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Análise: Como o setor privado e o terceiro setor podem se unir para acelerar o ESG?
Em uma entrevista veiculada no Estadão em abril, o empresário Fábio Alperowitch, fundador e gestor da Fama Investimentos, reitera sua posição crítica sobre a evolução das corporações brasileiras no que se refere aos princípios ESG. Segundo ele, “o ESG no Brasil é extremamente superficial, celebratório, pouco crítico e trata de pouquíssimos assuntos”. Fábio é hoje uma referência nesse quesito, reconhecido como um empresário que defende e propaga a necessidade de avanços das corporações no que se refere aos princípios ESG, propugnando que investidores estabeleçam padrões que respeitam essas premissas para pautar a escolha de onde aportar recursos.
Fábio cita que a onda ESG chegou atrasada no Brasil, em especial se comparamos os padrões atualmente seguidos em países europeus. Tal situação nos coloca em posição de alerta, não apenas para que exista uma aceleração no engajamento de corporações nessa nova modelagem de negócios, mas também por haver um cuidado extremo na exigência de padrões de qualidade que não se limitem a retóricas de pouca expressão, descompromissadas com resultados mais consistentes. Não há como considerar um avanço real tão somente a existência de alguns exemplos pontuais mais evoluídos na agenda ESG. Justamente pelo fato de não haver qualquer possibilidade de resultados em escala sem o engajamento maciço do setor privado no compromisso de adoção desses novos conceitos.
Em nosso país, as demandas de ordem social e ambiental só aumentam, acumulando passivos que representam uma gigantesca ameaça para as atividades econômicas e o bem estar de toda a sociedade. A cobrança por maior engajamento e assimilação de posturas diferenciadas dos processos convencionais nos negócios são fundamentais pelo simples fato de que o conjunto de iniciativas que hoje estão sendo anunciadas pelas corporações não projetam, na prática, suficientes mudanças de cenário.
Uma maior percepção crítica da sociedade pode colaborar de forma determinante para cercear o uso da propaganda que vende uma imagem corporativa, decorrente de ações de cunho social que não correspondem com a realidade. É importante ressaltar que passamos as últimas três décadas praticando um discurso que, a despeito de valiosas exceções, em boa parte, se mostrou evasivo, sob o lema da “sustentabilidade”. A expressão caiu em descrédito justamente pela enorme quantidade de iniciativas inconsistentes, sem aplicação de métricas e abordando frações de uma agenda mais ampla, sequer melhor entendida pelos executivos e investidores. Nessas condições, de excessiva permissividade, torna-se praticamente impossível, em muitos dos casos, uma relação de equilíbrio entre resultados efetivos e o marketing explorado a partir das iniciativas implementadas.
Cabe ressaltar que o posicionamento crítico frente aos desafios de mudanças não invalida a exploração de iniciativas que efetivamente promovam resultados expressivos — e que devem ser amplamente propagadas. Não apenas para garantir louros àqueles que as executam, mas, fundamentalmente, para gerar referências qualificadas a serem seguidas por quem esteja em busca de melhores práticas. A demonização do marketing não se aplica em situações em que ocorram iniciativas pioneiras, inovadoras, que se projetam com a perspectiva de se transformar em verdadeiras políticas públicas, impondo um novo normal, a partir da constatação e extensiva propagação justificada pelo seu sucesso.
Entre os muitos atores que participam dessa empreitada em busca de uma nova modelagem para os negócios, o papel do terceiro setor no apoio à inovação deve ser reconhecido. Sua relevância está na capacidade de aplicar procedimentos que não ocorrem com a mesma dinâmica em ambientes consolidados, estrangulados por regramentos e culturas institucionais que limitam a implantação de mudanças. São os empreendedores sociais que detém capacidades mais próximas das demandas reais da sociedade, até porque o próprio surgimento das instituições do terceiro setor, em geral, está baseado na identificação de lacunas, correspondentes a demandas mal atendidas pelo poder público e pelo setor privado.
Há um valor excepcional nas iniciativas que tem por objetivo o cumprimento de uma missão que não atrelada diretamente à geração de lucro, como convencionalmente os negócios percebem. É instigante observar que o lucro, do ponto de vista do terceiro setor, aproxima-se muito do que se preconiza atualmente às empresas que perseguem princípios ESG, que pretendem incorporar medidas adicionais ao resultado financeiro. Os empreendedores sociais tratam da promoção de mudanças relevantes para toda a sociedade. Iniciativas que promovem impacto social visando atender demandas prioritárias, e que ocorrem a partir da aplicação de novos conceitos e da implementação de ações inovadoras.
Estamos ainda muito distantes de uma condição realmente comprometida com a diminuição dos conflitos e das profundas injustiças que afligem a sociedade brasileira. Avançar na agenda ESG, de forma determinada e comprometida, com a aplicação de práticas que garantam resultados de qualidade apontam para uma oportunidade de maior integração entre o setor privado e o terceiro setor. Até porque pautar princípios de ESG representa uma movimentação das corporações para entender o que significa adotar missões adicionais à busca do lucro, e as aproxima da cultura presente no terceiro setor. Enquanto isso, as ONGs de vanguarda compreendem cada vez mais o seu papel no campo de empreendedorismo social, o que impõe a adoção de muitas características encontradas no setor privado.
(Por Clóvis Borges, diretor-executivo da SPVS – Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental)
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