Preço do ouro: alta de US$ 1 mil em 12 meses não deve impedir mais valorização do ativo

O ouro se mantém acima do patamar de US$ 3 mil, sustentado pela busca por ativos de menor risco. O metal precioso, considerado porto seguro para os investidores, subiu cerca de 12% até agora no ano e se olharmos para um período maior, de 12 meses, a alta no preço foi de US$ 1 mil.
Segundo analistas ouvidos pela Inteligência Financeira, o ouro se beneficia diante de tensões geopolíticas, incertezas econômicas e expectativas de que os bancos centrais cortarão as taxas de juros no final do ano.
Nesse cenário, alguns países podem estar também realizando grandes aquisições da commodity em uma espécie de corrida silenciosa em direção ao ouro.
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“Ao puxar todos os dados de influxo de capital para o ouro de diferentes veículos, é possível ver claramente que a compra não está em linha com a anunciada por bancos centrais e investidores”. O alerta é de Otavio Costa, macroestrategista da Crescast Capital, fundo americano que opera principalmente no setor de mineração.
“As compras precisam ser muito maiores para explicar a mudança de preço em US$ 1 mil da onça-troy em tão curto prazo”, acrescenta o gestor.
Nesse sentido, pode estar ocorrendo uma acumulação “desesperada” de ouro entre grandes players, especialmente países, que já não se fiam tanto no uso do dólar como reserva por alguns motivos, um deles relacionado a uma espécie de intervencionismo nas reservas da divisa americana.
Nesse cenário, Rhona O’Connell, chefe de análise de mercado da StoneX para Europa, Oriente Médio e Ásia, diz que “novas altas (do preço do ouro) são uma possibilidade”. Assim, as correções que devem acontecer após a máxima atual surgirão como oportunidade de entrada.
Bloqueio dos EUA assusta detentores de dólares e dívidas
A chefe de análise de mercado da StoneX destaca que a escalada dos conflitos bélicos atuais tem impulsionado bastante o preço do ouro e que o arrefecimento das tensões seria capaz de tirar tração da valorização da commodity. Mas só o fim dos conflitos pode não ser suficiente. As sanções impostas pelos Estados Unidos também tiveram impacto importante neste avanço.
O caso da Rússia é exemplar.
Os Estados Unidos bloquearam cerca de US$ 300 bilhões em reservas de dólar do país após o início da guerra contra a Ucrânia. Países parceiros dos EUA também limitaram ou cessaram o acesso do país controlado por Putin a suas reservas em moeda americana.
Isso melindrou principalmente os países alinhados à Rússia e os incentivou a encontrar novas formas de reserva de valor. Nesse cenário, vale destacar o papel da China, que tem avançado consideravelmente na substituição de títulos americanos e dólar por ouro.
Mas, na visão de Costa, não é só a China que, entre as potências, procura proteção no ouro. Os Estados Unidos também devem fazer movimento de reconstrução de suas reservas de maneira silenciosa como forma de trazer mais confiança do mercado para sua economia diante do aumento exponencial que a dívida pública experimentou nas últimas décadas e têm afetado o valor de sua moeda.
A dívida americana disparou desde os anos 1970, quando representava 40% do PIB. Hoje está perto de 120%.
Recomposição das reservas americanas aumentaria preço do ouro
Estudo realizado pela gestora americana Crescat diz que se os Estados Unidos recompusessem suas reservas de ouro ao nível do final do último ciclo do metal, na década de 1970, – cerca de 17% em relação a sua dívida pública – o ouro bateria US$ 24 mil.
Esse não é o patamar base utilizado pela Crescat, que prefere não cravar um valor final do ouro nesse ciclo de alta.
Diante disso, “o que o é possível dizer agora é que a trajetória permanece ascendente e tem um caminho muito longo pela frente ainda”, diz Costa.
Na comparação com o dólar, o que o gestor espera é que a commodity experimente valorização acentuada nos próximos anos. “O dólar está em um dos níveis mais altos dos últimos 120 anos”, afirma Costa, da Crescat.
Ele compara o momento atual com o que ocorreu em outros momentos importantes da história, com a supervalorização e posterior derrocada da moeda norte-americana no século passado.
São os casos da depressão de 1929, quando o dólar, depois de uma alta histórica, desabou após 1933. Da mesma maneira, depois de 1985, a moeda teve forte queda após expressivos ganhos nos anos 1970.
“Algo parecido deve acontecer agora. O mundo não deve suportar o dólar nesses patamares”, diz Costa.
Nesse sentido, ele avalia que a possibilidade de queda acentuada do dólar está relacionada à perda gradual de credibilidade da moeda.
Corrida de governos ao ouro e impacto sobre dólar e Treasury
A mudança substancial em favor do ouro está relacionada, em grande parte, ao aumento da percepção da necessidade de proteção contra riscos, principalmente geopolíticos, não só relacionados ao período de crise geopolítica atual, mas às tensões econômicas causadas pela onda protecionista e recuo da globalização.
Contudo, O’Connell não acredita que haja atualmente debandada dos títulos americanos e do dólar. “Os mercados estão inundados de dinheiro e essa é a principal fonte de investimento”, avalia.
Ilan Abertman, analista da Ativa, vê resiliência do dólar, mesmo com o governo da China publicamente vendendo Treasuries e comprando ouro.
“Não vejo como um movimento de negação da Treasury, mas como uma complementação de portfólio, são produtos diferentes e importantes. Então, a gente tem movimento forte em favor do ouro, mas é a diversificação que está por trás disso, e não o preterimento de um ativo em relação a outro”.
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