Análise: Os desafios que Jean Paul Prates vai enfrentar como presidente da Petrobras

Novo dirigente da petrolífera encontra uma empresa muito menor, em termos de tamanho de investimentos e funcionários, mas também menos endividada

Empresas citadas na reportagem:

Ao assumir o cargo de presidente da Petrobras nesta quinta-feira, Jean Paul Prates encontra uma companhia muito diferente da última vez que em o PT esteve no governo. O indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a estatal tem a missão imediata de lidar com temas sensíveis, como a alta global dos preços de combustíveis e seus reflexos sobre o mercado doméstico.

Prates vai precisar também enfrentar grandes questões internacionais, como a transição energética e os desafios das companhias de petróleo de se adaptar a um mundo com menos emissões de gases poluentes.

Prates encontra uma empresa muito menor, em termos de tamanho de investimentos e funcionários, mas também menos endividada.

Em 2016, último ano do governo Dilma Rousseff, a Petrobras tinha 68.829 funcionários, com intenção de investir, em média, US$ 19 bilhões por ano e uma dívida bruta de US$ 123,9 bilhões em junho daquele ano, no último trimestre antes de a ex-presidente deixar o governo.

Agora, a empresa tem 45.532 empregados, com um plano médio de investimentos anuais de US$ 15,6 bilhões e um endividamento de US$ 54,3 bilhões, segundo os dados mais recentes divulgados.

Veja a seguir alguns dos principais temas a serem enfrentados pelo novo CEO da Petrobras:

Preços de combustíveis

A Petrobras hoje segue o preço de paridade de importação (PPI) para definir as cotações dos combustíveis produzidos nas refinarias e vendidos às distribuidoras. Esse mecanismo de precificação é criticado por integrantes do atual governo, por repassar aos consumidores as volatilidades do preço do barril de petróleo no mercado global.

No governo de Dilma Rousseff, a Petrobras chegou a vender combustíveis no Brasil abaixo do preço internacional, o que levou a prejuízos bilionários e prejudicou a importação por outras empresas.

Prates afirmou este mês que não vai haver interferência nos preços de mercado. As decisões sobre reajustes nos preços dos combustíveis são tomadas pelo presidente da companhia, em conjunto com o diretor de comercialização e logística e com o diretor financeiro e de relacionamento com investidores, além de ser supervisionada pelo conselho de administração.

Fontes que estiveram com Prates nos últimos meses dizem que o executivo deve buscar uma maneira de evitar repassar a volatilidade aos consumidores, mas sem que a Petrobras pratique preços abaixo do mercado. A tendência é que uma solução do tipo seja conversada com órgãos reguladores e outros atores do setor e seja definida pela Agência Nacional do Petróleo (ANP).

No mandato como senador, Prates foi relator do projeto de lei 1472, de 2021, que prevê a criação da Conta de Estabilização de Preços (CEP-Combustíveis). A ideia é criar um fundo que seria abastecido por dividendos da Petrobras, royalties e bônus de exploração e produção de petróleo, de modo a atenuar aumentos nos combustíveis no mercado interno quando houver alta no preço internacional do barril de petróleo. Ainda não há clareza, no entanto, de como esse mecanismo funcionaria, na prática.

Transição energética

A transição para uma economia de baixo carbono para enfrentar o aquecimento global é um desafio mundial. As grandes companhias de petróleo têm investido em projetos de energias renováveis e em tecnologias para evitar emissões. A Petrobras recebe críticas pela baixa presença nas fontes renováveis.

Mudanças nesse sentido foram sinalizadas pelo governo Lula, que deu sinais de que quer investir mais em renováveis e transformar a Petrobras em uma empresa integrada de energia. Prates, inclusive, é um entusiasta da tecnologia de geração eólica no mar (offshore) e foi autor no Senado do projeto de lei 576/2021, que buscou estabelecer um marco regulatório para as eólicas offshore. Ainda não existem projetos dessa fonte no Brasil.

Uma das primeiras medidas esperadas é a criação da diretoria-executiva de transição energética e descarbonização, que será ocupada pelo ex-presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim.

O plano de negócios da Petrobras para os anos de 2023 a 2027, elaborado ainda no governo anterior, determina as áreas em que a companhia vai focar na transição, que são os segmentos de geração de energia eólica em alto-mar (offshore), hidrogênio e captura de carbono, além de reforçar investimentos em curso no biorefino de produção de combustíveis de menor emissão. Entretanto, ainda não há valores de investimentos concretos definidos para a maior parte dessas áreas. Na transição de governo, a equipe de Minas e Energia sinalizou que vai rever o plano para ampliar investimentos em renováveis.

Venda de ativos

Desde 2016, a Petrobras conduz um amplo programa de desinvestimentos, que visa a ajudar a empresa a se recuperar do alto endividamento e a focar nos ativos em que tem maior competitividade, notadamente na exploração e produção de petróleo e gás natural em águas profundas.

As vendas de projetos aceleraram no governo de Jair Bolsonaro. Segundo cálculos da Federação Única dos Petroleiros (FUP), a estatal privatizou 64 ativos de 2019 a 2022. O programa de desinvestimentos também é alvo de críticas do PT, que considera que a companhia precisa ser uma indutora de investimentos no setor de energia no país.

A equipe de transição do governo sinalizou que vai interromper as vendas. Ainda não se sabe o que vai ocorrer com os ativos com contratos assinados, mas que não tiveram a transferência concluída.

É importante notar que a estatal tem dois Termos de Compromisso de Cessação (TCC) assinados com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para a abertura dos mercados de refino e de gás natural, mas nem todos os ativos que tiveram a venda determinada por esse compromisso foram desinvestidos até o momento.

A situação mais incerta é a das refinarias. A estatal se comprometeu a vender oito unidades, ao todo, mas concluiu a venda de apenas três, caso da Refinaria de Mataripe (antiga Landulpho Alves, a Rlam) na Bahia; a Reman no Amazonas; e a SIX no Paraná. A Lubnor, no Ceará, teve o processo de venda para a Grepar assinado, mas, segundo a estatal, a conclusão dessa operação ainda está sujeita ao cumprimento de condições precedentes.

Dividendos

Em 2022, a distribuição aos acionistas da Petrobras teve um forte aumento em relação aos anos anteriores. O governo do PT indicou que pretende reduzir a distribuição aos acionistas para ampliar os investimentos da estatal.

Este mês, o executivo Guilherme Estrella, que foi diretor da Petrobras nos governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, pediu ao Tribunal de Contas da União (TCU) para que suspendesse um pagamento aos acionistas aprovado no ano passado e marcado para janeiro. A distribuição de dividendos, entretanto, ocorreu normalmente.

Ao todo, o conselho de administração da Petrobras aprovou a distribuição de R$ 179,9 bilhões em dividendos referentes aos três trimestres de 2022 que tiveram os resultados divulgados. Desse total, R$ 80 bilhões vão para o grupo de controle da estatal, que inclui União Federal, BNDES, BNDESPar, o Fundo de Participação Social e a Caixa Econômica Federal.

Os pagamentos aos acionistas costumam ser divulgados no mesmo dia da publicação de resultados. A divulgação do balanço do quarto trimestre de 2022 está marcada para 1º de março e ainda não se sabe se a companhia vai manter a atual política.

O pagamento de dividendos referente a 2021 somou, ao todo, R$ 101,4 bilhões. Em 2020, o valor havia sido de R$ 10,3 bilhões, e em 2019 foi de R$ 10,7 bilhões. A Petrobras ficou sem realizar distribuições aos acionistas entre 2014 e 2017, por causa do alto endividamento, mas o equacionamento da dívida nos últimos anos permitiu o retorno das distribuições.

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