Câmbio busca novo equilíbrio, diz Citi

Para chefe de tesouraria do banco, Fed e desaquecimento chinês ampliam preocupação do mercado

O Brasil se beneficiou de um processo de alocação de recursos neste ano e, não à toa, o dólar chegou a operar brevemente abaixo de R$ 4,60 no início de abril. Com esse contexto em mãos, o chefe de tesouraria do Citi no Brasil, Eduardo Miszputen, avalia que o movimento começou a parecer exagerado e que, em algum momento, poderia haver um novo equilíbrio nos preços. “Os vetores que ajudaram o real permanecem influenciando o mercado, mas uma hora eles começam a encontrar um equilíbrio diferente de preços.”

Já em dezembro, durante apresentação à imprensa sobre as perspectivas para os mercados locais em 2022, Miszputen indicava que o começo do ano poderia ser positivo para o real, na medida em que os juros já estavam em níveis elevados e o Brasil se posicionava de forma positiva para alocação de recursos no começo do ano. “Isso aconteceu e, somada à tendência que nós já enxergávamos, a crise entre Rússia e Ucrânia amplificou um pouco esses fluxos que vieram para o Brasil”, afirma. Ele nota que o Brasil estava distante geograficamente do conflito e era um país que se beneficiaria da alta das commodities.

Ao avaliar o mercado de câmbio no momento, o profissional observa que um novo equilíbrio tende a ser visto, na medida em que as commodities já tiveram algum recuo ou estão se estabilizando. “E ainda temos um cenário de inflação e de taxa de juros nos Estados Unidos mais altas do que se imaginava. Isso leva recursos que estavam em emergentes para o dólar, que vem crescendo de valor em relação a todas as moedas”, aponta.

Ele também lembra que a China, que é consumidora de muitos dos produtos exportados pelo Brasil, tem sofrido com certa instabilidade e gerado preocupações marginais em torno do crescimento global. “Isso traz uma preocupação para o Brasil e já começou a se refletir no mercado, que, duas semanas atrás, estava mais otimista”, diz.

Quando o dólar foi a R$ 4,60, Miszputen nota que alguns clientes corporativos viram oportunidade para pagamento de dívidas e antecipação. “Vimos algum fluxo que mostra já alguma visão desse movimento, mas uma coisa que surpreendeu foi que o investidor institucional ainda estava apostando que o dólar poderia cair mais”, nota.

Assim, nas duas últimas semanas, o Banco Central promoveu duas intervenções no mercado de câmbio. Para Miszputen, a atuação da autoridade monetária “mostra que existia demanda compradora de dólares”. Ele aponta, ainda, que o BC tem sido consistente ao ver um desequilíbrio de compras e vendas e, assim, atuou para suavizar esses desequilíbrios.

Embora o câmbio tenha sido apoiado pela alocação de recursos no Brasil, a participação de investidores estrangeiros no estoque da dívida pública tem caído nos últimos meses, mesmo com níveis de juros bem elevados. Miszputen lembra que os não-residentes se posicionaram ao comprar títulos públicos um pouco cedo e acabaram se desfazendo das posições conforme o Banco Central continuou a elevar a taxa de juros.

“Quando isso acontece, em geral, as pessoas esperam para reler o cenário e definir o momento certo de entrar novamente. Olhando o cenário brasileiro de juros e de inflação, os preços continuam pressionados e a expectativa é de que o BC continue subindo juros”, observa o profissional. Para ele, há, no mercado, uma percepção de que a inflação exibe pressão adicional e que não mostra desaceleração e, assim, o BC, com o objetivo de segurar os preços, não deveria encerrar o ciclo de alta de juros.

“Acho que o investidor está olhando um pouco para isso e esperando o momento certo de entrar. Por isso tem um volume menor de estrangeiro no estoque da dívida, mas é esperado que isso cresça em algum momento”, afirma o chefe da tesouraria do Citi Brasil. Miszputen, contudo, observa que a eleição presidencial pode retardar ou mesmo evitar que alguns players montem posições, já que podem esperar uma definição maior do cenário. “Isso pode acontecer. Ainda está um pouco cedo, mas o efeito da eleição vai se tornar maior”, afirma.

Miszputen observa que, no momento, o mercado tem enxergado a eleição como um evento de baixo risco. “São dois candidatos que não parecem preocupar os mercados do ponto de vista de uma mudança radical na economia. Mas a hora em que começarmos a chegar perto vai gerar ansiedade para saber quem seria o ministro da Economia, por exemplo. Isso vai trazer mais volatilidade”, acredita.

Além do fator de risco eleitoral, Miszputen dá ênfase, em especial, ao aperto da política monetária pelo Federal Reserve (Fed, o banco central americano). Para ele, um dos cenários pode ser o de que a inflação bem mais alta nos Estados Unidos não é temporária, o que pode deixar o mercado preocupado com elevações mais agressivas nos juros à frente.

“Não acho que isso esteja precificado e haveria uma mudança material de bolsa, câmbio no Brasil e nos emergentes como um todo”, diz. Diante da preocupação com a inflação americana, dada a força do mercado de trabalho, e a crise de logística que mantém os preços internacionais elevados e gera inflação global sistêmica, Miszputen avalia que o cenário de juros nos EUA se mostra “menos previsível e, talvez, de muito mais impacto”.

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