Desastres climáticos reforçam importância de meta fiscal, diz executiva de rating da Moody’s

Vice-presidente da Moody's de rating fala à Inteligência Financeira: 'No futuro é melhor preservar um espaço fiscal para crises'

Desastres climáticos como as enchentes que ocorrem no Rio Grande do Sul são inevitáveis, e cabe ao governo criar espaço fiscal para socorrer as vítimas sem gerar gastos extraordinários.

A avaliação é de Samar Maziad, vice-presidente de rating soberano da agência de risco Moody’s. Ela foi responsável pela revisão da perspectiva de dívida soberana no início do mês, que saltou de neutra para otimista.

A executiva da agência explica que as enchentes no Rio Grande do Sul “mostram a importância da consolidação fiscal” a ser perseguida pelo governo. Ela afirma que, por meio de superávit primário e estabilidade entre despesas e receitas, “o governo brasileiro terá mais espaço no fiscal para responder a crises” ambientais.

Moody’s: fiscal é importante no combate a eventos climáticos

Para a Moody’s, o governo deve terminar 2024 com um déficit primário de 0,70% do PIB do Brasil. A marca é uma “visão conservadora” do resultado fiscal, afirma Samar Maziad.

Contudo, a agência já considera que pode haver leve piora do quadro fiscal com o pacote de ajuda anunciado pelo governo federal de mais de R$ 60 bilhões em socorro ao Rio Grande do Sul.

“O montante atual complica gastos fiscais, mesmo considerando que boa parte das despesas está fora da meta”, diz a executiva de rating da Moody’s. Ela se refere ao anúncio de que o pacote de socorro do governo não será incluso na regra do arcabouço fiscal. “Mesmo assim, o valor deve aparecer na conta do governo no final do ano.”

Daqui para frente, a tendência é que cada vez mais desastres climáticos gerem custos a governos do mundo inteiro. No caso do Brasil, Samar Maziad afirma que é importante para o país buscar “uma meta de superávit primário ambiciosa e mantê-la de forma consistente”.

Isso, por sua vez, libera mais recursos para vitimas desses eventos.

“O ponto é que desastres naturais devem persistir daqui para frente, e é importante que o governo responda de acordo quando houver necessidade. No futuro, dizemos que é melhor criar uma reserva de capital e preservar um espaço fiscal para responder às crises”, diz a analista ao citar a revisão de meta fiscal recentemente feita pelo governo de um superávit de 0,25% do PIB para déficit zero em 2025.

“Em tempos normais, é importante chegar à consolidação fiscal: melhora tanto de despesas quanto de receitas”, diz Samar. “Para usá-la quando a necessidade for urgente.”

‘Não vemos independência do BC ameaçada’

Ainda segundo a executiva da Moody’s, a independência do Banco Central não está ameaçada. Mesmo com a perspectiva de que o governo passe a ter maioria dos membros do Copom (Comitê de Política Monetária) a partir de 2025.

Na última quarta-feira, o Copom decidiu cortar a Selic em 0,25 ponto percentual, a 10,50% ao ano. Mas a decisão veio num placar de cinco a quatro, dividido entre membros indicados pelo governo anterior e pelo atual.

“Não temos a perspectiva de reversão na independência do BC”, diz Samar.

“(A partir de 2025) cabe ao BC comunicar sua política monetária e o mercado responderá de acordo. Mas a independência não será revogada”, afirma.

A autonomia da instituição foi uma das reformas que levou a Moody’s a reconsiderar a perspectiva de dívida soberana do Brasil.

“Temos visto uma melhora no esforço de atingir uma trajetória fiscal sustentável, e, além disso, esperamos que essa melhora continue. Na nossa avaliação, incorporamos reformas como a da previdência, trabalhista, a independência do BC e todo um conjunto de reformas digitais”, diz Samar.

Mas existem riscos para a trajetória do fiscal, pontua a executiva. “Destacamos dependência em receitas para a melhora dos resultados fiscais que pode não se materializar.”

Esse é o primeiro risco. O segundo, de acordo com a analista da Moody’s, é a flexibilidade para gastos do governo e choques econômicos.

“Se o governo não controla suas despesas, torna-se cada vez mais difícil de gerar novas receitas.”

Uma das medidas que podem equilibrar gastos e receitas com o tempo, conforme aponta a agência de rating em seu relatório mais recente, pode ser a desindexação da previdência em relação ao salário mínimo.

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