Brasil é solução para os EUA e Trump está mais experiente, diz Alckmin

Em entrevista ao Valor, Alckmin, disse ver uma “avenida” de oportunidades em áreas como energia renovável, minerais críticos, infraestrutura e semicondutores

O Brasil é “solução” para os Estados Unidos em termos comerciais, disse o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic), Geraldo Alckmin.

O novo ocupante da Casa Branca disse em dezembro que o Brasil é um dos países que “cobram muito” dos Estados Unidos em termos comerciais.

Para Alckmin, há uma “avenida” para fortalecimento do comércio entre as duas partes, em áreas como energia renovável, minerais críticos, infraestrutura e semicondutores.

Além disso, afirma que Trump está mais “experiente”, o que pode fazer inclusive com que o presidente eleito adote uma política migratória menos radical.

Confira a entrevista:

Valor: Após a eleição de Trump, o senhor disse que o comércio entre Brasil e EUA tinha tudo para crescer. Por que acredita nisso?

Alckmin: O crescimento do fluxo de comércio entre as duas partes está batendo recorde.

No ano passado, ela chegou a quase 80 bilhões de dólares, e é superavitária para os Estados Unidos.

Nós compramos mais do que vendemos para lá. Somos solução para eles. Eles são o maior investidor do Brasil, é uma amizade que tem 200 anos.

Valor: Mas, em dezembro, Trump citou o Brasil como um dos países que “cobram muito” dos Estados Unidos. Isso não preocupa?

Alckmin: O Brasil não tem imposto de importação tão elevado. Os Estados Unidos vendem muito mais para nós do que nós vendemos para eles.

Então, na realidade, não há problema no Brasil. É uma balança comercial que cresce dos dois lados, e é importantíssima para nós porque é diversificada e de alto valor agregado.

Eu destacaria olhar para o futuro.

Temos oportunidades muito positivas em várias áreas de ponta para dar um salto de qualidade na relação comercial: inteligência artificial, energia renovável, minerais críticos, infraestrutura, tecnologia da informação, semicondutores.

Temos uma avenida de possibilidades de parceria. Cada um tem uma vantagem comparativa, e se faz um entendimento para os dois crescerem.

Valor: Mas o governo brasileiro pensa em alguma estratégia específica para lidar em termos comerciais com o governo Trump no segundo mandato?

Alckmin: Sim. O presidente Lula é um homem do diálogo. Aliás, já governou com o Partido Republicano nos Estados Unidos, com o Bush filho, e teve uma boa relação.

É preciso separar relações de Estado das questões partidárias. Então nós vamos trabalhar para fortalecer a relação.

Mundo se tornou mais protecionista, admite Alckmin

Valor: O senhor destacou a importância da “recomposição tarifária” para manter a competitividade da indústria nacional, afirmando que “o mundo se fecha”.

Isso não é negativo para o comércio mundial?

Alckmin: Você vive momentos, né? Depois da Segunda Guerra Mundial, houve uma enorme globalização.

Depois da Covid, isso mudou um pouco porque, de repente, você não consegue fabricar o carro, se faltou uma peça, um chip.

Então, a globalização continua, mas tem um novo princípio da precaução. No mundo inteiro, há preocupação dos países em defender as suas empresas e os seus empregos.

Existem ciclos de mais abertura, de maior proteção. Nós somos muito cautelosos no sentido da questão tarifária.

Tanto é que, quando aumentamos o Imposto de Importação para salvar as empresas na área de siderurgia, fizemos uma cota.

Só aumentava o Imposto de Importação se as compras extrapolassem uma determinada cota.

No caso da indústria química, teve o Regime Especial da Indústria Química, para melhorar a competitividade. A gente em sido muito cauteloso.

Brasil quer ampliar comércio, diz Alckmin

Valor: Mas há temores sobre possíveis impactos indiretos do governo Trump sobre o comércio brasileiro?

Mesmo que ele não aumente tarifas para o Brasil, as tensões comerciais não poderão crescer?

Alckmin: Temos que aguardar a posse ver o que efetivamente vai ocorrer. Agora não há dúvidas de que houve uma mudança pós-Covid no mundo, no sentido de procurar fortalecer um pouco a indústria local.

Mas a disposição do Brasil é para o comércio.

Temos 2% do Produto Interno Bruto (PIB) do mundo, então 98% do comércio está fora do Brasil. Por isso, o comércio é fundamental.

Os países que mais crescem no mundo têm no comércio exterior uma força muito grande. Então, o presidente Lula avançou, a Bolívia entrou no Mercosul, o quinto país do bloco.

Fizemos acordo o Mercosul-Singapura, agora o acordo Mercosul-União Europeia, o maior do mundo, e estamos avançando no acordo com o Efta (área de livre comércio formada por Suíça, Noruega, Islândia e Liechtenstein), que também é importante.

Vamos fechar até o fim do ano a entrada das importações no Portal Único de comércio.

Então, desburocratizar, facilitar, reduzir custo é o que estamos fazendo permanentemente.

E a reforma tributária ajudará muito, porque desonera totalmente a exportação.

Imigração ajuda no crescimento, defende vice-presidente

Valor: O ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro, disse que, se os Estados Unidos brigarem com a China em termos comerciais, há espaço para o Brasil avançar no mercado chinês. O senhor concorda com essa avaliação?

Alckmin: Sim, no caso de alimentos em especial, porque a China precisa comprar.

O Brasil é hoje o grande protagonista nos três grandes temas planetários: segurança alimentar, segurança energética e clima.

E finalmente uma palavra sobre a questão migratória. A migração, muitas vezes, ajuda o país.

O Estado de São Paulo, que era pequeno dois séculos atrás, hoje tem um PIB do tamanho da Argentina.

A migração fez diferença. A presença migratória no Estado impulsionou a economia.

O presidente Trump é experiente, assume pela segunda vez, e a experiência faz diferença, ajuda.

Então, vamos aguardar, mas acho que nós teremos aí muitas oportunidades.

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