Após “boom”, agtechs devem encarar fase de consolidação

Segundo especialistas, startups bem-sucedidas devem apresentar soluções de fácil uso

Quase 1,6 mil startups oferecem soluções para o agronegócio no país, seja antes, dentro ou depois da porteira, segundo o último censo da Radar AgTech, realizado no ciclo 2020/21. Mas o ritmo de expansão pode ser freado por um acentuado movimento de fusões e aquisições nos próximos anos, afirma Almir Silva, diretor de Digital, Novos Modelos de Negócio e Excelência Comercial na América Latina da Basf, que tem sob seu guarda-chuva o Agrostart, programa de inovação aberta da multinacional alemã do setor de químicos.

O executivo lembra que as fintechs trilharam um caminho semelhante. Mas, no caso das agtechs, a necessidade do produtor rural de ter plataformas que unifiquem as tecnologias e facilitem o acesso deve colaborar para aprofundar a tendência. Outra possibilidade, segundo ele, é que as empresas estabeleçam um número maior de acordos de cooperação, compartilhando dados.

O “boom” de startups do agro começou em 2017, segundo o CEO do hub AgTechGarage, José Augusto Tomé, e durou até o ano passado, quando as empresas começaram a “maturar”. No geral, os índices de desempenho das empresas acompanhadas pelo hub são positivos: 42% estão em fase de escala; 2% estão como produto pronto para entrar no mercado; e 80% já têm clientes.

Assim como tartarugas recém-nascidas na praia, as startups precisam correr muito para chegar ao mar. Cerca de 25% das empresas fecham já no primeiro ano de funcionamento, conforme estudo do Núcleo de Inovação e Empreendedorismo da Fundação Dom Cabral. Das que conseguem emergir, metade não sobrevive por mais de quatro anos.

Muitas vezes as agtechs enfrentam ainda mais dificuldades que em outros setores, por conta das particularidades do campo. Entusiasta da inovação para o agro, Silva calcula que as agtechs levam de três a quatro anos até atingir a maturidade e alcançar bons números de clientes e faturamento, além de atrair investimentos. Por isso, afirma ele, desistir cedo demais é um dos principais erros de quem quer empreender no segmento.

Ex-CEO da Solinftec, o empresário Rodrigo Iafelice tem investimentos em sete startups ligadas ao agronegócio, mas mantém um tom crítico. Para ele, está na moda a criação de soluções que não têm aderência ao mercado e não trabalham dores reais do setor. “É o mesmo problema de sempre, que não está se resolvendo: pessoas de tecnologia que não gastam tempo com o que criaram”, diz.

Segundo Iafelice, foi-se o tempo em que o produtor rural era avesso a tecnologias.“Pesquisas mostram que 97% dos agricultores e pecuaristas utilizam o WhatsApp diariamente e investem milhões de reais em máquinas e insumos todos os anos”. Daí porque o investidor é taxativo: o que existe, de acordo com ele, “é uma distância muito grande entre o que é desenvolvido e o que é realmente necessário no campo”.

Silva, da Basf, afirma que tecnologias desenvolvidas com a ajuda de agricultores, em testes antes do lançamento comercial, tendem a ter mais sucesso do que aquelas que nascem apenas nos escritórios. “O empreendedor não pode subestimar a capacidade de pensamento e tomada de decisão do agricultor”, afirma.

Quem quer trilhar o caminho do sucesso precisa segmentar, de acordo com Iafelice. O diretor da múlti alemã concorda: é preciso definir bem o público alvo, porque a produção agrícola tem realidades distintas no Cerrado e no Sul do país, porexemplo. “Fazer tudo para todo mundo é impossível”, afirma Almir Silva.

Os especialistas defendem também que as soluções sejam de fácil uso, respeitando as diferentes realidades de tecnificação do agro, e que as empresas invistam no pós-venda. Segundo eles, é preciso orientar o produtor para que ele extraia todo opotencial da tecnologia e identifique seu retorno econômico.

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