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Análise: Discussão fiscal para 2023 não deveria se limitar à PEC e precisa incluir receita
As discussões sobre como viabilizar a recomposição do orçamento para 2023 e a manutenção do Auxílio Brasil em R$ 600 ganharam tração nos últimos dias. A PEC para liberar o gasto extra em 2023 ainda não foi apresentada, mas a balança estava pendendo para um valor da ordem de R$ 175 bilhões, que basicamente seria a retirada de todo o programa social do teto de gastos (sem mexer no total desse limite).
Com isso, seria permitido um remanejamento de cerca de R$ 105 bilhões em despesas no orçamento para recompor rubricas como saúde, educação, investimentos e também para um reajuste do salário mínimo para R$ 1.320.
Ainda há movimentos para puxar o valor da PEC para baixo. Mesmo entre integrantes da aliança do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva, interlocutores apontam nos bastidores que um número entre R$ 130 bilhões e R$ 150 bilhões conseguiria dar conta de resolver em grande medida a maior parte das promessas de curto prazo de Lula, dando um sinal fiscal melhor do que os R$ 175 bilhões a R$ 200 bilhões que têm sido mencionados.
Um elemento adicional, que causou preocupações no mercado financeiro, é a possibilidade de a retirada do Auxílio Brasil (ou Bolsa Família, como já chamam os petistas) ser colocada já por quatro anos. Dessa forma, a abertura de espaço de R$ 175 bilhões seria para todo o governo.
Essa ideia de fato existe, embora não esteja sacramentada. O mais sensato seria que o processo de negociação atual fosse de fato tratado como emergencial e que para os anos seguintes o montante de gastos seja resolvido em combinação com um arcabouço fiscal mais definitivo, já sinalizando para a trajetória fiscal de longo prazo.
Seja como for, está claro que há uma pressão sobre o resultado primário (receitas menos despesas) para o próximo ano. Em um ambiente de juros mais altos, a dívida promete dar um salto. Segundo a mediana das projeções do mercado na pesquisa Focus, o principal indicador fiscal está previsto para subir de 77,8% neste ano para 81,3% do PIB em 2023, considerando um cenário de déficit primário de 0,5% do PIB no ano que vem.
Esse saldo negativo das contas públicas é mais ou menos o que está previsto na peça orçamentária que está sendo rediscutida no Congresso. Para além da incerteza sobre o gasto, que pode empurrar esse déficit e a dívida para níveis maiores do que estão na conta do mercado apurada pelo BC, há também dúvidas sobre o cenário de receita.
E essa é uma variável importante para se começar a olhar e que já entrou no radar de quem está na transição. Ela fará bastante diferença para o tamanho do rombo fiscal.
No PLOA de 2023, a receita líquida (que desconta as transferências a estados e municípios) da União está prevista para cair de 19% para 17% do PIB. É um tombo relevante.
Na visão do coordenador do observatório fiscal do FGV Ibre e ex-secretário de política econômica do Ministério da Fazenda, Manoel Pires, a previsão enviada ao Congresso é, acertadamente, conservadora. Para ele, contudo, um cenário de queda tão grande no nível de receita não tende a se concretizar. E, se o recuo for metade do que está previsto (em torno de 1% do PIB, ou pouco mais de R$ 100 bilhões), parte importante do gasto extra (senão todo, a depender do valor final) em discussão na PEC já estará financiado.
Nesse sentido, avalia Pires, o déficit pode até ser maior do que o projetado no PLOA, mas pode não ter uma disparada como as primeiras impressões das discussões da PEC apontariam.
O economista-sênior da LCA Consultores e pesquisador do FGV Ibre, Bráulio Borges, tem olhado no detalhe a questão da arrecadação. Ele aponta que a arrecadação tem um sinal bastante negativo para o ano que vem, principalmente por conta de questões como o preço do petróleo e outras commodities, reduções de tributos, além de um PIB menor do que se está estimando. Só de receitas de petróleo, ele avalia que as perdas serão da ordem de R$ 60 bilhões.
Nesse ambiente, Borges trabalha com um cenário de déficit primário entre 1% e 1,5% do PIB, levando em conta um “waiver” de gastos de R$ 150 bilhões. O número assusta mais quando se considera que o país está fechando este ano com um superávit primário e queda na dívida.
O lado da receita não pode ser negligenciado na questão fiscal. Dessa forma, apesar das sinalizações de que tenderia a manter a desoneração de PIS/Cofins sobre combustíveis, já se houve aqui e ali algum flerte com a ideia de não manter essa medida para 2023. Revertendo só para a gasolina seriam R$ 34,3 bilhões extras para o caixa do governo.
Se houver maior folga do preço do petróleo e do câmbio, a nova administração não deveria titubear em reverter essa medida, o que já seria uma boa ajuda para as contas públicas. Outras desonerações podem e devem ser repensadas e a prudência recomenda que de fato a ideia de corrigir a tabela do Imposto de Renda fique para ser discutida junto com a reforma tributária, valendo só a partir de 2024.
(Por Fabio Graner, analista de economia do JOTA em Brasília)
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