Entrevista: ‘Ruídos de Donald Trump pioram cenário para o Brasil’, analisa Moody’s

'A gente está voando um pouco sem instrumentos agora', disse o diretor geral da agência no País, Carlos Prates, em entrevista para a Inteligência Financeira

A ruidosa estreia do governo de Donald Trump, nos Estados Unidos, desmonta o otimismo para o cenário econômico global de 2025, especialmente para mercados emergentes. O recado é do diretor-geral da Moody’s no Brasil, Carlos Prates.

Entrevista exclusiva
Confira entrevista em vídeo com o diretor da Moody’s no Brasil na próxima segunda-feira.

Aumento de tarifas sobre importação dentre outras medidas prometidas pelo republicano são parte de uma agenda que terá como consequência maiores incertezas globais e, por derivação, volatilidade nos mercados.

Para o Brasil, que já enfrentava o pessimismo dos investidores diante da questão fiscal, isso tudo enfraquece as previsões de que o País faria um pouso suave da economia, enquanto se ocupava de controlar a pressão inflacionária e recuperar um desejável ciclo de corte de juros.

“Quando a gente terminou o ano passado, a gente imaginava que o juro americano ia cair mais”, disse Prates à Inteligência Financeira. “Isso era algo que podia ser transformacional para os mercados emergentes.

“Se você passa a ter toda essa quantidade de ruído, todas essas novas informações precisam ser incorporadas”, acrescentou o diretor da Moody’s. “A gente está voando um pouco sem instrumentos agora.”

Alteração de tom desde a mudança de rating do Brasil

Os comentários de Prates ilustram uma visão diferente daquela usada pela Moody’s, em outubro passado, quando elevou a nota de crédito soberana do Brasil, de Ba2 para Ba1.

Além disso, a agência manteve a perspectiva positiva. Na prática, isso significa uma boa chance de nova alta que, se confirmada, levaria o Brasil de volta ao grupo dos emissores de baixo risco, condição perdida há uma década.

A decisão criou polêmica, uma vez que aconteceu no momento em que a maioria dos profissionais do mercado enxergava uma deterioração da economia brasileira.

Prates explicou que não cuida do rating soberano do Brasil. Por política da Moody’s essas análises acontecem fora do País para garantir maior isenção.

Oficialmente, a agência não fez nenhum pronunciamento oficial sobre a nota do País desde seu anúncio de outubro.

PIB potencial do Brasil cresceu após reformas, diz Moody’s

O executivo explicou que o aparente descasamento entre a visão da agência e as análises de bancos e corretoras, por exemplo, é o horizonte.

Assim, a Moody’s toma como referência um cenário de alguns anos para identificar tendências.

Nesse sentido, na decisão de 2024 a instituição levou em conta os efeitos de reformas feitas no País desde 2017, como a trabalhista, durante o governo de Michel Temer.

Dessa forma, disse Prates, as decisões sobre rating não devem ser confundidas como uma espécie de aval a políticas do governo corrente.

Ou seja, os ganhos obtidos pelo País como efeito das reformas vêm atravessando diferentes gestões.

Dessa forma, a Moody’s concluiu que o chamado crescimento potencial do Brasil – aquele em que um país cresce sem gerar inflação – aumentou.

“As evidências que a gente tem é que as reformas tiveram um efeito no PIB potencial maior do que a gente imaginava”, afirmou Prates.

“Portanto, estruturalmente, o Brasil parece ter condições de crescer mais”, disse ele.

O executivo ressalvou que a Moody’s considera o aspecto fiscal importante, mas dentro de um contexto.

Segundo ele, a agência leva em conta cerca de 200 critérios para tomadas de decisão.

Dessa forma, alguns ingredientes mais negativos no momento, como os juros mais altos, tenderiam a voltar ao normal uma vez que o Banco Central manifeste compromisso em perseguir a meta de inflação.

Cenário para emissões de empresas também piora, diz Moody’s

Uma consequência do cenário mais instável nos mercados, segundo Prates, é a tendência de as empresas preferirem esperar as coisas acalmarem antes de captar recursos para investimentos.

Isso já vem acontecendo no mercado doméstico, uma vez que a Selic subiu de 10,5% para 12,25% ao ano.

E a expectativa do mercado é de que a taxa básica vai subir mais, superando 15% ao longo de 2025.

“Com juro a 15%, o projeto tem que ser à prova de bala para você conseguir colocar de pé”, disse Prates.

O diretor da Moody’s admitiu que, nesse cenário, a tendência é um aumento da pressão sobre os ratings de algumas empresas.

“Mas a gente não trabalha com a possibilidade de aumentos monstruosos dos níveis de default (calote)”, disse.

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