Revisão da Vida Toda, FGTS e mais: 5 temas que o STF deve julgar em 2024 que afetam seu bolso
Corte também terá de julgar ações sobre a Lei das Estatais e que afetam privatizações da Eletrobras e da Sabesp
O ano Judiciário se encerra na próxima terça-feira (19/12), quando o Supremo Tribunal Federal (STF) fará a última sessão plenária de 2023. Isso significa que diversos processos importantes, que podem ter reflexo no seu bolso, podem ficar para 2024.
Dentre os impasses jurídicos a serem resolvidos, a reportagem elencou 5 temas econômicos que tramitam na Corte nos quais os investidores devem prestar atenção.
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Dentre eles, estão ações que discutem a forma da correção dos rendimentos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) ou mesmo que podem afetar a privatização da Eletrobras e da Sabesp.
Confira:
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Revisão da vida toda
No dia 1 de dezembro de 2022, por 6 votos a 5, os ministros do STF decidiram a favor dos aposentados no julgamento conhecido como ‘revisão da vida toda’ do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
A posição vencedora foi a do relator, ministro aposentado Marco Aurélio, no mesmo sentido da decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) de que o segurado da Previdência Social tem, diante de mudanças nas regras previdenciárias, o direito de optar pela regra que lhe seja mais favorável.
O julgamento se deu no Recurso Extraordinário (RE) 1.276.977.
Com isso, segurados do INSS teriam o direito de recalcular suas aposentadorias incluindo, na composição da média salarial, contribuições previdenciárias realizadas antes de julho de 1994. Isso porque, em 1999, uma reforma na legislação previdenciária mudou as fórmulas de cálculo dos benefícios e definiu que, para pessoas que já contribuíram com o INSS naquela época, os pagamentos antes do Plano Real (1994) não seriam considerados.
“O STF havia validado a tese e agora a discussão gira em torno dos parâmetros para a aplicação prática desse entendimento, especialmente a partir de quando o valor será revisto, se de forma retroativa, a partir do julgamento do STF ou de alguma outra data a ser estabelecida”, disse Bruno Minoru Okajima, especialista em Direito do Trabalho.
Como a composição do STF mudou, com a aposentadoria de três ministros desde o início do julgamento do mérito, também há o risco de que a decisão do STJ seja anulada e que o caso tenha de retornar à Corte – proposta encampada inicialmente pelo ministro Cristiano Zanin e seguida por outros 2 colegas.
Em dezembro, o ministro Alexandre de Moraes, relator do processo da revisão da vida toda, pediu destaque e suspendeu o julgamento dos embargos de declaração opostos pelo INSS. Até a interrupção, o placar estava em quatro votos a favor de modular os efeitos da decisão e em três para anular o acórdão do STJ.
Para Cristiano Zanin, durante julgamento no STJ houve inobservância da reserva de plenário prevista no art. 97 da Constituição da República durante o julgamento.
O dispositivo estabelece que a declaração de inconstitucionalidade de uma lei só pode ser decidida com votos da maioria absoluta dos membros de determinado órgão — o que não teria ocorrido, já que o acórdão foi redigido por uma Turma e não pelo plenário da Corte.
“O Ministro Zanin levantou um novo ponto que, se acompanhado pelos demais Ministros, poderá levar o caso de volta ao Superior Tribunal de Justiça para novo julgamento do mérito do processo – se a revisão é, ou não, possível”, afirma Okajima.
Correção do FGTS
O STF também deverá julgar uma proposta feita pelo partido Solidariedade sobre o rendimento do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS). A discussão é feita na ADI 5.090.
A legenda questionou o critério de remuneração dos depósitos do FGTS, hoje correspondente ao valor da Taxa Referencial (TR) mais juros de 3% ao ano e lucros distribuídos. A sigla alegou que a TR não constitui índice de correção monetária, de forma que o rendimento não acompanha a inflação e o modelo gera perdas aos trabalhadores.
Três ministros já votaram para que a remuneração do FGTS não seja nunca inferior à da caderneta de poupança. O julgamento, contudo, foi interrompido por pedido de vista do ministro Cristiano Zanin.
Segundo o advogado tributarista Marcelo Filho, mesmo que de forma não intencional, o pedido de vista ajuda o governo a segurar os gastos enquanto se discute a possibilidade de zerar o déficit das contas públicas no ano que vem.
“A mudança da remuneração do FGTS poderá trazer um impacto gigante ao governo. Cálculos da Advocacia-Geral da União (AGU) indicam que a União poderá ter que aportar R$ 543 bilhões, o que vai na contramão daquilo que a equipe econômica do governo vem buscando”, diz.
“A discussão atual impacta diretamente o brasileiro que, dependendo da situação, pode receber valores retroativos – de correção do FGTS ou de benefícios previdenciários (no caso da revisão da vida toda) -, ou apenas a partir da data que for estabelecida pelo STF”, afirma.
Desestatização da Eletrobras
Contrário ao processo de desestatização da Eletrobras (ELET3), feito em 2022, o governo ajuizou por meio da Advocacia-Geral da União (AGU), Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 7385) contra dispositivos que reduziram o poder de voto da União.
A Lei 14.182/2021 proíbe que acionistas ou grupo de acionistas tenham votos em número superior a 10% da quantidade de ações em que se divide o capital votante da empresa.
Na ação, a AGU sustenta que “a aplicação imediata dessa regra às ações detidas antes do processo de desestatização representa grave lesão ao patrimônio e ao interesse públicos, porque a União manteve cerca de 42% das ações ordinárias, mas não tem voto proporcional a essa participação”.
Além da Eletrobras, a decisão do STF sobre o caso poderá transbordar para outros casos de desestatização, como a Sabesp, por exemplo, de acordo com especialistas ouvidos pela reportagem. Para Marcelo Filho, o risco da decisão é criar um precedente que poderá ser utilizado em outros casos em que o Estado abriu mão da participação em companhias de capital aberto.
“Há, sim, o risco de uma decisão do STF acerca do questionamento da União sobre a desestatização da Eletrobras influencie outros casos, como a privatização da Sabesp – aprovada pela Assembleia Legislativa de São Paulo. O ponto é que, para que haja uma decisão, o governo teria que desembolsar quantias volumosas para recuperar participação no mercado, o que gera dúvida em um momento de ajuste fiscal como o que vivemos”, afirma.
Desestatização da Sabesp
A privatização da Sabesp também pode ser afetada por outra ação que tramita no STF. Nesta semana, a Procuradoria-Geral da República (PGR) informou à Corte que concorda com os argumentos apresentados na Ação Direta de Inconstitucionalidade 7.470, de autoria de PT e PSOL. A ação questiona o desenho do peso decisório do estado e dos municípios nas Unidades Regionais de Serviços de Abastecimento de Água Potável e Esgotamento Sanitário (URAEs).
Para a PGR, “concentrar poder decisório ao alvedrio de apenas um ou dois entes federativos no âmbito das unidades regionais de saneamento básico resulta tanto em afronta abstrata à autonomia dos outros municípios dela integrantes, quanto pode ensejar que sejam proferidos atos concretos dentro da mesma unidade amplamente favoráveis aos entes com maior poder de decisão”, diz o parecer, assinado pela procuradora-geral da República interina, Elizeta Maria de Paiva Ramos.
A questão é importante porque a eventuais compradores da Sabesp interessa uma menor pulverização das decisões. Para o advogado Wladimir Antonio Ribeiro, a manifestação da PGR era esperada dado que contestações do tipo já ocorreram em Alagoas e na Bahia, quando houve a tentativa de conceder partes do saneamento.
“É um tema conhecido. Até me espanta que o estado de São Paulo, numa modelagem tão importante quanto a da Sabesp, não tenha tido cuidado de fazer a verificação sobre essa questão e tenha caminhado dessa maneira com esse risco tão elevado. Isso preocupa porque se em um tema que já era conhecido cometeu-se um erro desse tipo, eu fico imaginando que talvez essa modelagem esteja sendo feita às pressas e novos problemas podem surgir, o que cria um alerta para o mercado e também para a sociedade”, disse.
Lei das Estatais
Outra ação econômica pendente de julgamento é a ADI 7.331, que discute trechos da Lei das Estatais que impedem a nomeação política para a direção de empresas públicas e impõem restrições como quarentena de três anos para cargos dessa natureza.
A retomada do julgamento da constitucionalidade da Lei das Estatais está prevista para o primeiro semestre de 2024 e poderá impactar na gestão de empresas como a Petrobras (PETR4) e consequentemente no desempenho das ações dessas companhias.
“A regra de quarentena está em sintonia com as melhores práticas de governança corporativa, porque, a um só tempo, evita conflito de interesses na tomada de decisões e dificulta atos de corrupção, que têm assombrado a história recente do país, justamente na relação entre política e empresas com alguma participação governamental”, avalia Carolina Xavier da Silveira Moreira, doutora em direito civil.
O placar do julgamento, que foi suspenso por um pedido de vista do ministro Nunes Marques, está empatado em 1 a 1.
Vinicius Pereira, repórter freelancer do JOTA