Diferença na revisão de fluxo estrangeiro na B3 surpreende

Números refletem mudanças na metodologia de cálculo dos volumes nas ofertas

A B3 fez, no fim da tarde de sexta-feira, uma revisão adicional dos dados referentes ao fluxo de estrangeiros na bolsa, contemplando agora 2020, 2021 e as ofertas de ações. Os saldos do mercado secundário neste ano haviam sido revisados em abril, quando a companhia detectou um erro na metodologia que usava anteriormente.

Causou perplexidade no mercado não exatamente o erro, mas o tamanho dele. No caso de 2021, o saldo de investimentos estrangeiros na bolsa passou de uma entrada de R$ 72 bilhões para uma saída de R$ 7 bilhões. Com isso, a revisão colocou em xeque a narrativa de alguns analistas, gestores e influenciadores financeiros de que, se o capital externo estava vindo, era hora de comprar.

“Se fosse pouco, mas foi muita diferença”, diz um gestor de recursos, classificando o furo estatístico como “surreal”. Um executivo de educação financeira afirma que o saldo negativo do capital externo é mais coerente com o desempenho do Ibovespa no ano passado – quando houve um recuo de 11,8%. “É a lei da mão invisível: como entrou dinheiro se a bolsa caiu?” Ele diz ser algo sério, mas viu com bons olhos o reconhecimento do erro e a correção da rota.

A explicação da bolsa é que as operações de empréstimo de ações foram retiradas do cálculo, já que não envolvem aporte financeiro. No caso das ofertas de ações, a B3 deixou de considerar as informações dos anúncios de encerramento, cujo prazo legal é de até seis meses após as operações e passou a usar os dados de liquidação de IPOs (ofertas iniciais) e “follow-ons” (subsequentes) nos sistemas da bolsa, o que ocorre em D+2 (dois dias após a oferta), disse Luís Kondic, diretor executivo de produtos da B3. “Agora, os dados poderão conciliar movimentos do mercado primário com o secundário.”

É verdade que esse é um jogo de soma zero. O volume que diminuiu para estrangeiros aumentou para pessoas físicas e institucionais. Não muda a quantidade de dinheiro que circulou pela bolsa.

Mas também é verdade que a B3 é a maior provedora de informações do mercado acionário brasileiro. Nem poderia ser diferente, já que é a praça por excelência para as negociações de ações no Brasil. Portanto, confiar nos dados que divulga é crucial para os investidores, que se apoiam neles para suas estratégias. Não por acaso, a revisão de abril e a continuação de agora deram voz àqueles que defendem que deveria haver mais concorrência no mercado.

Forjada entre fusões e aquisições, a B3 é uma instituição centenária e fruto da junção de sistemas. Muitos são de uma época em que os dados eram mais para consumo interno e fontes que conhecem a bolsa por dentro dizem que alguns não se cruzam, já que isso não era tão necessário antes.

Não por acaso, a B3 anunciou neste mês um acordo com Microsoft e Oracle para migrar seus sistemas e plataformas para a nuvem ao longo dos próximos anos. O acordo também prevê uma troca de experiências com o objetivo de desenvolver novos produtos e serviços a partir da base riquíssima de informações que a bolsa tem. A medida é positiva para os investidores, mas é preciso ficar claro se as revisões pararam por aí.

Na sexta-feira, a B3 deu uma explicação adicional sobre a revisão de dados de fluxo estrangeiro e. divulgou as estatísticas de 2020 e 2021, que ainda não tinham sido atualizadas, além da mudança na metodologia do cálculo do capital externo em IPOs e follow ons.

Depois de o fluxo estrangeiro encostar nos R$ 100 bilhões no primeiro trimestre, a B3 fez uma revisão no começo de abril, ressaltando que as estatísticas de 2020, 2021 e 2022 incluíram operações de empréstimos de ações, que não constituem fluxo financeiro. A adição dos dados de operações de empréstimos se deu a partir de outubro de 2020. Faltava ainda corrigir os números de 2020 e 2021.

No caso de 2020, o saldo do capital externo foi revisado para R$ 39,7 bilhões negativos, ante os – R$ 31,4 bilhões anteriores.

O dado do saldo de estrangeiros no mercado primário de IPOs de 2022 foi revisado de R$ 3 bilhões para R$ 3,7 bilhões. Para 2021, foi de R$ 31,6 bilhões para R$ 48,7 bilhões. Para 2020, o dado de IPOs e follow-ons saiu de R$ 29,2 bilhões para R$ 40,36 bilhões.

Com isso, o saldo total de 2022 em IPOs e follow-ons do estrangeiro saiu de R$ 94,2 bilhões para R$ 67,8 bilhões. O de 2021, de R$ 102,3 bilhões para R$ 41,5 bilhões, e o de 2020, de R$ 2,6 bilhões negativos para R$ 700 milhões.

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