Davos: Brasil marca presença, especialmente no palco ambiental, mas poderia ir além

País também sinalizou com reformas econômicas, entrada na OCDE, relação com BRICS e a intenção de ampliar presença internacional e sediar a COP30, em 2025

“O saldo foi positivo, mas não houve nada impactante.”

Esta foi a conclusão de especialistas sobre a participação brasileira no Fórum Econômico Mundial, em Davos (Suíça).

O evento, encerrado nesta sexta-feira (20), contou com a participação de chefes de governo, de Estado, empresários, banqueiros e outras lideranças.

Bons discursos, reuniões produtivas, mas nenhuma grande novidade ou compromisso ambicioso com metas.

Durante a última semana, os mercados se voltaram para o evento na Suíça e o Brasil era um dos players mais esperados pela qualificada audiência.

Entre os políticos, foram enviados o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e os governadores, Tarcísio de Freitas, de São Paulo, Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul, e Hélder Barbalho, do Pará.

Como foi a participação do Brasil em Davos?

“O Brasil fez apresentação bastante sólida em Davos, que serviu para apresentar ao mundo o novo posicionamento internacional em algumas agendas, inclusive a ambiental. É fato que não houve grandes anúncios, mas ainda assim serviu para mostrar que o gerenciamento dos assuntos sensíveis passou por uma mudança, que tende a retirar o país da condição de isolamento dos anos de governo Bolsonaro”, afirmou Rodrigo Gallo, coordenador do curso de pós-graduação em Política e Relações Internacionais da FESP-SP.

Do ponto de vista da economia, Juliana Inhasz, coordenadora do curso de graduação em Economia no Insper, afirmou que o Brasil fez uma participação ponderada, dentro do previsível, sem discursos apoteóticos ou grandes propostas, o país mostrou seu cartão de visitas e o compromisso com o meio ambiente, tão cobrado pelos pares internacionais. No entanto, ficou devendo.

“Faltaram respostas, ficou muita coisa no ar. Houve uma tentativa enorme de desqualificar e responsabilizar o governo anterior por coisas que não são exatamente do governo anterior, como o risco fiscal, muito agravado pela PEC da Transição. A situação fiscal herdada não era das melhores, mas acontece com todos os governos”, completou Inhasz.

Investidores globais serão mais pragmáticos

Na mesma linha, o professor e economista da FGV EESP, Joelson Sampaio, afirmou que o esforço feito por parte do governo federal em Davos foi no sentido de se descolar do pensamento do governo Bolsonaro, especialmente no âmbito ambiental, mas que os investidores globais olharão o país de uma forma mais pragmática, além do discurso.

“Os investidores estrangeiros vão esperar para ver os resultados. Mas foi um bom sinal, positivo, a ida dos governadores também foi positiva, especialmente para a captação de investimentos em seus estados, que consequentemente ajudam o Brasil”, completou Sampaio.

Além do ambiental

A participação brasileira também falou para dentro.

Fernando Haddad sinalizou os estudos de uma reforma tributária, falou da intenção de introduzir impostos progressivos, onde o rico paga mais e o pobre não paga, além de citar o avanço nas negociações para ingresso na OCDE, estreitar as relações com os outros membros do BRICS e se candidatar a sediar a COP30, principal evento sobre mudanças climáticas, em Belém do Pará, no ano de 2025.

E por falar em mudança climática, quem não poderia faltar era a ativista climática Greta Thunberg, que quase não compareceu devido à sua prisão na Alemanha dias antes, por protestar contra a reativação de uma mina de carvão.

Thunberg, junto de outras ativistas pelo clima, se reuniu com a ministra Marina Silva, em um encontro “carregado de significado, muito tocante”, segundo a ministra.

Redução de CO2

A ministra afirmou que, durante a reunião com Greta, as cobranças foram pela redução na emissão de CO2, fim do desmatamento, proteção dos povos indígenas, fim do garimpo ilegal, e a preocupação com futuro das próximas gerações.

Rodrigo Gallo afirmou que o papel de Marina Silva foi muito além do ambiental, que já era esperado devido ao seu próprio histórico político e ao direcionamento do novo governo.

“A participação dela sem dúvidas ajuda a destravar investimentos e aumenta a credibilidade, pois sinalizou aos governos europeus que além do meio-ambiente, o Brasil está disposto a investir em cooperação internacional, inclusive sendo uma espécie de porta-voz do Mercosul, que também teve sua imagem desgastada nos últimos anos”, completou Gallo.

No fim das contas, a China dá as cartas

Nas falas sobre a economia global, ficou claro que a retomada da economia chinesa deixa os players mais felizes e agitados do que qualquer promessa no âmbito ecológico.

A diretora-geral do Fundo Monetário Internacional, Kristalina Gueorguieva, afirmou, no último painel do fórum, que as perspectivas para a economia global não estão tão ruins quanto se temia há alguns meses, com a China sendo uma das principais responsáveis por essa mudança no cenário, dada a projeção de crescimento de 4,4% em 2023.

A chefe do FMI afirmou, no entanto, que a Guerra na Ucrânia continua sendo um risco para a confiança econômica, especialmente da Europa.

Já a presidente do Banco Central Europeu, Christine Lagarde, falou do ponto de vista monetário, apontando que a reabertura chinesa deverá provocar pressões inflacionárias e que os bancos centrais terão que manter o aperto iniciado em 2022.

Segundo ela, o BCE continuará elevando os juros até que a inflação da zona do euro seja levada para a meta de 2%.