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Pacote abaixo de R$ 40 bi pode levar governo a rever meta fiscal para 2025, diz diretor da UBS Evolution
O anúncio do plano do governo federal para cortar despesas obrigatórias e, assim, cumprir a meta fiscal de zerar o déficit primário em 2024, é aguardado há dias e tem gerado enorme volatilidade nos mercados. A estimativa da equipe econômica, do ministério da Fazenda, e do mercado financeiro é de um pacote de R$ 30 bilhões a R$ 40 bilhões.
Contudo, um conjunto avaliado nesta magnitude não seria suficiente para aliviar a percepção do mercado de que as contas públicas seguem trajetória insustentável. Pior, um contingenciamento de até R$ 40 bilhões obrigaria o governo a fazer novos cortes no ano que vem, e até rever a meta fiscal para 2025.
Esta é a avaliação de Lucas Vilela, diretor de economia da UBS Evolution, plataforma de gestão d fundos de investimento que faz parte do braço de wealth management do banco suíço no Brasil.
R$ 40 bilhões levaria governo a ‘operar no limite’ da meta fiscal
Medidas fiscais de até R$ 40 bilhões não surpreenderiam o mercado financeiro, diz Vilela.
“O que temos visto do próprio Haddad é um corte no tamanho de R$ 30 bi a R$ 40 bi”, diz o diretor da UBS Evoltion. “A reação do mercado ao anúncio de um corte deste tamanho não seria muito destoante do cenário atual, até porque o mercado antecipou todo esse movimento do governo”, prossegue.
Ou seja, tudo ficaria como está.
Ao longo das últimas semanas, desde que Haddad anunciou medidas para reduzir despesas discricionárias, economistas vinham debatendo se as mudanças seriam estruturais. Ou seja, se haveriam cortes pensados no médio e longo prazo, não apenas no Orçamento de 2025.
Mas o problema, segundo Vilela, é que a trajetória da dívida pública do governo é negativa do jeito em que está. O déficit primário chegou a R$ 227,5 bilhões em 12 meses encerrados em agosto, o equivalente a quase 2% do PIB.
De acordo com o arcabouço fiscal, os gastos do governo devem se igualar às receitas arrecadadas para levar a um déficit primário zero em 2024. No máximo, o balanço do governo pode chegar a -0,25% do PIB.
Mas, em agosto, segundo dados do Tesouro Nacional, o governo acumula um déficit primário de R$ 105 bilhões, próximo a 1% do PIB.
Economista sênior para o Brasil do Itaú BBA, Luiz Cherman, também prevê cortes na faixa de R$ 30 a R$ 40 bilhões.
Déficit do governo ‘destoa’ do ciclo econômico, diz Vilela
“O que acontece é que tivemos todo esse resultado primário bastante destoante do ciclo econômico que vivemos”, diz Vilela.
“É preocupante (o endividamento do governo) porque a economia do Brasil mostra um crescimento forte, uma arrecadação forte, e, mesmo assim, um déficit elevado e acima da meta fiscal. Só tivemos o mesmo déficit em 2014, quando a taxa de desemprego bateu 12%.”
Atualmente, o desemprego no Brasil apresenta o segundo melhor patamar da história. A dívida pública do Brasil, por outro lado, se aproxima a 80% do PIB do país; é a segunda maior entre países emergentes, atrás apenas da Argentina.
Assim, um conjunto de medidas que enderecem despesas discricionárias na casa de R$ 30 bi a R$ 40 bi levariam o governo federal “a operar no limite da meta fiscal novamente em 2025 e 2026”, aponta Vilela, da UBS Evolution.
Em 2025, o governo ou vai ter que mudar a meta ou anunciar mais corte de gastos. Se a medida for constante com a expectativa do mercado, o governo tende a operar no limite da meta.”
“O cenário em 2025 vai ser mais desafiador por conta deste motivo. Estamos entrando em um período em que a próxima eleição (para presidente, em 2026) será discutida”, afirma o economista.
Meta fiscal do Brasil está vulnerável a choques externos, diz Vilela
O economista segue ao argumentar que, sob taxas de desemprego baixas e avanço do PIB nominal, ou seja, crescimento econômico ajustado pela inflação, as receitas primárias “ficam mais voláteis”. Se o PIB desacelera, as medidas de arrecadação que vinham sendo adotadas perdem efeito mais rápido.
A economia do Brasil, assim como sua meta fiscal, continuam frágeis.
“Se por algum motivo, tivermos um choque externo, esse resultado primário muito negativo vai se intensificar. Vemos hoje que as receitas crescem muito em função das despesas e estímulos econômicos. Se a economia desacelerar, devemos ter deterioração das contas públicas.”
Mas hoje existem duas avenidas para choques econômicos que são riscos para o Brasil, aponta Vilela.
“O que mapeamos, pelo momento, é o aumento de tarifas globais por parte dos Estados Unidos”, diz. De volta à Casa Branca após quatro anos, o presidente eleito dos Estados Unidos Donald Trump promete aumentar taxas aduaneiras à China e a parceiros comerciais globais. Segundo a Oxford Economics, Trump deve aumentar o nível de tarifa global em 10% e de 60% para a China.
“Esse nível teria um efeito muito negativo sobre economia global.”
O outro choque pode vir da economia da China. No momento, o governo chinês enfrenta riscos fiscais, além de uma deflação no setor imobiliário e de consumo, de acordo com Lucas Vilela.
“O governo chinês tem indicado que vai fazer mudanças, mas o histórico mostra que o remédio mais adequado são medidas fiscais ao invés de cortes de juros. Ele precisa fazer um estímulo ao consumo via estímulo fiscal. Por si só, China representa risco para economia global.”
Plano de R$ 50 bilhões seria ‘surpresa positiva’, diz UBS Evolution
Já se o governo federal anunciar pelo menos um conjunto de cortes ou contingenciamento correspondente a R$ 50 bilhões, haveria uma “surpresa muito bem-vinda do lado da meta fiscal”, segundo Vilela
Nesse momento, o economista enfatiza que “a sinalização ao de que o governo está disposto a fazer mais é mais importante” do que os efeitos.
“Isso por si só tem efeitos de segunda ordem. O prêmio de risco cai, assim como os juros longos. O BC pode reduzir o tamanho do ciclo de juros“, completa.
A credibilidade é exaltada pelo economista com um conto de caso da política fiscal que antecede o arcabouço: o teto de gastos.
“Quando tivemos a PEC de Teto de Gastos, eu trabalhava em sell side do Credit Suisse (adquirido pelo UBS em 2023). Eu costumava dizer que a PEC por si só não teria efeito sustentável sobre a trajetória da dívida. Mas a narrativa de credibilidade foi tão relevante que o juro real saiu de 7% para 3% a 4%.”
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