria eficiência com uso dessas tecnologias”, afirma Almendra.

Quem vai fiscalizar a inteligência artificial?

Apesar da celebração do novo Marco Legal, caberá às agências reguladoras fiscalizar o cumprimento da nova legislação no ambiente digital, o que ainda gera uma série de dúvidas acerca da capacidade dessa fiscalização.

“Isso demanda a disponibilidade de recursos humanos, financeiros e tecnológicos necessários para monitorar e garantir a conformidade”, afirma Nunes.

O advogado também destaca a necessidade da atualização constante das normas a modo de se adaptar à rápida evolução da tecnologia.

“Isso porque a regulação de tecnologia, sem acompanhamento e constante modernização, faz com que rapidamente se torne obsoleta. Para tanto, a regulação deve ser flexível o suficiente para se adaptar às rápidas mudanças tecnológicas e às novas aplicações de IA, exigindo atualizações periódicas para manter sua relevância e eficácia”, completa Samuel Nunes.

Vinícius Pereira, repórter freelancer do JOTA