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Bancos cobram aporte, e ameaça de recuperação judicial da Americanas estremece conversas
Depois de uma reunião tensa com seus credores no início da tarde de sexta-feira, o ex-presidente das Lojas Americanas Sérgio Rial saiu do encontro sem o que foi buscar, que era mais prazo para o pagamento de dívidas. E não só isso: recebeu uma série de exigências, sendo a principal delas uma capitalização imediata por seus controladores, o trio Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira, após a crise desencadeada com um fato relevante que tornou públicas inconsistências de R$ 20 bilhões no balanço. Ouviu as demandas e prometeu soluções.
Chegou a acenar com a possibilidade de os acionistas de referência aportarem US$ 1,2 bilhão. Mas não houve nada firme, e os bancos acharam pouco.
Rial voltou para tratar do assunto com o trio, que agora assessora, e a decisão foi tirar da gaveta uma ação judicial para paralisar qualquer tipo de cobrança. Ficaram de retomar as conversas na segunda-feira. Nenhuma ligação foi feita e o assunto recuperação judicial não foi citado nenhuma vez aos credores, disseram fontes. Como consequência, no final do dia todos os bancos receberam com surpresa a notícia de que a Americanas conseguiu uma liminar na Justiça suspendendo qualquer pagamento de dívidas, declaradas em R$ 40 bilhões. “Eles queriam negociar com jogo rolando. Não funciona”, disse uma fonte que tem acompanhado a crise da varejista. “É uma vergonha”, disse. “Isso mostra o caráter dos caras do 3G”, disse outra fonte, que prometeu não fazer mais negócios com o trio. “Com a gente nunca mais”, deixou claro.
A reunião com os credores foi convocada na quinta-feira, nem 24 horas depois do anúncio dos problemas no balanço. A intenção era falar sobre a situação da empresa, após uma primeira tentativa de explicações conturbada ao mercado, na sede do BTG Pactual, e pedir mais prazo para o pagamento de dívida. O encontro foi voltado especialmente para os times de crédito ao atacado dos bancos, mas algumas instituições financeiras foram representadas por presidentes e acionistas. Todos queriam entender melhor a situação que deixou o mercado de cabelo em pé, após o fato relevante, que fez emergir a crise na empresa e fez com que Rial anunciasse precocemente sua renúncia, poucos dias depois de assumir o cargo.
Assim que Rial pediu suporte aos bancos, segundo fontes que acompanharam o encontro, a reunião já ficou mais tensa, com exigências direcionadas ao executivo, já revertendo a expectativa de que uma renegociação de dívidas seria um processo tranquilo e uma negociação amigável. As próprias instituições financeiras haviam sinalizado que pretendiam rolar as dívidas e que não tinham interesse em puxar o tapete da companhia, algo que teria consequências negativas para todos.
Mas havia uma condição. De cara, os bancos disseram que não haveria espaço para renegociar vencimentos sem que a empresa fosse capitalizada e que um follow-on (oferta subsequente) deveria ser imediatamente anunciada. Também houve uma cobrança, por parte das instituições financeiras, de que os acionistas de referência deveriam estar mais presentes nas negociações. Segundo o Valor apurou, há uma insatisfação, entre os credores, com a postura dos principais acionistas.
“É uma vergonha. Deveriam ter anunciado a oferta já no fato relevante (que foi divulgado na quarta-feira tornando pública a incongruência contábil”, disse uma fonte, que estima que a oferta deverá ter um volume entre R$ 5 bilhões e R$ 10 bilhões.
Na conversa, Rial foi diretamente questionado sobre o problema contábil. “Foi fraude?”, foi a pergunta imediata, depois do executivo ter evitado esse caminho na reunião com o BTG Pactual, quando disse que ainda não era possível fazer essa acusação e que caberia ao comitê independente que foi instaurado ontem, a tirar essa conclusão. Ao grupo, Rial teria indiretamente deixado subentendido que sim, segundo três interlocutores que participaram da conversa. “Não admitiu, nem rebateu. Mas claramente foi”, disse uma das fontes ouvidas pelo Valor. “Muito se falou sobre o risco sacado, mas a questão é que houve fraude para reduzir a conta fornecedor. As despesas não transitaram para o resultado”, avalia outra fonte, que acompanha o problema de perto.
E essa sinalização teria ajudado a entornar o caldo. Se for mesmo fraude, a leitura foi de que é uma obrigação indiscutível do trio a capitalizar a empresa. Rial teria dito que o compromisso de capitalização está dado. Uma oferta era esperada apara ser anunciada nos próximos dias “já com atraso”. Agora, as insatisfações de como o problema vinha sendo conduzido só cresceram após a ameaça de levar a discussão das dívidas para a Justiça.
Por Fernanda Guimarães, Talita Moreira e Álvaro Campos, do Valor Econômico
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