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‘Não tem milagre’, diz Mario Mesquita, economista-chefe do Itaú, sobre alta acelerada nos juros
Empresas citadas na reportagem:
Os números chamam atenção e podem dizer por si só sobre a realidade atual da economia brasileira. A inflação roda em cerca de 12% nos últimos 12 meses, sem sinais de queda, e a Selic, taxa básica de juros do Brasil, teve o seu 11º aumento seguido, nesta quarta-feira, chegando a 13,25% ao ano.
Mario Mesquita, economista-chefe do Itaú, disse em entrevista exclusiva ao íon que, de fato, a grande preocupação é o nível de inflação e as expectativas em torno do aumento de preços até o fim do ano.
No começo do ano, o cenário era outro: as estimativas de Mesquita apontavam uma desinflação da economia. Ou seja, uma inflação de pouco mais de 10% em 2021 se reduziria pela metade em 2022.
Mas os choques inflacionários continuaram, principalmente pelos impactos inesperados do conflito entre Rússia e Ucrânia.
Hoje, a previsão é de que o IPCA, índice oficial do Brasil, termine o ano em 7,5%, no melhor dos panoramas. O economista diz que há um viés de alta e que há um risco real para a inflação chegar próximo dos dois dígitos, como no ano passado.
E para resolver isso, de forma sustentável, “não tem milagre”, na visão de Mesquita. A política monetária contracionista (subindo juros) é o caminho, segundo o especialista. Confira a entrevista completa:
O quão preocupante é esse cenário para a economia brasileira?
O Banco Central vem subindo os juros de forma vigorosa desde o início de 2021. Fez uma alta expressiva, de 2% para 13,25%. Quando a gente deflaciona isso, considerando os juros reais, a gente vê que o movimento também foi bem forte: a gente salta de 1% ao ano, em 2021, para cerca de 7,5% ao ano, no momento atual.
Essa política monetária vai ter impactos ao longo do tempo e já tem alguns, na verdade, mas eles são cumulativos e tendem a acontecer com uma certa defasagem. Então, a gente espera que esse impacto se intensifique. A gente vê a economia brasileira crescendo algo como 1% em 2022, podendo até surpreender positivamente, mas em 2023 o crescimento deve ser bem menor porque é nessa altura que os efeitos mais intensos da alta de juros vão se materializar.
Mas você considera um quadro preocupante em termos históricos?
O preocupante é a inflação. O índice já foi elevado no ano passado, hoje já gira em torno de 12% (em 12 meses). Para um país que já tem um histórico inflacionário e hábitos de indexação (correção de salários e contratos), há risco de a gente voltar a ter uma economia com uma persistência inflacionária elevada. Isso começa a afetar o comportamento das empresas, das pessoas, dos sindicatos e podemos se ver em um cenário em que a inflação muda de patamar de forma mais permanente. É isso que o Banco Central está combatendo. O problema original é a alta da inflação.
No fim do ano passado, a previsão era de que a inflação poderia chegar até a metade do que foi em 2021. Mas veio a guerra e parece que os efeitos que já vinham acontecendo foram potencializados. Isso vem acontecendo mesmo?
A guerra foi um choque dentro do choque. Já vínhamos com uma inflação pressionada, a política monetária já vinha reagindo desde março do ano passado e havia um cenário preparado para uma redução da inflação. Nesse meio tempo, veio um choque adicional que foi a guerra. Você exclui a produção de Rússia, Ucrânia, Bielorrússia do mercado. No caso da Rússia, é uma grande fonte de matérias primas, ligadas à energia, certos minérios e também de fertilizantes. Então, a exclusão da Rússia das cadeias produtivas levou a um aumento de preços generalizado. Isso piorou o cenário. Quando os preços das Commodities sobem no mundo, também aumentam no Brasil, mais cedo ou mais tarde. Isso adicionou pressão inflacionária.
Qual é o papel do quadro fiscal na questão inflacionária?
Os números fiscais do Brasil até que tem surpreendido positivamente porque tanto a atividade econômica quanto a inflação têm surpreendido para cima. Isso tende a beneficiar as receitas públicas. O impacto do quadro fiscal se manifesta mais via preços de ativos. Se a situação fiscal piora, o prêmio de Risco-Brasil aumenta, o câmbio deprecia e, assim, você tem mais pressão inflacionária. Então, vale ficar bastante de olho nisso, mas, por enquanto, o impacto não se configura como um choque de demanda na inflação.
E sobre os impactos desse cenário no PIB, por que a previsão até pouco tempo atrás era de recessão econômica e agora a estimativa é de leve crescimento? O que mudou?
A gente esperava uma contração de 0,5% e nossa visão mudou. As surpresas começaram no fim do ano passado com o PIB do 4º Trimestre vindo melhor do que o esperado. Basicamente, com um consumo mais forte do que estimávamos por causa da redução da poupança das famílias, de forma geral. Durante a pandemia, as famílias pouparam mais e gastaram no último trimestre para sustentar seu padrão de consumo. A gente teve também aumentos de salários mais intensos, aumento do salário-mínimo, o choque inflacionário nas commodities favorece a atividade econômica no Brasil, além também da liberação do FGTS. Então, foram estímulos que a gente não contava e que ajudam a economia. Por outro lado, a política monetária vem pisando no freio e a gente já percebe desaceleração no crédito, mas os fatores positivos têm prevalecido em relação ao PIB.
A previsão é que o PIB suba 1% em 2022, mas quais fatores podem influenciar tanto para uma recessão econômica ou para um maior crescimento?
A tendência para o PIB está apontando para cima. A questão do consumo das famílias, por exemplo. Se elas resolverem consumir tudo o que elas acumularam de poupança extra durante a pandemia, isso pode levar a um crescimento acima de 1%. Dessa vez, a gente vê um viés positivo.
Isso mesmo com a inflação persistente?
Sim. A inflação atrapalha, mas os salários estão crescendo mais rapidamente. O risco que a gente vê é de ter mais atividade e, portanto, mais inflação do que ter menos atividade e, consequentemente, menos inflação.
Como o Brasil pode sair desse cenário inflacionário de acordo com a sua opinião?
O principal instrumento para influenciar a economia no curto prazo é a política monetária. No século passado, nos anos 1950 e 1960, se acreditava que a política fiscal tinha esse papel. Só que a política fiscal é muito menos ágil porque depende de Congresso, de legislação, é muito mais difícil de se alterar rapidamente. Política monetária você aperta ou relaxa por uma decisão do Copom. Política Fiscal não dá para mudar tão rapidamente. Do ponto de vista de gestão, o instrumento mesmo é a política monetária, não tem milagre. O que pode ajudar? Se o Brasil voltasse a ser o preferido dos investidores internacionais e o real entrasse numa toada de apreciação muito forte, isso ajudaria no front inflacionário, mas não é algo que as autoridades consigam controlar.
*Texto escrito por Leonardo Pinto. Artigo originalmente publicado no Feed de Notícias do íon Itaú. Para ler este e outros conteúdos, acesse ou baixe o app agora mesmo.
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