Análise: B3 faz revisão de mais dados e mercado teme estar dirigindo no escuro
A B3 fez, no fim da tarde de sexta-feira, uma revisão adicional dos dados referentes ao fluxo de estrangeiros na bolsa, contemplando agora 2020, 2021 e as ofertas de ações. Os saldos do mercado secundário neste ano haviam sido revisados em abril, quando a companhia detectou um erro na metodologia que usava.
Causou perplexidade no mercado não exatamente o erro, mas o tamanho dele. No caso de 2021, o saldo de investimentos estrangeiros na bolsa passou de uma entrada de R$ 72 bilhões para uma saída de R$ 7 bilhões. Com isso, a revisão colocou em xeque a narrativa de alguns analistas, gestores e influenciadores financeiros de que, se os gringos estavam vindo, era hora de comprar – afinal, bobos somo nós, não eles.
A explicação da bolsa é que as operações de empréstimo de ações foram retiradas do cálculo, já que não envolvem aportes financeiro. No caso das ofertas de ações, a B3 deixou de considerar as informações dos anúncios de encerramento, cujo prazo legal é de até seis meses após as operações e passou a usar os dados de liquidação de IPOs (ofertas iniciais) e “follow-ons” (de empresas já listadas) nos sistemas da bolsa, o que ocorre em D+2 (dois dias após a oferta). A alteração dá mais tempestividade aos dados e reduz inconsistências, segundo a B3, o que é positivo.
É verdade que esse é um jogo de soma zero. O volume que diminuiu para estrangeiros aumentou para pessoas físicas e institucionais. Não muda a quantidade de dinheiro que circulou pela bolsa, o que atenua o problema.
Mas também é verdade que a B3 é a maior provedora de informações sobre o mercado acionário brasileiro. Nem poderia ser diferente, já que ela é a praça por excelência para as negociações de ações no Brasil. Portanto, confiar nos dados que ela divulga é crucial para os investidores, que se apoiam neles para suas estratégias. Não por acaso, a revisão de abril e a continuação de agora deram voz àqueles que defendem que deveria haver mais concorrência no mercado de renda variável.
Forjada entre fusões e aquisições, a B3 é uma instituição centenária e fruto de uma junção de sistemas. Muitos deles vêm de uma época em que os dados eram mais para consumo interno e fontes que conhecem a bolsa por dentro dizem que alguns não se cruzam, já que isso não era tão necessário antes.
Só que, como se sabe, uma boa gestão de dados é crucial no mercado de hoje.
Não por acaso, a B3 anunciou neste mês um acordo com Microsoft e Oracle para migrar seus sistemas e plataformas para a nuvem ao longo dos próximos anos. O acordo também prevê uma troca de experiências com o objetivo de desenvolver novos produtos e seviços a partir da base riquíssima de informações que a bolsa tem. A medida é positiva para os investidores, mas é preciso ficar claro se as revisões pararam por aí.
Por Talita Moreira, Valor — São Paulo
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